Tem ido às suas aulas de pilates mas, de repente, o ginásio abriu uma nova modalidade, o ioga, e fica indeciso. Ioga ou pilates, qual será melhor? O PÚBLICO foi perguntar aos especialistas destas modalidades.
A primeira diferença entre as duas é a sua origem. O pilates, criado pelo alemão Joseph Pilates (1880-1967), nos EUA, terá, mais coisa menos coisa, cerca de cem anos; o ioga — que foi classificado pela UNESCO como Património Cultural e Imaterial da Humanidade — tem cinco mil e nasceu na Índia. Se o primeiro tem como objectivo fazer exercícios para melhorar o bem-estar físico; o segundo é um todo: corpo e mente.
“Ioga significa ‘união’ entre corpo, espírito e mente”, começa por dizer Filipa Veiga, professora de ioga e autora do livro Yoga-me. “No ioga, a postura é o ponto de partida, porque o objectivo é preparar o corpo e a mente para práticas mais refinadas”, complementa Paulo Hayes, formador de ioga e professor no departamento de Ciências das Religiões da Universidade Lusófona de Lisboa.
Já no pilates, “o movimento é feito de forma consciente, rigorosa e tem vários benefícios: o fortalecimento da musculatura do centro do corpo; e do resto do corpo a partir do centro”, resume Marco Abreu, terapeuta de movimento e professor de pilates. Não há uma filosofia associada, mas princípios básicos como a respiração, foco, precisão, concentração e controlo, enumera André Gonçalves, professor de pilates e neuroterapeuta.
André Gonçalves dá o seu exemplo para que se percebam os benefícios do pilates: foi atleta de alta competição em pólo aquático, terminou a carreira com várias lesões e o pilates ajudou-o a recuperar. Hayes lembra o exemplo do criador do método, o próprio Joseph Pilates, que se inspirou no ioga, no tai chi e nas terapias orientais para desenvolver centenas de exercícios: quando criança, o alemão era doente, por isso, começou a estudar anatomia e fisiologia, e desenvolveu um método que lhe permitiu gozar de boa saúde por muitos anos.
Atenção às aulas em grupo
Filipa Veiga recorda um professor norte-americano que lhe contou “há muitos anos” que na Califórnia houve uma fase em que o pilates se tornou tão famoso que as pessoas diziam que o ioga tinha aparecido depois, o que ele refutava, lembrando que aquele já existia há cinco mil anos. A conversa terminou com um aviso: “Isso também vai acontecer na Europa.” E a premonição está agora a cumprir-se, diz a professora. “O ioga é tão antigo quanto a humanidade. E só isso é uma diferença brutal [em relação ao pilates]”, diz.
André Gonçalves diz que, em Nova Iorque, o pilates começou por ser praticado por uma classe socioeconómica mais elevada, por artistas e empresários. Por cá, segundo um estudo de Hayes, o ioga é praticado pela classe média e média alta. Se o pilates se popularizou e entrou nos ginásios há algumas décadas; o ioga tem sido praticado em academias e em classes com poucos alunos e só agora começa a ser uma oferta nos ginásios portugueses.
As aulas são diferentes quando feitas em grupos muito grandes, como os de ginásio. “Não há a conversa, a interacção entre o professor e aluno é menor porque há menos tempo. Numa aula normal [que não em ginásio], falamos de valores de vida porque o ioga é uma filosofia de vida que pode começar no tapete e depois os alunos começam a interessar-se por saber mais”, refere Paulo Hayes.
Num ginásio, numa aula de 50 minutos, será mais difícil conseguir meditar porque, a seguir, há outra aula, aponta Filipa Veiga. Por isso, a evolução natural de quem começa a praticar ioga no ginásio é “querer evoluir para mais qualquer coisa”. “A primeira motivação é sentir-se bem e, rapidamente, as pessoas começam a entender que há mais qualquer coisa. Começa pelo físico e depois entramos num nível mais profundo”, aponta.
Mas o mesmo acontece com o pilates, contrapõe Marco Abreu. Nas aulas com mais alunos, é difícil dar atenção a todos e recomendar exercícios específicos a cada um como, por exemplo, numa aula individual, onde todos os exercícios são pensados para a pessoa que se tem à frente. Por vezes, em aula de ginásio, os instrutores querem pôr os alunos a fazer os exercícios e não estão preocupados com as melhoras de cada um deles, critica. “A parte verdadeiramente importante é fazer com que todas as pessoas possam beneficiar do exercício”, acrescenta.
As modalidades complementam-se
Em comum, o ioga e o pilates têm o facto de disporem de várias correntes. Por exemplo, o pilates original é “duro, forte”, define Marco Abreu. “É militar. É preciso não esquecer que Joseph Pilates era alemão”, brinca André Gonçalves. Depois do criador, quem continuou com o método adaptou-o. “Há muitas interpretações, tal como no ioga”, refere Marco Abreu.
Os formadores de ioga não desmentem os do pilates: há diferentes tipos de ioga. Paulo Hayes lembra que este é fundamentalmente respiração e meditação, embora o que faz fotografias bonitas nas redes sociais seja “pôr uma perna atrás das costas, mas isso é 10% da prática do ioga”, aponta.
Antes de escolher entre o pilates e o ioga, o interessado deveria fazer uma avaliação neuromuscular, recomenda André Gonçalves. Na impossibilidade de o fazer, então deve “sentir o corpo através da prática. O corpo dá sinal se houver dor, desconforto ou outra alteração”, alerta. “O corpo da pessoa não deve servir a modalidade, mas esta é que deve servir o corpo”, acrescenta.
Quando não está a correr bem, há que o dizer ao instrutor, aconselha André Gonçalves. “É preciso responsabilizar o professor, para que encontre alternativas para, por exemplo, simplificar os exercícios. O desafio é, dentro da aula, conseguir acompanhar os alunos individualmente”, defende.
E, afinal, o que escolher? Filipa Veiga e André Gonçalves acreditam que as duas modalidades não são rivais. “Não há uma melhor do que a outra, são diferentes. O corpo é que tem de perceber. Quando faço ioga, adapto às minhas necessidades e, com o pilates, é a mesma coisa”, justifica o neuroterapeuta. “Não tem de ser uma nem outra porque se complementam”, afirma a professora de ioga.
Por isso, “se tiver de escolher, escolha aquela em que se sente bem”, conclui. No entanto, se procurar mais do que o exercício físico, Filipa Veiga não tem dúvidas: “Somos um depósito de tudo o que nos acontece e ficamos doentes porque não tomamos consciência do que somos. Somos seres mágicos e não estamos a usufruir dessa magia. O ioga é uma ferramenta para a descobrirmos!”