Clínica privada recebe mulheres dos hospitais públicos
Director-geral de Saúde admite que há centros de saúde com ruptura
de stocks de contraceptivos orais
a A primeira clínica privada licenciada para fazer abortos em Lisboa já está a receber mulheres enviadas por três hospitais públicos da região e recebeu contactos de mais sete, informou ontem a directora da clínica dos Arcos, Yolanda Hernandez. A regulamentação da nova lei do aborto entrou ontem em vigor.No primeiro dia de portas abertas na clínica espanhola fizeram consulta prévia à interrupção voluntária da gravidez (IVG) 30 mulheres, um número bastante superior às 16 que tem recebido semanalmente o Hospital de S. João, no Porto, ou as 18 que estavam marcadas para esta semana no Hospital de Santa Maria, em Lisboa.
O Hospital S. Francisco Xavier, Lisboa - um de oito hospitais que não avançou com a IVG por falta de capacidade de resposta - é uma das unidades públicas que vai encaminhar mulheres para a clínica privada espanhola, pagando os custos, informou o presidente do conselho de administração do centro hospitalar de Lisboa Ocidental), José Miguel Boquinhas. Já a outra unidade privada licenciada, a Clínica de Oiã ( Aveiro), não foi contactada por hospitais e atendeu ontem quatro mulheres, disse o seu director, Amílcar Pereira.
A rede de unidades aptas a fazer IVG é constituída por 38 hospitais públicos e duas clínicas privadas, mas podem ser acrescentadas unidades ao longo do tempo, esclareceu ontem o director-geral de Saúde, Francisco George, em conferência de imprensa.
As previsões oficiais são de 20 mil abortos por ano, número que George espera que se mantenha próximo deste valor nos primeiros cinco anos, mas que depois vá descendo. Isto porque é intenção da Direcção-Geral da Saúde (DGS) "intensificar o programa de planeamento familiar para reduzir o número de gravidezes indesejadas", disse.
Questionado pelos jornalistas, o responsável admitiu, contudo, que há centros de saúde onde "existe ruptura do stock de anticoncepcionais orais nos centros de saúde". Os grupos de intervenção prioritária no planeamento familiar deverão ser os mais pobres, imigrantes e os mais jovens.
Contrariando a reivindicação da Ordem dos Médicos (OM), tanto George como Jorge Branco disseram ontem que não será criado um registo nacional de médicos objectores de consciência. São poucos os médicos que trabalham até agora no privado (cerca de dez) e muitos estão em exclusividade, notou o director-geral da Saúde.
George tentava assim afastar a hipótese de poder haver médicos que se apresentam como objectores ao aborto no público e não no privado. Jorge Branco acrescentou que houve dúvidas se um registo com estes dados seria aprovado à luz da legislação da protecção de dados.
A OM lamentou ontem que o Ministério da Saúde não tenha avançado com uma registo nacional de obstetras objectores. "O país não tem qualquer maneira de impedir" que os obstetras contornem no sector privado a objecção de consciência declarada no público", admitiu o bastonário à Lusa. A OM vai agora tentar promover esse registo, acrescentou.
Objectores de consciência
A objecção de consciência foi declarada por 100 por cento dos médicos no S. Francisco de Xavier, nos hospitais de Évora, da Terceira e São Miguel. O presidente do governo açoriano garantiu que a região vai comparticipar as despesas das mulheres que não puderem fazer abortos nos Açores.
Com níveis de objecções de consciência que impedem a prática de interrupção voluntária da gravidez estão os hospitais da Guarda, Viana do Castelo, Leiria e o Hospital Pedro Hispano (Matosinhos). No Hospital Santo António não foram avançadas explicações para o facto de não começarem a cumprir a lei.
35 enfermeiros declararam-se objectores de consciência à nova lei do aborto, disse a respectiva Ordem