Depois de Margarida, Frederik vai ser o rei de um país onde as pessoas são mais felizes
Destemido, estudioso, com sentido de dever, mas sem problemas em se saber divertir ou até chorar em público (fê-lo no seu casamento). Frederik X assume a coroa dinamarquesa a 14 de Janeiro.
A Dinamarca está entre os países onde as pessoas são mais felizes, ora colocando-se em primeiro, ora segurando o segundo lugar, atrás da Finlândia, do Relatório Mundial da Felicidade, publicado pela Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável da ONU. Nestes primeiros dias do ano, porém, foi a tristeza que tomou conta do país, com a notícia da abdicação da rainha Margarida. “Chorei. Depois voltei a ver [a mensagem da rainha] e chorei outra vez (…); hoje, toda a Dinamarca está a chorar”, testemunhou Morten Pelch, que trabalha em relações públicas na cidade de Vejle, na Jutlândia, ao Guardian.
A chegada do novo rei não é, no entanto, motivo para angústias. Depois de ter sido mais conhecido como o “príncipe das festas” quando era jovem, há muito que Frederik conquistou os dinamarqueses, primeiro pela forma como encarou os estudos com seriedade (foi o primeiro membro da família real a concluir um mestrado – em Harvard, nos EUA, onde estudou apresentando-se com o apelido do pai, Monpezat), depois pelo empenho com que cumpriu treinos militares extensivos nos três ramos das Forças Armadas: na Marinha, no Exército e na Força Aérea.
Também integrou as Frømandskorpset, as forças navais de operações especiais de elite, onde ganhou a alcunha de “Pingo”, depois do seu fato de mergulho se ter enchido de água, obrigando-o a caminhar como um pinguim. E Frederik, a quem os dinamarqueses tratam simplesmente por Fred (e não é incomum encontrá-lo: na rua, num restaurante, numa esplanada), aceitou a alcunha com o bom humor pelo qual é reconhecido.
A carreira militar faz jus ao espírito aventureiro que Frederik revela desde cedo, assim como a sua veia desportiva: corre maratonas (já cumpriu as de Copenhaga, Nova Iorque e Paris e é um Ironman desde 2013) e pratica esqui de fundo (participou na Vasaloppet, a maior corrida da modalidade; 90 quilómetros entre Sälen e Mora). Além disso, participou em expedições exigentes, como à Mongólia, quando tinha apenas 18 anos, ou na Sirius 2000, que o levou ao Norte da Gronelândia, perfazendo quase três mil quilómetros em trenós puxados por cães.
Ver o mundo (também já escalou o Kilimanjaro e navegou o Atlântico) ajudou a que o príncipe tivesse um olhar crítico sobre as alterações climáticas. E, apesar de ser esperado um total afastamento da família real em relação à política, Frederik não se abstém de defender acções em prol da sustentabilidade, participando em fóruns e eventos ambientais.
Conto de fadas à dinamarquesa
Frederik nasceu a 26 de Maio de 1968, numa altura em que o trono dinamarquês ainda era ocupado pelo avô, Frederico IX. Na mesma altura, na Suécia, governava o seu bisavô, Gustavo VI Adolfo. Tornou-se príncipe herdeiro ainda antes de completar os 4 anos, com a morte de Frederico IX, a 14 de Janeiro de 1972, e a ascensão ao trono da mãe, como Margarida II. É na data em que cumpre 52 anos de reinado que Margarida entrega a coroa ao filho, sem a sumptuosidade de outras monarquias, como a que se assistiu com Carlos III de Inglaterra, mas com uma curta reunião no Palácio de Christiansborg, da qual sairá o anúncio do novo rei da Dinamarca, da Gronelândia e das ilhas Feroé.
No passado do futuro rei há muitas festas, a paixão por carros velozes e algum gosto pelo perigo, que viria a resultar em acidentes que exigiram hospitalização. “Não quero fechar-me numa fortaleza”, justificou o príncipe, clamando pelo direito à sua humanidade.
