Literacia em saúde mental: uma “faca de dois gumes”

Ter-se conhecimentos sobre saúde mental poderá, por vezes, conduzir a interpretações erradas, levando muitas pessoas a acreditarem que têm competências para gerir essas situações (em si e nos outros).

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"A promoção da literacia em saúde mental poderá ser uma ferramenta poderosa" Cottonbro studio/pexels
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Numa altura em que se tem falado muito da importância e da necessidade de promoção da literacia em saúde mental, nomeadamente junto dos estudantes universitários,  também se tem tornado progressivamente mais evidente o paradoxo que o seu aumento poderá encerrar.

Por um lado, a promoção da literacia em saúde mental poderá ser uma ferramenta poderosa, uma vez que o acesso à informação facilita, por exemplo, a identificação de sintomas e a procura de ajuda adequada.

Por outro lado, esta promoção poderá conduzir-nos a um problema: o excesso de confiança das pessoas na compreensão e gestão de questões de saúde mental. Isto é, ter-se conhecimentos sobre saúde mental poderá, por vezes, conduzir a interpretações erradas, levando muitas pessoas a acreditarem que, por reconhecerem os sinais e sintomas de problemas de saúde mental, têm as competências necessárias para gerir essas situações (em si e nos outros).

Esta falsa sensação de autossuficiência é particularmente evidente na era digital, onde o acesso à informação está à distância de um clique, onde em websites, aplicações e redes sociais abundam conteúdos/informação sobre saúde mental. Embora isso seja positivo, no  sentido de que promove o conhecimento, também abre caminho para interpretações erradas, intervenções inadequadas e, muitas vezes, para um impacto muito negativo no outro, tornando-se a “tal” literacia em saúde mental, que aparentemente contribuiria para resolver problemas, num problema.

Curiosamente, esta sensação de  autossuficiência da literacia em saúde mental afeta não só a população em geral, mas também profissionais que trabalham em diferentes contextos, nomeadamente nas áreas da saúde e da educação. Muitas vezes, alguns destes profissionais, não sendo especialistas em saúde mental, subestimam a complexidade da avaliação e da intervenção psicológica, desenvolvendo a ilusão de que têm o conhecimento necessário para identificar e intervir.

Assim, e aproveitando o contexto atual, em que uma grande percentagem de universidades e politécnicos portugueses estão a desenvolver atividades/intervenções centradas na promoção de literacia em saúde mental com os estudantes (no âmbito do financiamento da Promoção da Saúde Mental no Ensino Superior) coloca-se a questão: como se poderá equilibrar a promoção da literacia em saúde mental com o potencial risco de sensação de autossuficiência?

A resposta passa por não se cair no engano da “aparente facilidade” de se construírem estas intervenções. Passa pelos próprios especialistas em saúde mental construírem intervenções que sejam rigorosas ao nível do seu planeamento, implementação e avaliação, contribuindo também esse rigor para esta diferenciação.


A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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