Barbie é distribuída nas escolas britânicas e especialistas estão preocupados

A boneca da Mattel já foi distribuída em 700 escolas, chegando a 150 mil alunos. Especialistas do BMJ acusam a empresa de “marketing enganador”.

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A Barbie já teve mais de 200 profissões Reuters/REUTERS TV
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No Reino Unido, distribuem-se Barbies gratuitamente pelas escolas, numa tentativa de ensinar às crianças a importância da empatia. Uma investigação da publicação científica British Medical Journal (BMJ) acusa a estratégia de ser “marketing enganador” e preocupa-se com o impacto que brincar com estas bonecas “perfeitas” pode ter nestas crianças no futuro.

Para já o programa “Barbie School of Friendship” (Barbie Escola da Amizade, em português) só está em funcionamento no Reino Unido, mas a perspectiva, confirmou a Mattel ao BMJ, é que, no futuro, seja estendido a novos mercados. Em mais de 700 escolas, por todo o país, foram distribuídas bonecas a 150 mil alunos, para serem utilizadas em brincadeiras de “faz de conta”.

A Mattel tem patrocinado vários estudos que dão conta que brincar com bonecas traz “grandes benefícios” para o desenvolvimento infantil, sobretudo quando falamos de competências sociais como a empatia. Numa entrevista ao PÚBLICO, a propósito da estreia do filme de Greta Gerwig, a directora de marketing da empresa, Céline Ricaud, sublinhava que “mesmo que as bonecas não se pareçam” com a criança são fundamentais para “desenvolver conceitos de aceitação, pertença e inclusão”.

Contudo, os investigadores do BMJ levantam questões sobre os efeitos negativos da boneca, no que concerne a temas como os estereótipos de género e a legitimidade da Mattel para distribuir bonecas, como manobra de marketing nas escolas. “Entidades comerciais como a Mattel não são especialistas em saúde infantil ou em educação, são especialistas em vender produtos e em maximizar lucros”, acusa a especialista em saúde pública, May van Schalkwyk, professora na Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres. E questiona ainda: “Devem as crianças estar expostas a este tipo de marketing?”

A psicóloga de educação e parentalidade, Philippa Perry, acha que não e confessa-se “enojada” por todas estas estratégias, acusando o programa de ser alarmante. No entanto, a professora primária Lisa Georgeson, defende que este tipo de recurso grátis é “sempre positivo” no ensino, “tendo em conta a falta de financiamento nas escolas”.

Além disso, assevera um porta-voz da Mattel ao BMJ, o programa enquadra-se numa colaboração entre a marca e a Universidade de Cardiff, no País de Gales. Em 2020, um artigo científico assinalava que foi encontrada maior actividade cerebral em crianças que brincavam com Barbies do que nas que jogavam em tablets ou computadores. Mais tarde, em 2022, o estudo foi completado e concluiu que, brincando com bonecas, as crianças têm maior capacidade de linguagem para descrever emoções e pensamentos.

Todavia, Franziska Korb, psicóloga alemã da Universidade de Dresden, lembra que os estudos só encontraram diferenças entre brincar com bonecas e tecnologia, quando as crianças estavam sozinhas. Quando na companhia de um adulto, as diferenças desapareciam. Ademais, não foram estudados os efeitos a longo prazo no comportamento e na personalidade.

Padrões irreais ou um mundo de possibilidades?

Por cá, a investigadora de questões de género, Maria João Silveirinha, reforçava a preocupação com outras temáticas, como os distúrbios alimentares, citando estudos que dão conta de que “as meninas que brincavam com estas bonecas aspiravam a ser mais magras”. Isto porque as crianças tentam sempre identificar-se com os seus brinquedos.

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E a Barbie dificilmente conseguiria ser uma mulher real, dado as medidas do seu corpo, estima a Universidade de Chapman, EUA: teria um índice de massa corporal de 16,24, tendo em conta a sua altura (1,75m) e peso (49,8kg), o que se podia encaixar em anorexia. Esta argumenta ainda quem se fosse uma mulher, a Barbie nem conseguiria andar, dadas as proporções do seu corpo.

No reverso da moeda destas críticas, está a capacidade que a Barbie dá às crianças de sonharem com a possibilidade de escolha para o futuro. Em 1973, já havia uma Barbie cirurgiã e a boneca já teve 200 profissões, avança a responsável da Mattel ao PÚBLICO, lembrando que foi à Lua ainda antes do homem.

Face a todas as críticas, a Mattel desenvolveu, em 2016, bonecas com diferentes tipos de corpo. Um estudo de 2019, cita a autora de educação Alyssa Rosenberg no Washington Post, concluiu que as meninas entre os 3 e os 10 anos estavam menos interessadas em brincar com as bonecas com corpos curvilíneos do que com as bonecas tradicionais. Isso prova, argumenta, que “as crianças aprendem os preconceitos dos pais, das redes sociais e da sociedade”, mais do que pela Barbie.

Ou seja, a capacidade de empatia não está só numa boneca, mas sobretudo na forma como as crianças são educadas. Talvez não seja má ideia que os mais pequenos brinquem com Barbies, mas as bonecas podem ser mote para uma conversa mais abrangente sobre imagem corporal ou papéis de género.

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