Politécnico de Viana do Castelo estuda castas minoritárias tintas do Alto Minho

As uvas Alvarelhão, Pedral e Verdelho tinto poderão ajudar a valorizar ainda mais a sub-região de Monção e Melgaço e “sustentar científica e tecnicamente uma Denominação de Origem”.

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O Politécnico de Viana do Castelo está a caracterizar castas minoritárias no Alto Minho, nomeadamente tintas, com o objectivo de criar novas "oportunidades de valorização" daquele território Rui Oliveira
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Recuperar variedades tintas do encepamento tradicional de Monção e Melgaço, sub-região dos Vinhos Verdes onde a uva branca Alvarinho é rainha, ou usar funcho do mar na gastronomia minhota são algumas das linhas de investigação que o Núcleo Tecnológico para a Sustentabilidade Agro-alimentar (Nutrir) do Instituto Politécnico de Viana do Castelo tem vindo a explorar no âmbito de um projecto financiado pelo Portugal 2020 e que agora continua graças a "parcerias com privados, municípios" e fundos de outros projectos relacionados.

Nuno Vieira e Brito, coordenador do Nutrir, explica que a equipa multidisciplinar do Politécnico de Viana do Castelo (IPVC) está investida em "explorar aspectos do território mais esquecidos ou desaproveitados", por forma a "acrescentar conhecimento e inovação" ao sector agro-alimentar no Alto Minho. O objectivo final é, sempre, gerar negócio e, como uma coisa leva à outra, captar e reter jovens altamente qualificados em zonas rurais que actualmente não lhes oferecem esse estímulo.

Criado com fundos do Portugal 2020, o projecto que deu origem ao NUTRIR já terminou, explica o investigador, mas deixou sementes. Os resultados alcançados pela equipa liderada por Nuno Vieira e Brito, que esta sexta-feira estão a ser apresentados numa conferência em Melgaço, permitiram alavancar novos projectos, financiados pelo Plano de Recuperação e Resiliência português.

O Nutrir começou com três investigadoras doutoradas e conta hoje com essas especialistas e mais quatro bolseiros. "Definimos três áreas distintas, em que temos vindo a trabalhar: viticultura e enologia — e dentro dessa área temos feito trabalho com o Loureiro e o Alvarinho e simultaneamente na caracterização de castas minoritárias, nomeadamente as castas tintas, para haver alguma diversidade e criarmos outras oportunidades de valorização [em Monção e Melgaço] —, recursos endógenos — aqui o trabalho é na área da etnobotânica, da caracterização de plantas locais e da sua utilização para compostos, antioxidantes por exemplo — e, terceira área, recursos animais — estamos a falar da promoção do fumeiro, quer no sector primário, quer mesmo na transformação, promovendo a Indicação Geográfica Protegida que já existe e reforçando [a argumentação para] a ETG [Especialidade Tradicional Garantida] Arroz de Sarrabulho, que está na fase final e aguarda resposta de Bruxelas."

Entre as linhas de trabalho que já tiveram resultados e mostraram merecer ser aprofundadas está a recuperação das variedades tintas Alvarelhão — ou Brancelho, como lhe chamam no Minho —​, Pedral e Verdelho tinto. São castas minoritárias, o que quer dizer que não é possível obter material vegetativo certificado para multiplicação — segundo o Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV), actualmente ainda existem cerca de 140 variedades minoritárias em Portugal; de notar, contudo, que em 2019 eram quase 200.

Segundo Nuno Vieira e Brito, o projecto do IPVC conta com um enólogo que está a analisar as variedades que possam servir para imprimir maior diversidade ao portefólio de vinhos da região, em concreto da sub-região de Monção e Melgaço. Essa diversidade pode vir a ser mais um argumento para que a sub-região vitivinícola de Monção e Melgaço, sobretudo conhecida pelos vinhos de Alvarinho, passe a ter território de uma Denominação de Origem (DO) Protegida, como é pretensão há vários anos de muitos produtores locais. "Estamos a caracterizar o terroir, o que é necessariamente importante para sustentar científica e tecnicamente uma Denominação de Origem", ressalva Nuno Vieira e Brito.

Na área da botânica, a ideia dos investigadores do IPVC é que o Alto Minho possa valorizar determinadas plantas autóctones utilizando-as para fins medicinais, cosméticos ou têxteis. E, nessa linha de estudo, o Politécnico está a olhar para o sanguinho, a carqueja, tormentelo (planta da família dos tomilhos) e para o mentrasto (da família das mentas).

O funcho do mar, da zona de Caminha, também tem potencial para vir a ser utilizado na gastronomia do Alto Minho.

Outros investigadores estão a olhar para a recuperação do fumeiro numa região que tem perdido produtores e, consequentemente, essa tradição gastronómica, bem como para a possibilidade de recuperar para a gastronomia regional raças autóctones avícolas que existiram outrora na zona de Valença.

Como projecto financiado, o Nutrir terminou. Mas o núcleo a que deu origem continua a trabalhar na transferência de conhecimento na área do agro-alimentar, sempre com o desenvolvimento do território e do sector primário do Alto Minho em vista.

Na conferência desta sexta-feira, participam produtores de vinho parceiros e interessados nestas matérias, como Márcio Lopes, por exemplo, orador responsável pela palestra "Castas minoritárias e tendências de futuro", bem como parceiros e empresas de outros sectores, como o centro de inovação tecnológica têxtil ​Citeve ou a Zoopan, empresa portuguesa produtora de medicamentos e suplementos para animais, com interesse no potencial antioxidante das plantas caracterizadas pela equipa do IPVC. "Castas Locais VS Castas Resistentes", por Jorge Cunha, do INIAV, e sobre castas híbridas, um assunto a que o PÚBLICO dedicou recentemente uma reportagem alargada, é outra palestra agendada para esta tarde.

"Hoje estamos a apresentar o estado da arte [das diferentes linhas de investigação] e a promover uma troca de experiências com a Galiza e com empresas que estão a trabalhar connosco."

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