BE acusa Governo de tirar renda acessível da lei dos solos para promover o “negócio imobiliário”
Mariana Mortágua defende que o Governo “não quer saber da realidade” sobre a habitação e que “não governa com o apoio das estatísticas”, antes “para o negócio”.
A líder do Bloco de Esquerda (BE) defendeu nesta sexta-feira que a alteração feita pelo Governo à chamada "lei dos solos", para que o arrendamento acessível deixe de ser uma das condições para a reconversão dos solos rústicos em urbanos, é uma "prova" de que esta legislação pretende promover o "negócio imobiliário".
"A cada elemento novo comprova-se a ideia de que esta lei não é sobre habitação, é sobre promoção de negócio imobiliário", denunciou Mariana Mortágua, que defende que a "prova disso" é o facto de o Governo ter retirado o "critério de obrigatoriedade de construção de habitação acessível" do decreto-lei que permite reconverter solos rústicos em urbanos.
Como o PÚBLICO noticiou, o Governo alterou a formulação inicial da chamada "lei dos solos" para retirar o arrendamento acessível das condições obrigatórias para que as câmaras municipais possam autorizar a reconversão de solos para a construção de imóveis com fins habitacionais.
Em declarações aos jornalistas no Parlamento, a coordenadora do BE criticou também o ministro adjunto e da Coesão Territorial por ter afirmado que não lhe "interessa nada a estatística", numa entrevista à SIC Notícias, nesta quinta-feira, quando foi confrontado com o facto de Portugal ser "o segundo país com maior stock de casas disponíveis da Europa".
"Este é o retrato do Governo: é um Governo que não quer saber da realidade. Não governa com o apoio das estatísticas, dos dados, da realidade, do conhecimento; governa para o negócio", atirou Mortágua.
Censurando o facto de o executivo ter aprovado o decreto-lei "sem escrutínio" nem "debate parlamentar", Mortágua avisou que a medida em causa "vai promover a corrupção, a especulação e a destruição do território". E questionou como é que, perante esta realidade, o Chega e o PS vão votar a lei que será alvo de apreciação parlamentar a pedido do BE, PCP, Livre e PAN.
"Vai o Chega acabar a votar esta lei e a permitir uma lei que favorece a corrupção, como votou as offshores e os 'vistos gold'?", perguntou, em jeito de desafio. E "como vai votar o PS? Vai ceder à pressão da especulação imobiliária, à pressão da construção sem limites? Ou vai tomar posição certa, coerente e defendida por centenas de especialistas?".
Do seu lado, garantiu que se opõe à lei porque quer "evitar um erro futuro". "Portugal já penou muito com estes erros do passado e estamos a tempo de evitar uma repetição desses erros", disse a bloquista, numa espécie de apelo aos dois maiores partidos da oposição.
Questionada pelos jornalistas sobre se acredita que o executivo da AD alterou o decreto posteriormente a fim de evitar críticas, Mariana Mortágua insistiu em que esta é a "prova de que o Governo não quer saber da habitação e não tem vergonha de o dizer".
E desafiou o executivo a "olhar para as estatísticas, ver o que dizem os especialistas e perceber que há um problema com as casas vazias e as casas a serem desviadas para fins relacionados com turismo de luxo, turismo massificado e alojamento local".
Segundo a coordenadora do BE, contudo, "não é isto que o Governo quer fazer", antes "pegar em solos rústicos que valiam muito pouco e dar às câmaras a possibilidade de em reunião, num processo simplificado, decidirem que os solos valem 50 ou 60 vezes mais". "Isto são as portas abertas a negócios, especulação e corrupção", vincou.