É frequente pensarmos no idadismo como preconceito ou discriminação dos adultos mais velhos, mas alguns “millennials” (nascidos entre 1981 e 1996) e pessoas da “geração Z” (nascidos entre 1997 e 2012) dizem que se deparam com o "idadismo inverso" ou o "idadismo jovem" com base na sua juventude.
Walt Jennings Grayson é um advogado de 28 anos de Raleigh, nos EUA, que frequentou uma faculdade de Direito de topo, foi admitido na Ordem dos Advogados da Carolina do Norte e da Carolina do Sul e exerce advocacia há três anos. Contudo, e apesar da sua formação, credenciais e experiência, sente-se desrespeitado no local de trabalho — não por não ser qualificado, mas por ser jovem.
Num dos casos que teve de tratar, um advogado adversário "fez um comentário depreciativo sobre o facto de eu ser mais novo, o que foi frustrante porque, obviamente, não posso controlar a minha idade". Também Tess O'Neill, de 20 e poucos anos, se queixa do mesmo: “Dizem-me muitas vezes que pareço mais nova do que sou, o que, por vezes, leva as pessoas a subestimar os meus conhecimentos ou a rejeitar as minhas opiniões. Pode ser frustrante quando as minhas ideias são ignoradas por causa disso. É frustrante quando as pessoas assumem que a minha idade significa que me falta experiência, apesar de ter trabalhado arduamente para desenvolver as minhas competências e conhecimentos."
Michael North, professor associado de Gestão e Organizações na Stern School of Business da Universidade de Nova Iorque, diz acreditar que os adultos com idades compreendidas entre os 18 e os 30 anos enfrentam mais discriminação em função da idade do que as pessoas mais velhas, especificamente os “boomers”, o que resulta da percepção, ou estereótipo, de que os jovens de hoje não estão à altura dos padrões de trabalho estabelecidos pelas gerações anteriores na mesma altura e idade. Diz que há uma certa ironia no facto de os “millennials” e a “geração Z” serem considerados, por muitos “boomers”, preguiçosos, que se acham no direito de ter tudo e ingénuos, quando os próprios “boomers” eram considerados hippies indolentes, presunçosos e ingénuos na sua juventude.
Uma investigação publicada pela Ageism, uma organização sem fins lucrativos que se centra em questões de discriminação em função da idade, sugere que "o idadismo inverso acontece quando se acredita que as gerações mais jovens são demasiado jovens ou inexperientes para serem úteis, conhecedoras ou capazes de gerir uma situação ou uma equipa. Muitas vezes, estes estereótipos são completamente falsos".
Inverter a prevalência do idadismo
No entanto, de acordo com estudos recentes, este tipo de idadismo é mais prevalente e insidioso do que muitos podem pensar. E pode ter impactos negativos na saúde física e mental dos mais jovens.
No site Glassdoor, a comunidade que permite pesquisar sobre locais de trabalho divulgou os resultados de um inquérito que levou a cabo em 2019 que descobriu que os funcionários mais jovens (52% das pessoas com idades compreendidas entre 18 e 34 anos) são mais propensos do que os funcionários mais velhos (39% das pessoas com mais de 55 anos) a testemunhar ou a experimentar idadismo no trabalho. Da mesma forma, um estudo publicado na revista Developmental Psychology concluiu que "as pessoas mais jovens relataram ter experimentado os níveis mais altos de discriminação por idade", pela falta de respeito por causa da idade e por serem maltratadas por isso.
Surpreendido? Sim, fiquei.
Parte do desafio de reconhecer o idadismo é o facto de ser muitas vezes difícil de detectar, ou seja, nem sempre é explícito. North afirma que as gerações mais velhas sempre se queixaram das mais novas. Prova disso são as frases batidas como: "Os miúdos de hoje em dia não têm maneiras." Até o antigo poeta grego Hesíodo escreveu, já em 800 a. C.: "Não vejo qualquer ajuda para o futuro do nosso povo, se depender da juventude frívola de hoje." Stéphane P. Francioli, professor na Wharton School of Business da Pensilvânia, que se dedica, em parte, à diversidade etária e às desigualdades entre gerações, explica o desafio de outra forma: "As pessoas pensam que não podem ser acusadas de preconceito contra os jovens, uma vez que elas próprias já foram jovens."
