Quem é que aprende na semana antes do Natal?
Esta semana é a mais emocionante do ano, a da antecipação, da construção de laços de família e com a comunidade. Não me parece fazer sentido que seja passada de mochila às costas.
Querida Ana,
Quero as minhas netas de férias! Preciso delas para dar passeios à procura de troncos e folhas para o Presépio, para irmos às compras, para me ajudarem a embrulhar presentes e para sentir o espírito do Natal. O avô está desolado, precisa de ajudantes para a cozinha, quer passar-lhes as receitas que herdou da mãe.
Quando respondeste aos meus apelos, dizendo-me que vão ter aulas até dia 21 de Dezembro, quinta-feira antes do dia de Natal, achei que tinhas enlouquecido. Esta semana é a mais emocionante do ano, a da antecipação, da construção de laços de família e com a comunidade, e não me parece fazer qualquer sentido que seja passada de mochila às costas e numa sala de aulas. Ou a dar aulas, porque a minha empatia também vai para professores sequestrados na escola.
Diz-me, quem é que aprende na semana antes do Natal? Quem é que ensina nestes dias? Há greves espalhadas por todo o ano, aparentemente não faz diferença não terem aulas dezenas de vezes, como se explica este afã de aprendizagem em dias únicos como estes?
Sinceramente, parece coisa de orfanato dos livros do Charles Dickens, ou um truque malévolo do Grinch, decidido a roubar-nos o Natal.
De onde veio esta ideia? E como podemos revertê-la?
Querida Mãe,
Não vou agora discutir a grande questão sobre se é melhor organizar o calendário escolar por períodos ou por semestres. Quando não tiver tantos presentes para fazer, explico-lhe e dou-lhe a minha opinião. Mas concordo que em qualquer um dos cenários a semana antes do Natal é sagrada. Quer se acredite que esta é uma festa religiosa, ou não, é para toda a gente um tempo de família, e nem os alunos, nem os professores deviam estar na escola.
Sei que voltamos sempre ao mesmo — há muitos pais que não podem mesmo tirar férias nesta altura —, mas mesmo assim parece-me que tanto no caso de ficarem num ATL, ou em casa dos avós, viverão o tempo de Natal de uma maneira muito mais livre.
Durante o pré-escolar, vivem-se muitos momentos de aprendizagem em torno das estações do ano, dos feriados ou das festas tradicionais. É uma decisão pensada, não é fruto do acaso e, decididamente, não é uma coisa de “bebés”.
Temo-nos organizado assim desde o princípio dos tempos, respeitando clareiras de paragem, de espiritualidade, de encontro uns com os outros. O Natal não pode passar a ser só “mais um dia”, entre todos os outros. Não pode ser um pretexto para dar e receber presentes. É a esperança que renasce numa manjedoura, e neste ano de guerras tão violentas, precisamos dela mais do que nunca.
Por isso, sim, compreendo a sua indignação.
Beijinhos
Ana
O Birras de Mãe, uma avó/mãe (e também sogra) e uma mãe/filha, logo de quatro filhos, separadas pela quarentena, começaram a escrever-se diariamente, para falar dos medos, irritações, perplexidade, raivas, mal-entendidos, mas também da sensação de perfeita comunhão que — ocasionalmente! — as invade. E, passado o confinamento, perceberam que não queriam perder este canal de comunicação, na esperança de que quem as leia, mãe ou avó, sinta que é de si que falam.