Onde estava Marcelo aos 10, aos 20… aos 60 anos
Aos 70 anos, Marcelo Rebelo de Sousa está em Belém, o topo da carreira para qualquer político. Aos dez já esperava pelo pai à porta do gabinete de António de Oliveira Salazar.
Ninguém nasce político mas Marcelo Rebelo de Sousa pode ser a excepção. A política começou a atravessar-se na sua vida quando ainda estava na barriga da mãe, à boleia de Marcello Caetano rumo à maternidade lisboeta onde nasceu, a 12 de Dezembro de 1948. Aos 10, aos 20, aos 30, aos 40, aos 50 e aos 60 anos, o agora Presidente da República esteve sempre em lugares de destaque, perto das esferas do poder, ora do político ora do mediático.
Aos dez, à porta do gabinete de Salazar
Marcelo Rebelo de Sousa é o mais velho de três irmãos rapazes e foi o grande companheiro do pai nos tempos em que Baltazar Rebelo de Sousa teve cargos políticos. Imaginá-lo aos dez anos é visualizar uma criança bem vestida e bem comportada sentada, sozinha, numa cadeira na antecâmara do gabinete de António de Oliveira Salazar, à espera do pai, subsecretário de Estado da Educação, que tinha ido ao despacho do presidente do conselho na vez do ministro, Francisco Pinto Leite, durante um período em que este esteve doente. Quando Marcelo tinha dez anos e ainda o chamavam de Celinho era a sombra do progenitor até nos momentos mais entediantes para uma criança. Gostava de política e de imitar os políticos. E era assim que se fazia notar. Aos seus onze anos, Salazar ofereceu-lhe algumas das suas obras com um autógrafo e uma dedicatória.
Aos 20, a dar conselhos ao pai
Em 1968, exactamente no ano que em que o estudante universitário Marcelo cumpriu duas décadas de vida e em que Salazar caiu da cadeira, Baltazar Rebelo de Sousa foi chamado para uma de duas funções: aceitar uma pasta no governo ou ser governador geral de Moçambique. Após um encontro de três horas com o presidente do conselho, reuniu-se a família para ajudar na decisão. Coube ao primogénito partilhar com os pais o pensamento dos filhos. “É como convidá-lo a atirar-se a um de dois poços, mas mal por mal Moçambique que corresponde a um sonho e a uma vocação sua”, disse Marcelo. Assim foi. Os pais e os irmãos rumaram a Lourenço Marques e o filho mais velho ficou, com a promessa de um jantar semanal em casa de Marcello Caetano, amigo da família.
Aos 30 anos na direcção do Expresso
Entre os 20 e os 30 anos de Marcelo passou-se o 25 de Abril, começou a amizade com António Guterres, os pais – Baltazar e Maria das Neves – deixaram Portugal rumo ao “exílio” no Brasil, Marcelo foi deputado constituinte, casou-se com Ana Cristina Motta Veiga, teve dois filhos, separou-se (nunca chegou a divorciar-se), viajou muito, assistiu à ascensão de Sá Carneiro, tornou-se um influente colunista, escreveu “Balsemão é lelé da cuca” e acabou como director do Expresso – aos 31 anos. “Nem um milímetro sequer se afastará o Expresso das linhas orientadoras da sua política editorial”, escreveu no primeiro editorial que assinou, acrescentando que Balsemão nunca esperaria do jornal “qualquer subserviência, favor, parcialidade ou contributo espúrio para o Governo em que se integra”.
Aos 40, um mergulho no Tejo
Podia ter sido a década menos política da vida de Marcelo Rebelo de Sousa, que entretanto se transerira para o jornal Semanário e se dedicara ao conselho directivo da faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, mas não foi. Aos 40 anos, Marcelo acabou por avançar como candidato do PSD à Câmara Municipal de Lisboa numa campanha que o reaproximou do partido, mas que acabou em derrota. Em Maio de 1989, Marcelo soube que entraria na corrida a Lisboa e no Verão apresentou a candidatura, no Castelo de São Jorge. A surpresa acabou por vir do PS. “Bolas, Marcelo, saiu-nos um touro de 600 quilos”, ter-lhe-á dito António Pinto Leite, então líder da distrital de Lisboa do PSD, sobre o seu adversário: Jorge Sampaio. Mas o entusiasmo do social-democrata não esmoreceu. Quando decidiu mergulhar no Tejo, naquilo que Vítor Matos descreveu na biografia consentida como “um espectáculo de natação fluvial”, Sampaio andava na Disneylândia, nos EUA, com os filhos, e os socialistas quiseram que viesse de lá a correr com medo dos efeitos que tal campanha podia ter nos resultados. Marcelo ainda andou pelas ruas de Lisboa ao volante de um táxi. Ganhou seis contos. Perdeu as eleições.
Aos 50 anos, de saída do PSD
Foram pouco mais de mil dias os que Marcelo Rebelo de Sousa esteve na liderança do PSD. Durante esse período, que o apanhou à beira dos 50 anos, António Guterres liderava o PS e os destinos do país em minoria. O social-democrata facilitou a vida ao primeiro-ministro, nomeadamente ao aprovar alguns dos orçamentos socialistas, mas também tentou criar um bloco de direita para lhe fazer frente. Foi nesse contexto que quis recriar a Aliança Democrática com Paulo Portas, então presidente do CDS. Não houve condições para um entendimento e a 26 de Março de 1999, Marcelo Rebelo de Sousa anunciou, em directo, o fim da segunda AD. “Assumo plenamente a minha responsabilidade pelo fracasso do projecto que lancei e conduzi até hoje”.
Aos 60 anos, na televisão de pedra e cal
Quando celebrou seis décadas de vida, Marcelo era o mais bem sucedido comentador televisivo em Portugal. Tinha inaugurado um estilo próprio na TVI a 13 de Maio de 2000 e estava já há dez anos no écran, sem descanso nos comentários e nas críticas. Deputados, líderes partidários, ministros, presidente da República, amigos… ninguém é poupado. Nem ele próprio, que acaba por ser instado a por Miguel Pais do Amaral a mudar o rumo dos comentários para não funcionar como uma “plataforma de derrube do governo de Santana Lopes”. Assim, os 60 anos já não os cumpre na TVI, mas na RTP, onde permanece entre 2004 e 2010 - ano do regresso à TVI. Foi de lá que saltou para Belém, onde festeja o 70º aniversário.