Há um novo jogo online que ensina aos mais novos a importância de manter o distanciamento social na rua em tempos de pandemia: salvam-se vidas ao evitar chegar-se muito perto de outras pessoas, e ganha-se pontos ao recolher-se máscaras e raros rolos de papel higiénico. Chama-se Can You Save the World? (inglês para, “Consegues salvar o mundo?”) e já foi jogado por 15 mil pessoas em todo o mundo.
O projecto surgiu de uma colaboração entre um professor de Psicologia inglês e um estudante francês a concluir um mestrado em videojogos na Escola Superior Rubika, em Valenciennes, França. Foi todo feito à distância.
“Os jogos são um dos meios de comunicação mais poderosos, porque é a ‘brincar’ que aprendemos, especialmente se formos mais novos. Aqui queremos mostrar que se podem salvar muitas vidas ao evitar-se comportamento descuidado na rua”, explica ao PÚBLICO Martin Jacob, 22 anos, que começou a programar o jogo há duas semanas.
A ideia original partiu do professor de Psicologia de Richard Wiseman, da Universidade de Hertfordshire, no Sul de Inglaterra, que começou a sentir que estava preso num videojogo cada vez que saía à rua e era obrigado a evitar pessoas e ciclistas na rua.
Jacob diz que “evitar vilificar o contacto social foi uma prioridade” de ambos durante as discussões sobre a narrativa do jogo. “A longo prazo, este tipo de jogos pode ter um efeito negativo se não existir cuidado. Não queremos promover a ideia de que o contacto com o outro é mau”, reconhece o estudante francês. “Por isso é que optámos por um ambiente soalheiro, em que há pessoas a circular na rua, ciclistas, e até famílias. A nossa missão não é motivar as pessoas a ficarem fechadas em casa sem socializar, mas explicar que é preciso respeitar novas regras.”
Não é a primeira vez que os videojogos são utilizados como um portal de aprendizagem para lidar com pandemias. Algumas organizações de saúde, como o Centro de Doenças Infecciosas (CDC), dos EUA, destacam o Plague (um jogo de estratégia popular em que o objectivo é criar surtos de doenças, manipulando condições globais) por alertar sobre a disseminação de doenças, mantendo uma abordagem informativa.
“Há muitos estudos que mostram que as pessoas podem assimilar diferentes comportamentos a partir dos videojogos”, sublinha Jacob. Dá como exemplo trabalhos que mostram que os videojogos podem ser usados para ensinar bons hábitos de alimentação em crianças, ou desenvolver a inteligência emocional em adolescentes. Para Jacob, é fundamental mostrar que os videojogos não estimulam apenas comportamentos negativos.
O facto de quase ninguém usar máscara em Can You Save the World? foi uma decisão da equipa para tornar o jogo mais apelativo para crianças, ao mostrar pessoas a sorrir na rua. “Tentámos colmatar isto ao mostrar que recolher máscaras permite ganhar pontos e proteger de um contágio”, admite Jacob.
Personagens “contagiadas” ficam em quarentena
O jogo também mostra que quantas mais pessoas há na rua, mais difícil é evitar o contacto. Cada vez que se perde — depois de se passar demasiado perto de várias pessoas quando já não há máscaras disponíveis —, o jogo recomeça com um novo protagonista.
“Fizemos isto por dois grandes motivos. Primeiro, queríamos ser o mais inclusivos possível, ao mostrar pessoas de diferentes idades, etnias, géneros e estilos. E, depois, queríamos mostrar que quando se ignoram cuidados básicos ‘acabou’”, explica o estudante. “O jogo recomeça com uma nova personagem, dando a ideia de que a anterior está em casa, de quarentena ou doente.”
O objectivo da equipa, que conta com quatro pessoas no total, é conseguir disponibilizar o jogo em mais línguas (actualmente, só há versões em inglês e francês), e disponibilizá-lo nas lojas de aplicações da Apple e do Google. Como se trata de um processo demorado, e muitos países já reiniciaram o retorno à normalidade, a equipa decidiu lançar já uma versão online.
Até agora, o jogo está a ter sucesso nas redes sociais, com muitos utilizadores a partilhar imagens no Twitter. Encontrar um rolo de papel higiénico (um objecto que é tão raro no mundo virtual para lembrar a explosão pela sua procura no mundo real) é visto como motivo de orgulho.
“Queremos que as pessoas se divirtam com o jogo”, justifica Jacob. “Queremos mostrar aos mais novos que o ‘novo normal’ não tem de ser assustador, e que podem sair à rua se respeitarem algumas regras.”