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Os lugares e as gentes de Sortelha estão agora Talhados na Pedra
Três fotógrafos e uma bióloga percorreram os territórios e comunidades de Sortelha para retratar uma paisagem humana a desaparecer. Talhados na Pedra é agora uma exposição, um livro e um filme.
Horizontes de paisagens agrestes, a crueza do granito, os rostos enrugados, a ruralidade indelével. Durante uma semana, três fotógrafos e uma bióloga percorreram as terras e povoações do “antigo concelho medieval” de Sortelha, no município do Sabugal, para documentar “a profunda ligação entre as comunidades locais e a paisagem” deste território, encaixado entre as “montanhas majestosas” e a planície da Cova da Beira.
Da residência artística realizada no âmbito do Naturcôa – Imagem, Natureza, Património resultou o projecto Talhados na Pedra, multiplicado numa exposição, livro, e filme documental, que será apresentado no primeiro dia do evento que este ano regressa ao Sabugal entre 2 e 3 de Novembro.
Através das fotografias captadas por Luís Octávio Costa (jornalista do PÚBLICO, que assina como Kitato neste projecto), João Bernardino e Tiago Cerveira, expostas no exterior do Auditório Municipal e do Museu do Sabugal, mergulhamos na paisagem cultural de Sortelha que, ao longo dos séculos, se foi construindo na relação entre as comunidades locais e este território desafiante, moldando-se mutuamente.
Entre a exposição, o filme documental de 16 minutos assinado por Tiago Cerveira, e o livro onde se perpetuam as imagens e os testemunhos dos fotógrafos e da bióloga Anabela Paula, especialista em serviços de ecossistemas rurais, o projecto procura “celebrar a alma deste recanto e as histórias das pessoas que aqui permanecem firmes e enraizadas, carregando séculos de memórias e tradições”, lê-se no livro.
“Em Talhados na Pedra, pretendemos revelar essa profunda ligação entre as gentes e a paisagem que as rodeia. Assim como as rochas esculpidas pelos elementos, estas pessoas não apenas se moldaram à paisagem agreste e indomável, mas fundiram-se com ela, tornando-se parte integrante do cenário. Tal como os vales escavados e os penedos íngremes que definem este lugar, elas foram talhadas pela dureza da vida, adaptando-se com uma determinação que reflecte a própria força da terra.”
Como António Joaquim Antunes que, conta Luís Octávio Costa (Kitato), “não emigrou porque lhe custava deixar os pais sozinhos e sozinho ficou em Quarta-Feira”. Ou Maria de Lurdes, na Retorta, que se “vai valendo” dos animais, e Adelina Esteves, em Rebelhos, que lavou roupa “a vida toda”. “A máquina não tira as nódoas como eu.”
Reencontram-se hortas, rebanhos, burros, queijos e muita solidão. “Os dias que aqui passámos evidenciaram também a triste e dura realidade do concelho: a desertificação, o envelhecimento e o isolamento da população”, relata Anabela Paula, natural do Sabugal. É da bióloga a maioria dos registos de testemunhos das gentes do território, com maior enfoque no “papel que têm na criação de paisagens resilientes aos fogos”, área em que se encontra a trabalhar neste momento. São histórias de quem gosta daquilo que faz, apesar dos dias duros; de amor à terra e resiliência.
“Mais do que um registo visual, este documento preserva as memórias e identidades que dão vida a este território”, lê-se, objectivo também do próprio Naturcôa, “uma iniciativa comprometida com a preservação e valorização da riqueza natural e cultural do Sabugal” que, defende, representa não só “uma herança singular” como tem “um potencial promissor para um futuro mais sustentável”.