O casal Isabel e Osvaldo Dias está a tirar uma selfie no meio do Salão de Degustação do Vinhos de Portugal no Brasil, o evento organizado pelos jornais PÚBLICO, O Globo e Valor Económico em parceria com a ViniPortugal e curadoria da Out of Paper, e que arrancou na sexta-feira, dia 7, no Jockey Club do Rio de Janeiro, prolongando-se nesta cidade até domingo, dia 9, seguindo depois para São Paulo, de 13 a 15.
A família quer uma recordação desta 11ª edição, até porque até agora só perderam duas. Mesmo durante a pandemia, participaram à distância, recebendo o kit de vinhos em casa e assistindo online às provas guiadas pelos críticos a partir de Lisboa. “Viemos desde a primeira edição, que foi no Consulado de Portugal, maravilhosa, mas que não comportaria hoje tanto público interessado”, diz Isabel, sublinhando que o interesse dos brasileiros pelo vinho português não tem parado de aumentar. “Estamos a começar a sair do Mercosul. Nada contra, mas temos que conhecer outros produtos.”
Chile e Argentina, que há muito ocupam os dois lugares cimeiros no top de vendas de vinho no Brasil, beneficiando precisamente da ligação ao Mercosul, “caíram muito nas vendas em 2023”, confirma o presidente da ViniPortugal, Frederico Falcão. Portugal, pelo contrário, continua a crescer no Brasil que, se retirarmos o vinho do Porto (sem grande expressão por aqui), representa já o segundo mercado de exportação de vinho português.
“No ano passado, teve um crescimento acima dos 8% enquanto as exportações portuguesas para os EUA caíram, o que colocou o Brasil no primeiro lugar”, explica Frederico Falcão. “E até Março deste ano estamos a sentir a mesma coisa, com o Brasil a crescer acima dos 12%.”
No quadro global, se se contar com o vinho do Porto, o mercado brasileiro ocupa o quarto lugar, a seguir a França, Estados Unidos e Reino Unido. O trabalho da ViniPortugal com eventos como o Vinhos de Portugal – que depois do Rio segue para São Paulo, de 13 a 15 – é o de elevar o posicionamento dos vinhos portugueses, prossegue Frederico Falcão. E evidenciar a sua grande diversidade. “Os nossos vinhos oferecem o que os outros não têm, que é a diferença. “Ouvi muita gente em São Paulo a usar esta expressão: tudo menos Chile e Argentina. São dois líderes de mercado, mas as pessoas começam a procurar vinhos diferentes e Portugal oferece isso.”
Houve já um momento no passado em que Portugal conseguiu ultrapassar a Argentina e posicionar-se em segundo, se pensarmos em volume de vendas e não em valores, mas depois voltou ao terceiro. Frederico Falcão está optimista com o que vê neste momento: “Tinha a esperança de que em 2023 ultrapassássemos novamente a Argentina. A verdade é que não passámos, ficámos encostadinhos mas não passámos. Mas em 2024, com a Argentina a continuar a cair e nós a crescer, acredito que iremos recuperar o segundo lugar.”
Mas nem tudo são boas notícias: em termos de valor ainda há muito trabalho a fazer. “A situação que se vive em Portugal com excesso de oferta faz com que os produtores procurem os mercados onde estão a ter sucesso e o Brasil é um deles. O que acontece é que crescemos em volume mas perdemos em preço médio”, explica o presidente da ViniPortugal.
Mostrar coisas diferentes é o que os mais de 90 produtores que participam nesta edição do Vinhos de Portugal se empenham em fazer. Daniel Niepoort, filho de Dirk Niepoort, veio este ano pela primeira vez ao Brasil e conta a sua experiência de apenas um dia a fazer provas. “Estiquei um bocadinho a corda porque percebi que aqui, especialmente no vinho tinto, as pessoas gostam de muito álcool e muito extraído, mas eu quis mostrar-lhes um Nat Cool tinto feito com Baga que parece um rosé, um tinto muito leve, e perguntei-lhes ‘o que é que acham disto? E alguns reagiram super bem, outros disseram ‘isto não é um tinto, é um rosé’.” Mas é, acredita, um primeiro passo para mostrar outros perfis de vinho.
António Maçanita, também estreante no evento, trouxe, entre outros, os vinhos que faz nos Açores e numa das provas principais, dirigida pela sommelière argentina a viver no Brasil desde há muito, Cecília Aldaz, mostrou imagens e falou dessas vinhas onde nasce o Arinto dos Açores, em terras vulcânicas, e das quais se diz que “as melhores são aquelas onde se ouve o cantar do caranguejo” por estarem tão próximas do mar, explicando de onde vem a enorme mineralidade e salinidade destes vinhos.
No exterior, numa das provas do espaço Tomar um Copo, que são gratuitas e oferecem ao público do evento a oportunidade de provar dois vinhos e de ouvir uma conversa de meia hora com os produtores e figuras públicas brasileiras, o produtor da Ervideira, Duarte Leal, apresentou o seu vinho Invisível, um branco feito de uvas tintas e, perante uma assistência muito interessada e com imensas perguntas, explicou a técnica necessária para o fazer.
A aposta é, portanto, nessa diferença e diversidade que Portugal pode oferecer e que, nas palavras de Frederico Falcão, contrasta com a “monotonia” dos vinhos argentinos e chilenos. A manhã de sexta-feira, o primeiro dia do evento, arrancou com a sessão do Salão de Degustação dedicada aos profissionais do sector, das importadoras e distribuidoras aos representantes de garrafeiras e restaurantes, e também aí o interesse foi grande, confirmaram vários produtores.
A festa continua até domingo, e a partir da quinta-feira seguinte em São Paulo, onde o evento vai ter um espaço novo, o icónico Pavilhão da Bienal (ou Ciccillo Matarazzo), obra do arquitecto Oscar Niemeyer no Parque do Ibirapurea.