Quanto valerá o próximo ministro do Ambiente?
Cabe-nos a nós, todos, fazer com que as mudanças a que agora assistimos tenham consequências práticas.
Às vezes votamos para mudar. No rescaldo das eleições europeias de Maio passado, mudaram algumas coisas. Muitos destacaram o generoso resultado do PAN, interpretando-o como voto de protesto face à inacção dos actores principais da política portuguesa no que respeita à componente ambiental das nossas vidas.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Às vezes votamos para mudar. No rescaldo das eleições europeias de Maio passado, mudaram algumas coisas. Muitos destacaram o generoso resultado do PAN, interpretando-o como voto de protesto face à inacção dos actores principais da política portuguesa no que respeita à componente ambiental das nossas vidas.
Nessa noite, António Costa associou a medida de redução do preço dos passes nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto ao combate às alterações climáticas. Na mesma linha, há alguns dias, o Gabinete de Estudos do PS disponibilizou para consulta o projecto de programa eleitoral do partido “na área das alterações climáticas” – que engloba áreas como agricultura, água, energia, florestas, indústria, mar ou transportes – com o mote “Não há Planeta B”. Este mote, que associamos ao activismo de muitas organizações de defesa do ambiente, é também utilizado pelo Bloco de Esquerda, por exemplo. Há, portanto, uma “emergência climática eleitoral” ditada pelos bons resultados do PAN, declarada por todos aqueles que dependem dos votos para fazer passar as suas ideias. Natural? Sem dúvida. Benéfico para o debate político? Muito. Fogo de palha? Veremos.
Quem quer que seja que nos governe a partir de Outubro próximo terá certamente de dar sinais de que a preocupação ambiental é real. Destacaria aqui três: (1) o mais imediato e inócuo será a lei orgânica do Governo, que normalmente no seu artigo segundo define a hierarquia das ministras e dos ministros, utilizada depois no protocolo de Estado: actualmente, o ministro do Ambiente e da Transição Energética ocupa o antepenúltimo lugar, apenas acima do ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural e da ministra do Mar. O lugar mais alto nesta tabela, um honroso sétimo lugar (em 16), foi ocupado por Francisco Nunes Correia, enquanto ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional no primeiro governo Sócrates, em 2005, certamente mercê dos fundos de desenvolvimento cuja gestão teve a seu cargo; (2) depois, virão as dotações orçamentais de funcionamento e investimento das unidades orgânicas que da pasta do Ambiente dependerão, e suas taxas de execução e cativação, de escrutínio bem mais difícil por parte dos cidadãos; (3) e deixo para o final desta lista não exaustiva o grande sinal do verdadeiro peso político: o zelar pelo cumprimento do programa sufragado nas urnas com os ajustes pós-eleitorais e a demonstração clara das escolhas nos conflitos com outras pastas.
O que terá a dizer o titular da pasta do Ambiente quando confrontado com o ruído na cidade de Lisboa agravado com a expansão do aeroporto, com as práticas agroflorestais ambientalmente insustentáveis (como a do olival superintensivo), com a extracção mineira (como a do lítio) ou com o conflito na expansão de actividades económicas (como no caso das dragagens no rio Sado para a melhoria das acessibilidades ao porto de Setúbal), para falar em alguns exemplos recentes? Veremos.
Participei em 2010, em Nagóia, no Japão, na décima conferência da Convenção da Diversidade Biológica, de que Portugal faz parte. Nela foi aprovado o protocolo sobre o acesso a recursos genéticos e a partilha justa e equitativa dos benefícios que advêm da sua utilização, que ficou conhecido como Protocolo de Nagóia. Um documento cuja importância para o nosso futuro comum neste planeta ainda não conseguimos medir. Recordo-me bem de ser prática comum a cada proposta de alteração olhar para a então ministra do Meio Ambiente do Brasil, solicitando o seu consentimento através de uma expressão facial afirmativa. Afinal de contas, ela representava uma considerável parte da biodiversidade que conhecemos.
Em contexto europeu, a Península Ibérica é provavelmente a região com maior biodiversidade conhecida, mas não estou a imaginar grandes deferências com os ministros do Ambiente de Espanha e Portugal por parte dos seus homólogos europeus nos Conselhos de Ambiente. Em lugar de serem vistos como os principais guardiões das políticas ambientais europeias numa região riquíssima em biodiversidade e altamente vulnerável às alterações climáticas, são apenas mais dois entre 28, com pouca força face às exigências que os desafios ambientais nos colocam, agora passadas a propaganda eleitoral. Cabe-nos a nós, todos, fazer com que as mudanças a que agora assistimos tenham consequências práticas. Quanto valerá o próximo ministro do Ambiente? Veremos.