Chega a Primavera, tempo de crescimento e renovação, e também nós sentimos vontade de acordar para o mundo. Por esta altura, os ginásios começam a encher e multiplicam-se aquelas promessas do “perca peso em dez dias”. Começamos a acusar a pressão. Afinal, o Verão está quase aí e toda a gente quer andar no seu melhor. Mas a que preço?
É mesmo preciso fazer dietas “malucas”, beber só sumos e batidos ou jejuar para limparmos o nosso organismo? Claro que não. Desde logo porque o nosso corpo está desenhado para se desintoxicar a ele próprio, diariamente, sem a ajuda de poções mágicas. O problema não está nele. Está no que consumimos e na forma como o fazemos, que tantas vezes dificulta esse trabalho de desintoxicação.
O ser humano existe há muitos milhares de anos, mas nunca viveu num mundo que tanto lhe dificulta esse trabalho como aquele em que vive hoje. Vivemos expostos a um cocktail de químicos, que estão presentes na nossa comida, nas nossas roupas, na nossa mobília, nos brinquedos com que as nossas crianças brincam, nos cosméticos que pomos na cara e no corpo, e nos detergentes com que limpamos a casa. Claro que a sua utilidade é, de forma geral, inquestionável. O problema é o seu impacto na saúde e no ambiente.
De acordo com os dados do Eurostat, relativos a 2020, são consumidos na União Europeia cerca de 230 milhões de toneladas de substâncias químicas com riscos para a saúde. Segundo a Agência Ambiental Europeia (EEA, na sigla em inglês), estes produtos são responsáveis por 6% da taxa de incidência de doenças a nível mundial — incluindo doenças crónicas e neurológicas, cancros e perturbações de desenvolvimento — e por 8% da taxa de mortalidade. Mas estes números serão certamente superiores, visto que os estudos existentes incidem apenas sobre uma pequena parte dos químicos no mercado e só estudam os efeitos individuais de determinada substância, e não o risco da exposição simultânea a várias.
Uma das principais preocupações neste domínio são os chamados “disruptores endócrinos”, químicos que afectam o funcionamento do nosso sistema hormonal e interferem com a capacidade de metabolizar a gordura. A exposição a eles pode desencadear vários problemas de saúde, como perturbações de desenvolvimento, obesidade, diabetes, infertilidade masculina e mortalidade associada a níveis reduzidos de testosterona. Segundo a EEA , há cerca de 800 substâncias suspeitas de serem disruptores endócrinos, e que estão presentes em produtos do dia-a-dia, como latas de comida, plásticos, pesticidas, alimentos e cosméticos.
Sinais de alerta
Há vários órgãos envolvidos no processo de desintoxicação do nosso corpo. Fígado, rins, vesícula biliar, pulmões, intestinos e até a pele, todos eles trabalham em equipa para assegurar que as toxinas são transformadas em compostos menos perigosos e que são depois excretadas ou libertadas.
Portanto, a primeira questão é saber se o nosso organismo está ou não a precisar de uma “mãozinha” neste processo. Estes são alguns dos sintomas a que deve estar atento:
- Dores de cabeça;
- Cansaço, falta de energia, dificuldade de concentração;
- Dificuldade em adormecer ou acordar consistentemente entre as 2 e as 4 da manhã (e, sobretudo, acordar com calor);
- Retenção de líquidos e/ou sensação de pernas cansadas;
- Problemas de pele (acne, erupções cutâneas, eczema);
- Olhos vermelhos, secos ou irritados;
- Ataques repentinos de fome;
- Síndrome pré-menstrual e/ou menstruação irregular;
- Problemas digestivos e intestinais (inchaço abdominal, flatulência, prisão de ventre ou diarreia);
- Aumento da gordura corporal;
- Celulite;
- Problemas de humor (nervosismo, irritação);
- Mau hálito e/ou suor com cheiro desagradável;
- Cabelo fraco ou queda de cabelo;
- Falta de apetite sexual.
Claro que muitos destes sintomas podem ter origem noutras causas, desde logo de ordem mais emocional. A boa notícia é que o detox que proponho também vai ajudar a esse nível. E não envolve passar semanas a beber sumos e batidos, nem passar fome.
Detox passo a passo
Um detox natural e seguro passa por ajudar o nosso corpo a metabolizar as toxinas, ao mesmo tempo que reduzimos a exposição aos tais químicos e a alimentos mais inflamatórios.
- Eliminar os “agressores” na alimentação: álcool, café, tabaco, açúcares refinados, gorduras saturadas, produtos altamente processados, tudo isto contribui para a acumulação de toxinas pode prejudicar a nossa saúde. Algumas pessoas podem também beneficiar da limitação dos lacticínios ou do glúten, se houver algum tipo de sensibilidade ou intolerância associadas.
- Eliminar os “agressores” externos: tente reduzir a utilização de químicos em casa, presentes em muitos dos produtos de cosmética e de limpeza. Tenha também atenção aos tais disruptores endócrinos. Alguns exemplos: o BPA (Bisfenol A), um composto existente em muitos plásticos e nas latas de bebidas; o PFOA (ácido perfluorooctanóico), usado nas panelas antiaderentes; ou os ftalatos, que são usados nos plásticos para os deixar mais maleáveis. Mas há muitos mais (demasiados!). Na alimentação, o ideal será também privilegiar a produção proveniente de agricultura biológica, na qual não são usados adubos, fertilizantes ou pesticidas químicos.
