Liam Payne, a estrela dos One Direction que nunca teve tempo para o ser

Foi catapultado para a fama planetária aos 16 anos com uma das maiores bandas da década — e conheceu-lhe o lado bom e o mau. Liam Payne, ex-One Direction, morreu nesta quarta-feira, aos 31 anos.

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Liam Payne tinha 31 anos Reuters
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Liam Payne, 31 anos, teve o seu caminho delineado desde cedo. Com 14 anos, a experiência de uma participação frustrada num concurso de talentos não lhe tirou a certeza de que queria fazer vida a cantar. Guiado por Simon Cowell, voltou ao X Factor britânico e acabou a fazer parte de uma das bandas mais influentes do mundo. Conheceu uma ascensão meteórica com os One Direction — e como em tantas histórias como esta, tudo começou com um sonho. O músico morreu nesta quarta-feira, na Argentina, depois de ter caído da varanda do seu quarto de hotel.

“Sabes aquela coisa que adoras fazer, cantar? Continua, porque quando chegares aos 14 anos, algo fantástico vai acontecer, e não estou a falar da puberdade”, recordou, em 2020, quando foi desafiado pela Radio 1 da BBC a escrever uma carta para o seu eu de 10 anos. E não poupou o jovem Payne a spoilers: “Prepara-te: a vida vai ficar surreal.”

Nem sempre a participação num programa de talentos é garantia de alguma coisa – nem de talento, nem de sucesso. Para Liam Payne, nascido a 29 de Agosto de 1993 em Wolverhapton (Reino Unido), a coisa não se passou bem assim. Chegou pela primeira vez ao palco do X Factor com 14 anos, com uma voz imberbe a debelar a Fly me to the moon, de Frank Sinatra, durante a primeira audição. Um dos jurados, Simon Cowell, viu algo nele – potencial, carisma —, mas a sua passagem pela edição de 2008 do programa seria breve. Foi eliminado na fase de bootcamp, numa altura em que estava na casa de Cowell, nos Barbados, a receber formação específica.

“Da primeira vez [que fui ao X Factor], cheguei até aos últimos 24 [concorrentes], que é o passo antes de saber que conseguiste, e o Simon [Cowell] mandou-me embora”, contou, em 2022, em entrevista ao influencer Logan Paul, no podcast Impaulsive. “Depois, jantou comigo e com a minha mãe, e o manager dos One Direction estava lá. Pediu desculpa e disse que eu tinha de concluir os estudos e voltar em dois anos. Nesta altura, estava muito chateado.”

Não baixou os braços e fez o que lhe disseram. Estudou, conseguiu o diploma do secundário. Pelo caminho, cantava onde lhe deixavam – lares, bares. Às vezes, o cachet não era suficiente para cobrir o valor da gasolina para ir e voltar, mas não fazia mal. Aos 16, voltou a tentar o X Factor.

A ascensão

Há muitos vídeos espalhados pela Internet do momento em que volta a pisar o palco e reencontra Simon Cowell. Sorriso tímido, um acenar de cabeça como se faz com os velhos conhecidos. “Simon, tudo bem? Já não te via há algum tempo”, dizia.

A mesma voz, já menos infantil, impressionou os jurados com Cry me a river, versão de Michael Bublé. Funcionou: conseguiu os quatro sins que esperava e seguiu em frente.

“É muito óbvio no X Factor quem vai ser bem-sucedido porque as câmaras te perseguem. Eu tornei-me o inimigo de todos na fase de bootcamp”, lembrou, em 2022. Foi com surpresa que, pouco depois, recebeu a notícia de que seria eliminado.

“Fomos expulsos, e eu e o Niall [Horan, também membro dos One Direction] íamos apanhar o comboio quando uma mulher nos interpelou e disse que os jurados queriam falar connosco. Eu já tinha passado por isto uma vez, então estava numa de ‘já estou mal o suficiente, não preciso disto’”, contou a Logan Paul.

Reza a lenda que a banda foi criada em “menos de dez minutos”. E, ao contrário do que seria de esperar, não foi Simon Cowell, mas Nicole Scherzinger, vocalista das Pussycat Dolls, que tomou a maior responsabilidade de a montar, juntando as fotografias dos participantes que funcionavam melhor juntos. Niall Horan, Harry Styles, Liam Payne, Louis Tomlinson e Zyan Malik formavam a “banda mais fofinha de sempre”, que “as miúdas vão adorar”, palavras de Scherzinger.

Assim nasceram os One Direction, uma das bandas mais bem-sucedidas da história moderna, que viriam a vender mais de 70 milhões de discos em todo o mundo durante o tempo em que estiveram juntos.

Foi com pequenos vídeos de diários do X Factor que as fãs começaram a conhecer os seus novos ídolos e a atribuir-lhes características. Se Harry Styles era o pinga-amor e Zayn Malik era o bad boy, a Liam Payne calhou-lhe o papel de “responsável” e “protector”.

“Ao mesmo tempo que estávamos no X Factor, One Direction estava no topo das tendências das redes sociais no Reino Unido, e isso passava para o resto do mundo”, lembra Payne. “Acho que era um cenário de uma tempestade perfeita, com a tecnologia.”

Quando o programa estava a ser gravado, os fãs juntavam-se na parte de fora do edifício. Terminaram em terceiro lugar no concurso, mas com um contrato garantido na empresa de Simon Cowell. O seu single de estreia, What makes you beautiful, foi lançado em 2011 e foi um sucesso instantâneo.

