Pêra-Manca e o fenómeno brasileiro

Icónico vinho alentejano foi lançado primeiro no Brasil e, entre exportações e turismo, é para esse mercado importantíssimo para a Cartuxa que vai o maior número de garrafas do Pêra-Manca Tinto 2018.

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O Pêra-Manca Tinto 2018 foi lançado primeiro no Brasil e depois por cá, há dias num jantar na Adega Cartuxa, em Évora Direitos Reservados
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O Pêra-Manca Tinto 2018, apresentado há dias em Évora, é a 17.ª edição do vinho icónico que a Fundação Eugénio de Almeida (FEA) / Adega Cartuxa produz há 60 anos. E a prova da vivacidade de um dos vinhos nacionais mais reconhecidos de sempre (leia a crítica do jornalista Manuel Carvalho). Também é, hoje em dia, um fenómeno muito brasileiro. Senão, vejamos.

Foi lançado primeiro no Brasil, onde o vinho chegou ainda em Setembro. Das 21 mil garrafas desta edição, menos de metade da produção da colheita de 2015 (44 mil unidades), 6000, nada mais, nada menos, foram para aquele país, um mercado que já representa 30% do negócio do produtor. Por cá, ficarão 11.000 garrafas do novo Pêra-Manca Tinto, o que quer dizer que para outros mercados internacionais irá apenas um cheirinho da referência maior da Cartuxa. E na loja da adega, em Évora, ficarão 3000 garrafas, mas, como sete em cada dez pessoas que visitam aquele espaço de enoturismo são brasileiras, se cada visitante comprar um Pêra-Manca Tinto, lá se vão para o outro lado do Atlântico mais dois milhares de garrafas.

"Estamos a projectar um total de facturação, este ano, à volta dos 27 milhões de euros, com o Brasil a representar 30% do total dessa facturação e o mercado nacional cerca de 60%", disse ao PÚBLICO o director comercial da Cartuxa, João Teixeira, antevendo que possa "haver alguma pequena variação" em relação a esta projecção neste último trimestre do ano por causa do Natal. "É uma altura muito importante para esta categoria dos vinhos."

Este ano será "difícil" chegar ao número recorde de visitantes que a Cartuxa registou em 2023 (32 mil). A adega recebeu "poucos visitantes" no primeiro trimestre de 2024, o que acontece de resto, e "de uma maneira geral, no Alentejo e em Portugal", mas, apesar disso, agora que o Pêra-Manca Tinto 2018 está disponível na loja da Cartuxa, acredita João ser "muito provável" que a facturação do enoturismo venha a igualar o valor dessa fatia de negócio em 2023: 2,7 milhões de euros.

Para comprar o vinho, é requisito obrigatório fazer a visita de enoturismo à Adega da Cartuxa, que quer clientes embaixadores de marca. E no maior número possível, pelo que cada visitante só pode comprar uma garrafa. Esta edição custa na loja de Évora 350 euros — mais 75 que a de 2015 —, um valor que a Cartuxa justifica com a missão da FEA ("desenvolver a região a nível cultural, social e educativo"; dentro do possível tinha de continuar a ser um luxo acessível), mas se o enófilo brasileiro tiver de a comprar no Brasil terá de desembolsar 5000 reais, o equivalente a 833 euros. Mais do dobro, portanto.

Ainda assim, os brasileiros compram muito Pêra-Manca. Como compram muito, mas mesmo muito, Casal Garcia, atenção. A diferença é que, para comprar Pêra-Manca, viajam de propósito até Portugal, para ir "à fonte". "Nós até, a título de brincadeira, por vezes dizemos que não sabemos se as pessoas vêm a Évora para conhecer a Cartuxa e aproveitam e vêem o resto da cidade ou se, já que estão em Évora, vêm conhecer a Cartuxa." E mesmo que haja Pêra-Manca disponível, "compram Pêra-Manca e muitas outras coisas para além de Pêra-Manca", nota o gestor.

A Cartuxa vendeu em 2023 quase 4,2 milhões de garrafas de vinho, das quais 10.649 de Pêra-Manca tinto e 83.503 de Pêra-Manca branco. A edição de 2021 do Pêra-Manca a que Isaltino Morais chamou "banal" esgotou em Agosto último — só por estes dias chegará ao mercado a colheita de 2022 (custará 55 euros na loja da adega).

E, quanto ao fenómeno brasileiro, não é preciso recuar muito no tempo para perceber a curva do seu crescimento. "Ao fecho de 2018, nós facturámos para o Brasil 3,2 milhões [de euros], este ano projectamos facturar 7,5 milhões." Quase mais um milhão do que em 2023 (no ano passado o Brasil pesou "aproximadamente 6,8 milhões" na facturação da Cartuxa). É certo que o Brasil é um mercado hoje muito interessante para os vinhos portugueses em geral, e não só. Mas a Cartuxa, que em 2022 foi "o exportador europeu número um em valor para o Brasil", já lá tem os dois pés e fará por "continuar a saber surfar a onda" brasileira.

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