Deixar as escolas abertas é um erro
Sabemos hoje que os casos existentes na comunidade escolar foram geralmente infecções trazidas de fora para dentro e não o inverso. Este indicador demonstra bem o esforço hercúleo que os professores e auxiliares têm feito para manterem as escolas abertas.
Bem sabemos que a decisão de fechar as escolas era tudo menos consensual. Nem especialistas de saúde pública, nem classe política e muito menos os professores conseguiram mostrar estarem de acordo neste processo. A divisão foi clara. Por conseguinte, o Governo decidiu agir em conformidade e fez aquilo que economicamente poderá ser visto como a medida menos lesiva. Mas fê-lo essencialmente porque lhe faltou, mais uma vez, coragem. Deixar as escolas de todos os níveis de ensino abertas é um erro que iremos pagar caro e que nos fará arrastar o confinamento ad aeternum.
No actual contexto exigia-se mais do Governo, mais coragem, mais assertividade e sobretudo mais humildade para ouvir quem todos os dias sai de casa para ir para a escola, sejam eles alunos, professores ou auxiliares. Preferiu ouvir pais e directores. Aí temos o resultado.
Mesmo que haja uma tendência científica que nos indique que a transmissibilidade do vírus é baixa em contexto escolar, seria importante reconhecer, de uma vez por todas, que as escolas não são bolhas nem ilhas e que por isso todas as movimentações que as escolas abertas geram deveriam fazer parte da equação. Só que não foram. Erradamente.
O Governo interpretou aquilo que quis dos estudos científicos e dos comunicados do Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC), que diz que o fecho das escolas é a medida menos eficaz, como medida isolada. Se ficássemos por aqui entenderíamos a medida anunciada por António Costa. Mas esse mesmo estudo acrescenta que “se os países estão a fechar locais de trabalho, centros comerciais e ajuntamentos públicos, então esta [o fecho das escolas] pode ser uma medida a ser considerada de forma adicional”.
O Governo ignorou também a perigosidade da nova variante do SARS-CoV-2 que apareceu no Reino Unido, e que segundo as amostras científicas preliminares é 70% mais contagiosa. Segundo o especialista Pasi Penttinen esta é “uma questão a que temos de ficar atentos pois há alguns indicadores preliminares de que esta nova variante pode comportar-se de forma diferente em crianças”.
Sabemos hoje que os casos existentes na comunidade escolar foram geralmente infecções trazidas de fora para dentro e não o inverso. Este indicador demonstra bem o esforço hercúleo que os professores e auxiliares têm feito para manterem as escolas abertas, mas também reforça a ideia de que fora dela não há quem controle. Sobretudo os alunos do 3.º ciclo e secundário. Já todos fomos adolescentes.
Quero com isto dizer que manter as escolas abertas é ignorar que o seu normal funcionamento não só não permite baixar o risco de propagação, baixando o RO, como o pode potenciar pois obriga a movimentações de milhares de pessoas de fornecedores a alunos, professores e funcionários. Faltou coragem. Espero estar errado, mas não agir assertivamente agora poderá obrigar-nos a prolongar o confinamento por mais tempo que o desejável.
O que defendi foi que se fechassem as escolas a partir do 3.ª ciclo, passando para E@A, que se incluísse com urgência toda comunidade escolar na primeira fase de vacinação e que se interrompessem por uma semana, pelo menos, o ensino presencial dos restantes ciclos para que toda a comunidade possa ser testada. O regresso seria faseado e sempre considerando os níveis de contágio de cada concelho.
Não ignorando que a escola é o maior suporte socioeconómico, entendo que a decisão de fechar ou não a escola seja complexa. Mas há que pesar muito bem os prós e os contras.
Se é verdade que fechar escolas tem um tremendo impacto educativo e social também é verdade que mantê-las abertas durante uma pandemia, que insiste em não dar tréguas, pode ter consequências incalculáveis. É tudo uma questão de equilíbrio que manifestamente não houve. E o equilíbrio seria ter fechado do 3.º ciclo em diante e manter os demais em presencial.
Só que isto só teria sido possível se o Governo tivesse feito a sua parte, relativamente às promessas do programa de Transição Digital. Não fez e agora age estando prisioneiro da sua falta de acção. O Governo acobardou-se porque não foi capaz de cumprir com as promessas, que foi fazendo desde Março, para a educação. Pena, pagaremos todos!