“Nós não éramos muito bons, ficámos muito bons”, descreve Payne. “Queres estar numa boy band, mas não numa que seja foleira.”

Sobre os momentos bons, lembra-se do divertido que era compor: “Na banda, era muito divertido (…). Assim que percebias o que as pessoas queriam, era muito fácil.” Sobre os momentos maus, lembra-se de que o ambiente entre eles nem sempre era o mais saudável: “Louis e eu, nós odiávamo-nos, ao ponto de andarmos aos murros.”

Uma relação complicada

Era uma existência muito protegida. Enchiam estádios, mas à custa da liberdade – as fãs histéricas perseguiam-nos para todo o lado, ao puro estilo beatlemania. Prestes a entrar nos 30 anos, Liam Payne reflectiu sobre a adolescência na entrevista com Logan Paul: “Ainda é muito difícil escrever para o meu projecto. Estou trancado em quartos de hotéis desde que tenho 15 anos. Não sei do que gosto. Escrevo música sobre o quê?”

Também foi enquanto estava nos One Direction que começou a beber, quando a equipa que os geria os trancava em quartos de hotel para “garantir a sua segurança”.

“Dar um espectáculo para milhares de pessoas e depois ficar trancado num quarto, num país onde não podes ver nada – o que mais é que vais fazer? O minibar está sempre lá”, disse ao Guardian em 2019. Nessa altura, tornou-se “muito bom” a esconder a cara de quem está sob a influência de álcool ou drogas, palavras do próprio.

Enquanto estiveram juntos, lançaram cinco álbuns e concluíram quatro tours – todas a passar pelo menos na Europa e América do Norte, as últimas a estenderem-se à Oceânia, Ásia e África.

Em Agosto de 2015, e já depois da saída de Zayn para se dedicar a outros projectos a título individual, o grupo anunciou que entraria numa pausa para que cada um pudesse trabalhar nos seus próprios projectos. Na altura, a pausa tinha uma data de fim: seria apenas durante um ano e com a promessa de que o grupo voltaria a “trabalhar junto no futuro”.

No entanto, isso nunca chegou a acontecer.

No podcast de Logan Paul – que começa com os dois a pedir um copo de whiskey e o apresentador a desculpar-se com um “são 17h em alguma parte do mundo” –, Payne reconheceu que, apesar de serem uma das bandas mais bem-sucedidas do mundo, havia pouco tempo para celebrar as conquistas: “Até acabarmos… Não apreciámos as coisas pelo que elas eram.”

Depois do fim dos One Direction, a sua vida pessoal ficou cada vez mais conturbada. Um ano depois do fim da banda, em 2016, começou a namorar com a cantora Cheryl Cole, que conheceu nos bastidores do X Factor. Em 2017, tiveram um filho, Bear Grey Payne; em 2018, terminaram.

Um livro aberto

Depois da banda, tentou uma carreira a solo, que, pese embora alguns êxitos, como Strip that down, nunca chegou a mesmo a descolar.

“Penso que cheguei ao topo demasiado cedo, será que vou conseguir voltar lá?”, indagava, na carta que escreveu a si mesmo. “Olhando para trás, estou só muito agradecido.”

Com o tempo, tornou-se um livro aberto: falou sobre os seus problemas com o álcool e a sua luta contra a depressão e a ideação suicida. Em 2023, assumiu que estava a tentar ficar sóbrio: “Há 100 dias que estou sóbrio”, disse à IFL TV. “Sinto-me muito bem.”

Liam Payne morreu nesta quarta-feira, em Buenos Aires, num hotel no bairro de Palermo. Caiu de um terceiro andar e sofreu um traumatismo craniano que foi fatal. A morte foi declarada no local e ainda não se conhecem as causas que terão levado à queda. Antes da queda, a polícia foi chamada ao local para conter um “homem agressivo” e suspeito de estar "sob influência de drogas ou álcool".

De acordo com algumas fotografias que estão a circular nas redes sociais, foram encontrados restos do que parecem ser drogas em várias zonas do quarto de hotel de Payne, que também tinha a televisão destruída. Alguns fãs partilharam nas redes sociais que estiveram com o músico nas suas últimas horas de vida e que estaria sob a influência de álcool ou drogas.

Payne estava na Argentina desde o início de Outubro, para ver um ex-colega de banda em palco, Niall Horan. “Já passou algum tempo desde que eu e o Niall falámos pela última vez. Temos muito que falar”, disse, num vídeo publicado no Snapchat.

Durante o concerto, Payne foi visto a cantar e a dançar de forma efusiva e com um comportamento errático, e até foi interpelado por um segurança do Movistar Arena, na Argentina, que o instou a parar.

Há algumas semanas, começaram a surgir excertos de uma entrevista de Maya Henry, de quem esteve noivo de 2020 a 2022, ao podcast The Internet Is Dead, onde a youtuber detalhava alguns pormenores da relação conturbada que foi o mote para o livro Looking Forward. Durante a entrevista, revelou que Payne falava várias vezes da própria morte.

Também revelou que pormenores do livro, vendido como uma obra de ficção, eram verdadeiros. No livro, a protagonista conta que é forçada a abortar (“Aborta ou perdes-me”, diz o co-protagonista). “O que eu passei na vida real é muito semelhante à experiência de Mallory. Tive de ir ao hospital sozinha depois de ter tido complicações”, revelou, num TikTok, que voltou a correr as redes sociais esta semana.

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