Novo chefe das "secretas" admite que sentiu “algum desespero” em Timor

O embaixador José Júlio Pereira Gomes foi chefe da missão de observação do referendo timorense de 1999 e está envolto numa forte polémica.

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miguel madeira

O embaixador José Júlio Pereira Gomes, recentemente nomeado secretário-geral do Sistema de Informações da República (SIRP) pelo primeiro-ministro António Costa, e antigo chefe da missão portuguesa de observação do referendo timorense de 1999, admitiu nesta terça-feira em declarações ao jornal online Observador que, depois do referendo, sentiu “algum desespero”.

“Presumo que todos os que estiveram em Timor-Leste, naquele período, experimentaram em diferentes momentos a sensação de medo“, admite Pereira Gomes, afirmando, porém, estar de “consciência tranquila”.

“Há mentiras que seriam duras de suportar caso não tivesse a consciência tranquila”, diz ao Observador.

O perfil para o cargo foi questionado pela eurodeputada do PS Ana Gomes, na altura embaixadora de Portugal em Jacarta. Já nesta terça-feira o deputado socialista João Soares, antigo membro do Conselho de Fiscalização do SIRP, defendeu no Facebook que o diplomata “não tem condições” para aceitar o cargo e que deve “renunciar já”.

Os jornalistas Luciano Alvarez, do PÚBLICO, e José Vegar, que na altura estava no Expresso, estavam também refugiados na sede da ONU em Timor-Leste e contestam a versão de Pereira. Segundo eles, Pereira Gomes tinha ordem do Executivo então liderado por António Guterres para ficar no terreno pelo menos até ao dia 11 de Setembro de 1999 (Pereira Gomes saiu a 10). As razões para se manter no país prendiam-se com o facto de no dia 11 estar prevista uma visita de observação do Conselho de Segurança das Nações Unidas a Díli.

Contam os jornalistas que Pereira Gomes pressionou várias vezes o Governo para deixar sair os membros da missão portuguesa, incluindo ao afirmar que se ficassem morreriam todos. Relatam ainda que, por volta das 5h da madrugada, o Ministério dos Negócios Estrangeiros autorizou a saída, recuando na ordem inicialmente dada. Vegar afirmou mesmo ao Observador que Pereira Gomes estava “em pânico”. Ana Gomes confirmou esta versão em declarações ao Diário de Notícias.

O ainda embaixador em Estocolmo reafirma ao Observador o que já tinha afirmado num artigo de opinião no PÚBLICO: “Não tinha o poder de decidir sobre o se, o quando e o como da eventual evacuação. Isso era responsabilidade do Governo. Que a assumiu no momento que julgou adequado”

“Nas horas que precedem a evacuação, todos falaram individualmente ao telefone com o MNE e tiveram a oportunidade de exprimir a sua posição”, acrescenta.

Ainda sem saber quando será ouvido no Parlamento, o embaixador diz saber que o primeiro-ministro está a reavaliar a sua escolha inicial, depois de admitir que não tinha conhecimento dos episódios de Timor. Assegura ainda que não vai recuar na aceitação do convite que lhe foi feito por António Costa para liderar o SIRP: “Ponderei longamente antes de aceitar e não me candidatei ao lugar. Aceitei o desafio como mais uma missão de serviço público, que é o que tenho feito desde há cerca de 42 anos.”

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