A imunoterapia no tratamento do cancro do pulmão aumenta a sobrevivência?

Mais de 50% dos doentes com Carcinoma Pulmonar de Não Pequenas Células (CPNPC), o mais frequente dos tipos de cancro do pulmão, apresenta doença avançada no diagnóstico.

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Rui Gaudencio

O cancro do pulmão é o tumor mais frequente a nível mundial com 2.1 milhões de novos casos e com maior mortalidade (1.8 milhões) representando 18.4% de mortes por doença maligna. Em Portugal o cancro do pulmão surge em 4.º lugar em termos de incidência com 5284 novos casos (9.1%) e em 1.º na mortalidade com 4671 casos (16.1%).

O tabaco é o principal factor de risco de cancro responsável por aproximadamente 22% das mortes por doença maligna. Cerca de 80% dos tumores pulmonares ocorrem em fumadores sendo o risco variável de acordo com a quantidade e duração dos hábitos tabágicos. Sabendo que todas as formas de tabagismo são nefastas incluindo a exposição passiva ao fumo do tabaco, impõe-se medidas adequadas de prevenção.

A mortalidade também pode ser reduzida pelo diagnóstico precoce e o tratamento atempado de acordo com as boas práticas. Por isso, com a actual situação de pandemia não se justifica o adiamento do diagnóstico por receio de infecção pelo coronavírus, visto que, quer as instituições públicas quer as privadas são seguras, com circuitos independentes e procedimentos apropriados para minimizar o risco, sendo em certos casos, maior o risco de progressão da doença tumoral.

Mais de 50% dos doentes com Carcinoma Pulmonar de Não Pequenas Células (CPNPC), o mais frequente dos tipos de cancro do pulmão, apresenta doença avançada no diagnóstico, habitualmente sem indicação cirúrgica, no entanto, devido à evolução do tratamento nos últimos anos, o prognóstico melhorou significativamente.

Hoje em dia, além da quimioterapia e da terapêutica alvo, a imunoterapia representa uma nova abordagem, pretendendo-se que o sistema imunológico reconheça o cancro como estranho, estimule a capacidade de resposta imunológica e desta forma, reduzir-se o crescimento tumoral. É uma terapêutica que actua no sistema imunológico do próprio doente, não no tumor esperando-se uma ampla aplicabilidade.

Normalmente existem locais de controlo que se chamam checkpoints imunológicos para protecção da inflamação prejudicial e auto-imunidade que podem conduzir a tolerância imunológica do tumor e permitir a progressão da doença maligna. As células tumorais apresentam na sua superfície uma proteína denominada PD-L1 (programmed death-ligand 1) que se liga à proteína PD-1 do linfócito T (programmed death-1), que inactiva as células T, evitando assim que possam destruir as células cancerígenas.

Os inibidores de checkpoints imunológicos (ICI), são anticorpos que se ligam a estas proteínas impedido a ligação das células cancerígenas e inactivação das células T, deste modo permitem que o sistema imunológico reconheça as células cancerígenas como estranhas ao organismo e a sua destruição.

Estes resultados têm sido comprovados em múltiplos ensaios clínicos, tanto em 2.ª linha como em 1.ª linha no CPNPC e rapidamente resultaram na aplicação clínica com diferentes inibidores de checkpoint imunológicos. Desde 2015 a US Food and Drug Administration (FDA) e a European Medicines Agency (EMA) aprovaram quatro ICI em doença metastática, e adjuvante no estádio localmente avançado (III).

Após os primeiros resultados promissores, cinco estudos efectuados em doentes com CPNPC, cuja doença progrediu após a primeira linha de tratamentos, testaram três ICI (inivolumab, pembrolizumab e atezolizumab). Todos mostraram uma vantagem clínica e estatisticamente significativa sobre o comparador padrão, a quimioterapia com docetaxel. Dados de longo prazo confirmaram um efeito duradouro dos ICI na sobrevivência global.

Em seguida, o pembrolizumab foi testado em monoterapia no tratamento de primeira linha do CPNPC metastizado, demonstrando superioridade significativa da sobrevivência global em relação à quimioterapia. Por outro lado, a combinação de pembrolizumab com quimioterapia obteve melhor atividade do que quimioterapia isoladamente. O atezolizumab também demonstrou actividade em combinação com a quimioterapia.

O durvalumab (anti-PD-L1) foi testado no CPNPC localmente avançado após tratamento com quimio-radioterapia concomitante sem progressão, demonstrando aumento da sobrevivência livre de progressão e da sobrevivência global.

Os efeitos adversos relacionados com a imunoterapia são observados em 10 a 15% dos doentes atingindo a pele, cólon, pulmão, fígado, tiróide, mas todos os órgãos são potenciais alvos, devendo ser detectados e tratados precocemente.

Actualmente, a imunoterapia isolada com pembrolizumab nos expressores de PD-L1 ⩾50% ou em combinação com quimioterapia nos expressores com PD-L1<50% é o tratamento standard de primeira linha do CPNPC em estádio IV. O durvalumab é agora a primeira imunoterapia aprovada para tratamento adjuvante do CPNPC em estádio III, após quimioterapia/radioterapia sem progressão. Nos casos em que não foi utilizado nenhum ICI em 1ª linha, estão disponíveis para 2ª linha o nivolumab, pembrolizumab ou atezolizumab.

Em conclusão, a imunoterapia com anticorpos anti-PD1 / PDL1 modificou profundamente a visão do tratamento do Carcinoma Pulmonar de Não Pequenas Células localmente avançado e metastático e provavelmente modificará o tratamento da doença em estádios mais precoces.

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