Numa publicação recente no Reddit, SadRain5, na altura com 28 anos, escreveu: “Idadismo inverso no trabalho? Já tive muitos colegas de trabalho que já fizeram comentários sobre a minha juventude ou até sobre a década em que nasci, assim como o facto de não compreender referências mais antigas da cultura pop.” Uma colega falava da sua idade “constantemente”. “Falava de uma referência e depois dizia: ‘Ah, mas tu não sabes quem é...’ Sinto que ela está a diminuir a minha capacidade profissional, em frente ao meu chefe e a outros colegas de trabalho."
Megan Gerhardt, professora de Gestão e Liderança na Universidade de Miami, cuja investigação se centra no preconceito em relação à idade no local de trabalho, afirma que não é difícil encontrar exemplos desses: um gestor que diz que um candidato "parecia um pouco jovem de mais para o cargo" ou trabalhadores mais velhos que se dirigem a colegas do sexo feminino como "meninas" ou fazem "elogios" como "não tens idade suficiente" para seres advogada, médica ou sócia.
Mas isto será efectivamente prejudicial para os mais jovens? Quando escrevo sobre o envelhecimento, recorro frequentemente a Becca Levy, professora da Universidade de Yale e autora de Breaking the Age Code: How Your Beliefs About Aging Determine How Well and Long You Live, cujos estudos concluíram que as pessoas mais velhas interiorizam o idadismo quotidiano, que as retrata como frágeis, rabugentas e desfasadas, contribuindo para uma miríade de problemas de saúde física e mental, incluindo perda de memória, perda de audição e episódios de falhas cardiovasculares. A autora refere que as crenças positivas sobre o envelhecimento estão associadas a uma melhor saúde e até a uma vida mais longa — 7,5 anos em média. Estão ainda em curso estudos semelhantes sobre o impacto do idadismo na saúde dos jovens.
Interiorizar as dúvidas dos outros
Gerhardt descobriu que alguns trabalhadores mais jovens parecem ter dúvidas sobre as suas capacidades: “Será que tenho experiência suficiente? Sou demasiado jovem para ser levado a sério no trabalho?” O'Neill compreende os desafios que partilha com algumas pessoas da sua geração: “Quando falo sobre os meus objectivos de vida, quer se trate da minha carreira, finanças ou desenvolvimento pessoal, ouço frequentemente comentários como: ‘Ainda és muito jovem, não precisas de te preocupar com isso’. Parece que as minhas prioridades estão a ser ignoradas só porque não estou na idade 'apropriada' para ter essas preocupações."
É claro que, por vezes, os estereótipos têm pelo menos uma ponta de verdade. Na pesquisa para esta coluna, lembrei-me de um caso em que o cirurgião experiente que eu tinha escolhido para uma operação complicada me perguntou se um médico interno mais jovem poderia fazer a cirurgia.
Embora o médico interno não tivesse muita experiência, tinha frequentado uma faculdade de medicina muito conceituada e feito o seu estágio no Duke University Medical Center. Inicialmente, recusei o pedido devido à sua idade — 30 e poucos anos — mas fui persuadido a mudar de ideias e o médico mais novo efectuou a cirurgia. Estaria eu a ser culpado de idadismo ou a procurar, justificadamente, um médico com mais experiência?
Penso que não vou ser criticado porque não considerei o jovem cirurgião preguiçoso, narcisista ou convencido — apenas menos experiente do que eu queria. E tinha razão, porque não me retirou uma margem cirúrgica suficiente e tive de repetir a operação algumas semanas depois, desta vez com o cirurgião mais velho e mais experiente que tinha escolhido inicialmente. Tenho uma cicatriz de três centímetros no meu antebraço direito para me lembrar dessa lição.
Da próxima vez que surgir uma situação destas, vou tentar lembrar-me de que o que importa é a experiência e não a idade. Afinal de contas, um médico mais jovem terá recebido formação recente e poderá estar mais a par das últimas investigações e técnicas. Vou fazer mais perguntas.