O poder contagiante da música e da liberdade

Primeiro, não conseguia cantar para fora das grades. Depois, descobriu como. O ferro é poderoso, mas a música também.

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“Tinha conseguido! Finalmente encontrou a forma! A canção do pássaro toc já voava livremente lá fora” Anna Font
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Vou contar-te uma coisa sobre o pássaro toc: ele gosta de madeira./ E vou contar-te outra coisa: também gosta de voar” Anna Font
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“Da sua gaiola, o pássaro toc, como em todas as manhãs, canta. Está triste e assim desfaz o nó que tem na garganta” Anna Font
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“Depois de enxotar uma mosca incómoda com as suas orelhas esplêndidas, o elefante escutou em êxtase a canção da ave intrépida” Anna Font
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Capa do livro A Canção do Pássaro Toc, editado pela Akiara Books Anna Font
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Não importa em que material se constrói uma gaiola, se em ferro, vime ou madeira, “é sempre feita de medos”. E, quando se prende um pássaro, “talvez o que se esteja a prender seja o medo de voar”. Esta é a mensagem de um dos poemas de A Canção do Pássaro Toc, com o título De que é feita uma gaiola?

Mas não se pense que é um livro triste, é um livro que denota sensibilidade (tanto do autor do texto como da ilustradora), é esperançoso e tem até momentos divertidos. Comecemos pelo primeiro poema, em que se interpela directamente o leitor e se apresenta o pássaro toc: “Vou contar-te uma coisa sobre o pássaro toc: ele gosta de madeira./ E vou contar-te outra coisa: também gosta de voar./ E, já agora, vou contar-te uma terceira: em vez de uma mansão, prefere um prado, e em vez de uma parede, prefere ver o mar./ Mas o pássaro toc vive encerrado numa gaiola de metal.”

Chamam-lhe “toc” porque o seu canto bate nas grades e “a gaiola repercute o som fino do seu eco”, é um “toc” aprisionado. Ainda assim, mesmo com a sua tristeza, o canto desfaz-lhe “o nó na garganta”. Qualquer que seja a canção que entoa, “sonha sempre, sempre, sempre com voar”.

Um dia, a sua voz consegue escapar por entre as grades, chegar a outros animais e contagiá-los, deslumbrá-los. “Porque a verdade é que, quando a cantiga é pura e verdadeira, não há muro que a detenha, nem grades, nem muros”, lê-se no poema A canção que voou. Também um pássaro toc há-de voar, libertado por uma criança. Só poderia ser.

Dois amantes de pássaros

Fran Pintadera regista na sua breve biografia no início do livro: “Se eu fosse um pássaro, teria de ser uma escrevedeira, claro. Assim, além de voar, podia continuar a encher cadernos de versos. Ou melhor, seria uma andorinha para voltar aos sítios aonde fui feliz: ao palco, ao lar, à estrada… Ou uma gaivina-de-bico-laranja? Também gosto de andar despenteado. E de música! Adoro música! Então… um tordo-músico? Espera aí… talvez um pica-pau! É maravilhoso estar perto da madeira! Ou, se calhar, um canário, porque alguma razão haverá para eu ter nascido nas ilhas Canárias. E será que existe algum pássaro que conte histórias? Ai, não sei… Enquanto penso nisso, vou continuar a olhar para o céu.”

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“Não importa o material com que seja fabricada: uma gaiola é sempre feita de medos” Anna Font

Anna Font nasceu em Barcelona, onde continua a viver. Diz que sempre gostou de sol, do Verão, da praia e do mar. Descreve: “Quando era pequena, já comunicava através de desenhos, talvez por ser filha de um desenhador e estar sempre rodeada de lápis, cores, bandas desenhadas, livros ilustrados e outros tesouros que davam asas à minha imaginação. Se, para me apresentar, pudesse desenhar em vez de escrever, desenharia uma rapariga alegre, irrequieta e curiosa, a olhar para as nuvens rodeada de pássaros, a ler ou com um lápis na mão.”

Dois amantes de pássaros, portanto. O que se percebe logo ao folhear-se o livro, em mais uma edição cuidada da colecção Aki Poeta, A Beleza dos Pormenores: “Queremos recuperar o sentido de maravilhamento perante o mundo através das temáticas que escolhemos, com atenção ao pormenores e profundidade poética: livros com luz própria.” Têm-no conseguido.

No final, espaço ainda para uma reflexão do autor: “A poesia é, em grande medida, como o canto dos pássaros: profunda, sincera e de longo alcance. É melodia, pausa, ritmo e memória. É amor, revolução e alegria. É por isso que a poesia deve ser lida, escrita, recitada e cantada: para que nenhuma história fique por contar. Para que nenhuma canção deixe de ser ouvida.”

Cantemos e escutemos, então. Fausto, por exemplo.

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