Quem foi assistindo à rebeldia da juventude, via alguma tentativa de chamar a atenção dos pais, ocupados com os afazeres da coroa. E Frederik viria a confirmar a suspeita, quando lembrou à revista New Idea, ter sido criado “por amas e governantas”. E continuou: “Não tive muito contacto com os meus pais até aos 21 anos. Quando era pequeno, era-lhes apresentado, já lavado e escovado, antes de ser posto na cama.”
Depois, apaixonou-se. Foi durante os Jogos Olímpicos de Sydney, em 2000, que Frederik conheceu Mary Donaldson (n.1972, Hobart), uma consultora de marketing australiana. Após a cerimónia de abertura do Jogos, Fred foi até a um pub, o Slip Inn, com o seu irmão, o príncipe Joachim, o primo Nikolaos da Grécia e a princesa Märtha Louise da Noruega, onde esperaram encontrar-se com um primo de Nikolaos: nada menos que o príncipe Felipe, futuro rei de Espanha. E foi este que os apresentou.
“A primeira vez que nos encontrámos demos um aperto de mão”, recordou Mary Donaldson já após o anúncio do noivado. “Eu não sabia que ele era o príncipe Frederik. Meia hora depois, alguém veio ter comigo e perguntou-me: ‘Sabes quem são estas pessoas?’”. Certo é que a ligação foi imediata para os dois. Mary falou de “um clique” e da sensação de entusiasmo; Fred confessou ter sentido que era ela a sua alma gémea assim que se conheceram.
Começaram por ter uma relação à distância e secreta, mas, um ano depois, acabariam por assumir o namoro. Em 2003, a rainha Margarida deu a sua bênção e o casamento realizou-se a 14 de Maio de 2004, deixando o país apaixonado pelo casal — mais ainda depois de Frederik não se ter coibido de demonstrar a emoção à flor da pele e chorado.
Entretanto, o casal teve quatro filhos e optou por uma educação muito diferente da que Fred recebeu. Afinal, avaliou o príncipe, falando sobre a sua própria infância, “não é possível que os nossos [filhos] sejam educados assim”. E, por isso, decidiram inscrever o primogénito, Christian, numa escola pública. “Como pais, queremos dar aos nossos filhos uma base sólida que lhes dê a força para serem eles próprios naquilo que para eles será frequentemente um mundo extraordinário”, explicou Mary. Além de Christian, que tem agora 18 anos, o casal tem outros três filhos: Isabella, de 16, e os gémeos Vincent e Josephine, de 12 anos.
Ao longo dos anos, o casamento entre Frederik e Mary foi sempre retratado como sólido e o casal era exemplo de um final feliz. E, desde 2019, Mary tem permissão para actuar como princesa regente, com funções de Chefe de Estado, em caso de necessidade, e, a partir do próximo dia 14, será rainha consorte.
Até que 2023 trouxe rumores que toldaram a imagem da família real dinamarquesa: uma publicação de mexericos espanhola exibiu fotografias em que se vê o príncipe a passear com a “socialite” mexicana Genoveva Casanova pelas ruas de Madrid, a jantarem juntos e a assistirem a um espectáculo de flamenco. E, sem imagens, acrescentou algo mais difícil de provar: “Chegaram de carro [a casa de Genoveva Casanova], entraram juntos e só sete horas depois é que o filho da rainha Margarida saiu da casa.”
Genoveva Casanova divulgou uma declaração em que nega qualquer relação romântica com o príncipe dinamarquês. “Nego categoricamente as afirmações que sugerem uma relação romântica entre mim e o príncipe Frederik. Qualquer afirmação desse tipo não só é completamente falsa como também deturpa os factos de uma forma maliciosa”, lê-se na nota, transcrita pela revista Hola. Já a Casa Real dinamarquesa remeteu-se ao silêncio, com Frederik e Mary Donaldson a apresentarem-se juntos em público.
Rumores à parte, os dois serão agora reis da Dinamarca, e parecem decididos a perpetuar a monarquia no país, sendo que a casa real beneficia de um elevado nível de aceitação. “Quando chegar a altura, eu comandarei o navio”, disse Frederik, em 2022, quando os dinamarqueses celebraram meio século de rainha Margarida II. “Segui-la-ei, tal como seguiu o vosso pai”, prometeu, dirigindo-se à mãe.