Plantar lápis de cor e recuperar a felicidade
Depois de um ciclone, o vermelho, o azul, o verde e o amarelo desapareceram da vila de Nina. Só até encontrar os lápis da avó e a todos devolver a felicidade.
Tudo ficou cinzento e negro depois de os ventos fortes destruírem a vila da pequena Nina, que cresceu numa terra descolorida. Conseguirá voltar a pintá-la com a esperança que a avó lhe transmitiu através das histórias contadas em voz alta e dos lápis de cor que encontrou enterrados na terra quando procurava minhocas.
“Era uma vez um país a preto e branco. Um país que, originalmente, era colorido.” Assim começa a narrativa de O Tempo das Cerejas. Não nos é dito onde se localiza, mas ficamos a saber dos frutos e que o mar está perto e sempre presente. “A vida tinha mudado. Os morangos e os melões já não pareciam saborosos. As flores murcharam no seu caule como se tivessem vergonha. E o mar não era mais do que um enorme lago preto a reflectir o céu.”
Na companhia do gato Sebastião, a menina desfrutava da sua existência, partilhada com os pais e os avós numa quinta. “A Nina adorava a vida”, como qualquer criança com direito a crescer rodeada de paz e dedicação, mesmo que numa “vila cinzenta”. O que mais apreciava eram as histórias contadas pela avó, quando recordava a sua infância vivida “no país das cores”.
Assim ficou a saber que o vermelho era a “cor dos morangos mais doces” ou das cerejas que, dizia a avó, penduravam nas orelhas. O que imediatamente nos convoca para memórias de rituais familiares de infância e mantidos na idade adulta. Também logo nos fazem recordar Maria Lamas e o seu livro Os Brincos de Cerejas, escrito em 1935, numa edição divulgada pela editora Vega em 1987, com ilustrações de Zé Paulo.
“Num dia de pesca com o seu avô, a Nina resolveu escavar um buraco na terra para procurar minhocas.” Ainda bem que o fez. Encontrou ali uma caixa de metal com cinco pequenos lápis. “Um preto, um branco e três vibrantes.”
Ficou a saber depois que pertenciam à sua avó. Sonhadora como ela, plantou-os na terra e regou-os. O primeiro a brotar foi um lápis vermelho, a que muitos outros, de várias tonalidades, se seguiram. E a cor voltou à vila.
A autora do texto, Agnès de Lestrade, nasceu em França em 1964, é jornalista, escritora, professora de música e de artes plásticas. Cria jogos de tabuleiro, compõe canções para crianças e orienta ateliers de literatura. Estreou-se na escrita para a infância em 2003 e já publicou mais de 50 livros, traduzidos em vários países.
Um dos seus maiores êxitos é o livro A Grande Fábrica das Palavras, também ilustrado por Valeria Docampo e editado em Portugal pela Paleta de Letras. Está traduzido em 33 países. Mãe de dois filhos, Agnès de Lestrade vive nas margens do Garonne, em Gironda (França). Diz uma das suas editoras que, “felizmente, tem tempo para sonhar, mergulhar no mar, escutar os filhos e fazer crepes”.
Captar a beleza do quotidiano
A ilustradora, Valeria Docampo, nasceu em Buenos Aires (Argentina) e estudou Belas-Artes antes de se licenciar em Design Gráfico e Comunicação Visual. Acabaria por ser professora na universidade que a formou, a da sua cidade de origem. No seu site, explica-se que o seu percurso “começou com um profundo desejo de captar a beleza dos momentos quotidianos: os olhares fugazes de crianças e cães, as formas intrincadas das plantas, o ruído das folhas de Outono sob os pés e o aroma reconfortante do pequeno-almoço”.
Alia técnicas tradicionais e digitais, enquanto explora “métodos e materiais inovadores para o seu trabalho expressivo”. No site da artista plástica diz-se ainda: “Valeria vive em Lyon, França, e inspira-se na perspectiva inocente da sua filha, que alimenta a sua paixão criativa e a sua visão para o futuro.”
O resultado desta parceria é não só bonito e comovente, como convida a fazer brincos de cerejas e a comemorar a Primavera, com todas as suas belas cores e frutos deliciosos.