- Apostar numa alimentação natural, rica em vitaminas, minerais e nutrientes que ajudam na desintoxicação. Os vegetais deverão ser a peça central da sua alimentação e deve variar o mais possível. Para um detox eficaz, convém reforçar o consumo de vegetais crucíferos (como brócolos, couve-flor, couve-de-bruxelas, repolho, outras couves, nabo, agrião, acelgas, rúcula e rabanete), que contêm fitoquímicos que estimulam as nossas enzimas desintoxicantes. A cebola e o alho — por conterem compostos sulfurosos (à base de enxofre) — também ajudam o nosso sistema de desintoxicação a funcionar melhor. Neste artigo, encontra várias dicas para ajudar a aumentar o consumo de vegetais.
- Ingerir alimentos com fibra. Além dos vegetais, aposte na fruta, nos cereais integrais (aveia, arroz integral, centeio, etc.) e nas leguminosas (feijão, grão, lentilhas…), que são ricos em fibra, um elemento essencial ao bom funcionamento dos intestinos. E, quanto melhor estes trabalharem, mais facilmente o nosso corpo elimina as toxinas. A falta de fibra é, aliás, um dos problemas dos detox à base de sumos e líquidos. Sem ela, ou o corpo acaba por reabsorver as toxinas ou elimina-as através da diarreia, algo que certamente não desejamos. Isso não quer dizer que os sumos ou os batidos não possam fazer parte do seu processo de detox. Para isso, o ideal será preservar a fibra dos alimentos (mantendo a casca dos vegetais e da fruta) ou adicioná-la sob a forma de sementes (de chia ou linhaça, por exemplo). Mas não se esqueça: se aumentar o consumo de fibra, tem de fazer aquilo de que falo a seguir, para não correr o risco de ficar obstipado.
- Beber muita água. Esta é fundamental para nos mantermos hidratados e para ajudar o nosso corpo a eliminar as toxinas, quer através da urina, quer pondo os nossos intestinos a trabalhar melhor. Se beber água é algo que lhe custa, experimente aromatizá-la (com limão, laranja, pepino, canela…) ou recorrer a chás. A água com limão em jejum e o sumo de aipo costumam ser dois famosos protagonistas dos planos de detox. Não há propriamente evidências científicas que sustentem os seus benefícios para a desintoxicação do corpo. Mas a verdade é que mal também não fazem, antes pelo contrário. Ao conterem potássio, tanto o limão como o aipo produzem um efeito diurético. Além disso, são ambos ricos em vitamina C e flavonóides, o que lhes confere propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias. Se quiser ser mais audaz, pode juntar spirulina ou clorela (ou uma mistura das duas), dois tipos de algas, geralmente vendidas em pó, que são consideradas superalimentos. A lista de benefícios é bastante extensa: ambas ajudam à função intestinal, têm propriedades antivirais e reforçam o sistema imunitário, só para referir alguns. A clorela é ainda um aliado directo poderoso na desintoxicação, porque se liga aos metais pesados (como o cádmio, urânio e mercúrio), ajudando à sua eliminação.
- Fazer exercício físico. A actividade física aumenta o fluxo sanguíneo, ajudando os nossos órgãos a levarem a cabo o seu trabalho de desintoxicação de uma forma mais eficaz. Além disso, leva-nos a transpirar, e o suor é também uma forma de eliminar as toxinas através da pele. Banhos turcos ou sauna também são uma boa opção. Se precisa de um “empurrão” para começar a mexer-se, sugiro que leia este artigo.
- Experimentar a esfoliação a seco. Além de limpar a pele e eliminar as células mortas, a esfoliação a seco estimula a circulação sanguínea e o sistema linfático, ajudando o corpo a livrar-se das toxinas através da pele. E, atenção, sexo feminino, vem com bónus: ajuda a reduzir a celulite. Como se faz? Antes de tomar banho, pegue numa escova de cerdas naturais e comece por massajar os pés, subindo gradualmente para o resto do corpo, fazendo movimentos longos e circulares.
- Abrandar o ritmo. Reduzir o stress e dormir bem é, provavelmente, o elemento mais importante para que um plano de detox funcione bem. Conhece a expressão “ter um sono restaurador”? Tem fundamento. Durante as horas que dormimos, o nosso corpo não está a gastar a energia habitual de que precisa para se mover, digerir ou pôr o cérebro a funcionar. Isto faz com que essa energia seja canalizada para outras funções, como a eliminação de toxinas, a produção de hormonas e o combate a infecções. Quando não dormimos tanto quanto deveríamos, o nosso corpo não consegue completar estas tarefas. As toxinas acumulam-se, cria-se inflamação e desequilíbrios hormonais, abrindo caminho a vários problemas de saúde. O mesmo é válido para o stress. Para muitas pessoas, este é o calcanhar de Aquiles. As soluções têm de ser pensadas caso a caso, mas encontra aqui algumas ideias para começar.
Health Coach, autora do projecto About Real Food