Legionella ou a sabotagem da plataforma informática?

Temos visto Paulo Macedo numa acção de charme, exibindo um ar preocupado de empatia frente às câmaras dos canais chamados ao local para gravarem o terno momento de contacto entre governados e Governo.

Numa série de visitas posteriores à sua primeira aparição pública, e agora sem a companhia de um excessivamente bem-disposto colega de equipa ministerial, temos visto Paulo Macedo numa acção de charme, exibindo um ar preocupado de empatia frente às câmaras dos canais chamados ao local para gravarem o terno momento de contacto entre governados e Governo. Desconhecemos se o mesmo ministro visitou algumas das pessoas que estarão internadas por complicações evitáveis mas não evitadas por terem esperado demasiado tempo para realizarem testes e exames de diagnóstico. Também desconhecemos se visitou doentes vítimas de infecções hospitalares. Problemas para os quais, em três anos de governação, este ministro, a quem uma deputada do partido do Governo terá apelidado de “visionário”, não teve qualquer visão política.

Entretanto, para trás na memória pública terá ficado o embaraçosamente pobre “debate” parlamentar sobre o Orçamento do Estado (OE) 2015 para a Saúde. Na abordagem manipuladora a que já nos habituou, o ministro da Saúde conseguiu deturpar a discussão lançando uma alegada “suspeita de sabotagem na plataforma informática da Saúde”. Terá sido uma espécie de “soundbite” para nos distrair da sua contínua incapacidade de gerar qualquer tipo de política de saúde para Portugal? Agora que, do Citius não houve prova da suspeita, ficamos a aguardar o resultado da investigação sobre o caso da Saúde. Ou será que não avançou? Temos a obrigação de indagar até que ponto o ministro da Saúde terá investido alguns milhões de euros do erário público no desenvolvimento de uma plataforma para a Saúde que, quiçá reflexo da sua incompetência na liderança de processos de gestão da mudança, terá falhado nos seus objectivos? Altos responsáveis do seu ministério terão anunciado em várias sessões públicas que esta plataforma possibilitaria ao cidadão, entre muitas outras funções, a possibilidade de marcação de consultas e exames, assim como aceder em tempo real aos tempos de espera nos hospitais do SNS. Funções que, de tão básicas em outros sectores, não deixariam ninguém muito impressionado. Como explicar, então, o atraso da sua disponibilização na Saúde? Observemos os desenvolvimentos durante as próximas semanas.

Entre casos de legionella e a alegada sabotagem da plataforma informática, esvaziou-se o debate do OE para a Saúde, que não deveria ter passado sem a constatação pública da ausência de qualquer indício de políticas de saúde num documento que, para o sector, não passa de um rol de intenções contabilísticas.

No sentido de não permitirmos que a manipulação operada pelo ministro nos distraia do fundamental, teremos de voltar a alguns aspectos que ficaram por discutir em relação ao OE. Ficàmos perplexos com o anúncio de que "os hospitais falidos só receberão injecção de capital se assumirem compromissos concretos de manter as contas em dia”. Tratando-se de uma regra básica de contabilidade, surpreende-nos a sua súbita promoção a princípio nobre de política de saúde. Porém, reforça a nossa percepção de que, em três anos de governação, Macedo não conseguiu implementar qualquer reforma sistémica com impacto nos hospitais. A projecção de imagem de homem que salvou os hospitais da falência é absolutamente patética. A verdade é que, neste campo, está tudo na mesma desde 2011. Por outro lado, a entrega de pequenos hospitais a Misericórdias, sem sabermos de nenhuma reforma transparente do financiamento do SNS, parece apenas um “Acto de Fé” em oposição à aparente inviabilidade económica da maioria desses projectos. O OE para Saúde foi aprovado sem debate. Resta a esperança das eleições.

Membro do centro de investigação da Medical Tourism Association, EUA

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