O novo livro de Margarida Gaspar de Matos é uma ferramenta para lidar com a nova geração
No livro Adolescentes, nas livrarias a partir desta terça-feira, a especialista tem conselhos para pais e professores, não para saber como lidar com jovens, mas para cuidarem da sua própria saúde mental e do seu bem-estar.
A investigadora Margarida Gaspar de Matos defende que a maioria dos jovens vão sair da pandemia sem ajudas e no livro Adolescentes dá ferramentas a pais e professores para lidarem de forma mais tranquila com esta geração. Editada pela Oficina do Livro, a nova obra da psicóloga clínica chega às livrarias nesta terça-feira e é apresentada no dia seguinte, 23 de Fevereiro, em Lisboa.
A coordenadora da task-force das Ciências Comportamentais, uma plataforma criada por causa da pandemia, diz que é preciso ouvir os jovens e criar uma estrutura que lhes permita concretizar as suas ideias, para que abandonem a apatia, aprendam a viver com a incerteza e recuperem o entusiasmo.
Margarida Gaspar de Matos considera que 80% dos jovens vão sair da pandemia sozinhos, sem ajudas, e lembra que esta geração “já tinha apanhado” com a recessão económica, confessando que os achou mais apáticos nessa altura. “Confesso que os achei mais apáticos a seguir à recessão económica do que agora. Também a recessão económica clivou muito a sociedade, mulheres e homens, ricos e pobres, novos e velhos, ficou tudo muito clivado. Ao passo que esta pandemia juntou as pessoas”, explica.
No livro Adolescentes, a especialista também tem conselhos para pais e professores, não para saber como lidar com jovens, mas para cuidarem da sua própria saúde mental e do seu bem-estar. “Um bocadinho de egoísmo é muito bom para conseguirmos ajudar os outros. Se nos estampamos a ajudar os outros e não pensamos em nós um bocado, não sobra para ninguém”, descreve.
A investigadora explica a dificuldade de escrever mais um livro sobre jovens, evitando a repetição de ideias e, num trabalho atravessado por uma pandemia, a de encontrar um resultado com informações que não ficassem ultrapassadas nos meses seguintes. A psicóloga clínica e professora catedrática da Faculdade de Motricidade Humana, da Universidade de Lisboa, conta que partiu de teasers lançados por especialistas, a quem pediu “quatro linhas de desafio”, para construir a narrativa deste livro, que tem ainda testemunhos de adolescentes e diversos dados das mais recentes investigações internacionais sobre juventude.
Aprender a viver com a incerteza
A autora é da opinião que os jovens “não estão à espera que os ajudem”, e acredita que a maior parte vai sair desta pandemia “sozinhos e com organizações autónomas”. Cabe, ainda assim, aos adultos “permitir que isso aconteça”.
“Cerca de 80% vão rapidamente restabelecer-se e virar a página, como fizeram os da Segunda Guerra e os do 25 de Abril. Os que ficaram com algumas marcas mais negativas precisam obviamente de ser ajudados, e as políticas públicas, professores e pais farão um esforço nesse sentido. Os outros têm de agora recomeçar a reorganizar-se entre si para voltar, por exemplo, às questões climáticas, que estavam tão acesas antes da pandemia e agora quase que não damos por elas”, afirma.
Os jovens, defende, “têm de aprender a viver tranquilamente com a incerteza e com a mudança permanente”, senão “é uma geração que vai ficar muito inquieta”. E alerta: “Sem essa ajuda para conseguir viver tranquilamente com a mudança tendem a achar que não são capazes e a desmobilizar. E vejo muitos miúdos desmobilizados em relação à vida, preferem ficar na cama do que irem passear e fazer mais do mesmo do que ter experiências novas, o que não é geracional.”
No livro, a investigadora chama a atenção para a necessidade de repensar a escola com urgência, para melhor aproveitar competências e reganhar o entusiasmo típico da juventude. “É preciso serem valorizados por terem ideias... Se nós tivermos uma escola onde cada menino que tem uma ideia é o menino do professor não se vai a lado nenhum”, desabafa.
Lembra igualmente que os jovens hoje têm “outra visão das questões da religião, como está não lhes serve, e dos partidos, pois como estão também não lhes servem”, assim como outra visão da escola. “Eles próprios estão a começar a evoluir nas alternativas e o que se pode fazer é ajudá-los a ser proactivos e a transformar a iniciativa em mudança. É pedir alternativas, ver com eles o que se pode mudar.”
A investigadora defende ainda que “é preciso criar uma estrutura para que as suas inovações tenham possibilidade de andar para a frente”. “É preciso outra narrativa que não seja a dos partidos (...), a que eu chamo de Democracia 3.0”, afirmou, insistindo: “Outra forma de eles participarem e serem enquadrados, pois se a participação não está próxima das decisões, não tem futuro.”
No livro, lembra as alterações da pandemia, sobretudo dos períodos de confinamento — nas famílias, nos encontros com os amigos, no lazer, no sono, na alimentação e na actividade física —, e toda a influência que teve na saúde mental dos jovens. Aliás, para estudar esse impacto, Margarida Gaspar de Matos está a desenvolver, para o Ministério da Educação, um inquérito/investigação nas escolas, que deverá ter os primeiros resultados no mês de Abril.
A psicóloga sublinha ainda a importância do diálogo intergeracional e deixa desafios para pais, avós e professores, ajudando-os a gerir emoções sob a forma de um semáforo, sugerindo que activem mais vezes as cores verde (desafio) e azul (serenidade) e menos o vermelho (medo).
No final do livro, sublinha o grande desafio de se encontrar o “meio termo” e escreve: “O grande desafio é estar com eles e ajudá-los na sua vida, sem querermos viver a sua vida por eles, e sem decidirmos deixar de viver a nossa vida por eles.”