Cancro da tiroide: a importância da prevenção e de estar atento!

O principal sintoma do cancro da tiroide é a ausência de sintomas, mas a grande maioria dos casos tem um excelente prognóstico, principalmente se detetado e tratado precocemente.

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Um dos aspetos-chave para o diagnóstico é a realização de uma ecografia da tiroide com punção aspirativa por agulha fina do(s) nódulo(s) suspeito(s) Julia Koblitz/Unsplash
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Neste dia 24 de setembro, celebra-se o Dia de Sensibilização para o Cancro da Tiroide. A propósito desta data há alguns factos interessantes para se conhecer sobre esta doença:

1. A incidência (o número de novos diagnósticos) está, na sua generalidade, a aumentar;

2. O tumor manifesta-se através de um nódulo de tiroide que são extremamente comuns na população (5 a 60%, dependendo do género e idade), mas apenas uma pequena minoria são, efetivamente, cancros;

3. Trata-se de um tumor de evolução muito lenta e por essa razão, sem qualquer sintoma na maioria dos casos, por vezes sendo apenas descoberto vários anos após o seu aparecimento;

4. A grande maioria dos casos tem um excelente prognóstico, principalmente se detetado e tratado precocemente.

Com esta informação é fácil perceber a importância de os pacientes estarem ativamente atentos a esta patologia, sem esperar pelos primeiros sintomas. Os fatores de risco conhecidos não são muito comuns na população como, por exemplo, o tabagismo no caso do cancro do pulmão ou da cabeça e pescoço, o que dificulta a sua deteção por profissionais não especializados.

Assim, destacam-se os seguintes fatores: história familiar positiva, ou seja, algum familiar com esse mesmo diagnóstico, e a exposição à radiação/radioterapia — curiosidade: a população sobrevivente do acidente nuclear de Tchernobilna década de 1980 e das bombas nucleares de Nagasaki e Hiroxima no fim da Segunda Guerra Mundial, apresentou um pico de incidência e mortalidade do cancro de tiroide nos anos seguintes a estes acontecimentos.

Existem diversos sintomas a que devemos estar atentos quando falamos de cancro da tiroide, nomeadamente: nódulo palpável no pescoço, na região da tiroide (região mais central e inferior do pescoço) ou noutras localizações do pescoço, assim como sintomas na garganta e nas cordas vocais que se manifestam através de rouquidão ou engasgamento para engolir. Estes sintomas aparecem tardiamente em tumores mais avançados não sendo exclusivos do cancro da tiroide, uma vez que podem ocorrer em muitas outras doenças.

Entretanto, o principal sintoma do cancro da tiroide é a ausência de sintomas! De facto, a maioria dos doentes diagnosticados e tratados atualmente descobriram os seus nódulos/tumores através de exames complementares realizados na zona do pescoço por outras causas, aquando de um rastreio solicitado pelo paciente ou pelo médico.

Um dos aspetos-chave para o diagnóstico é a realização de uma ecografia da tiroide com punção aspirativa por agulha fina do(s) nódulo(s) suspeito(s). Sendo os nódulos de tiroide muito comuns na população em geral, com a maioria dos pacientes a serem portadores de múltiplos nódulos, não é possível a realização de biópsia em cada um dos nódulos diagnosticados. Por essa razão, apenas os nódulos mais suspeitos de cancro são selecionados para biópsia baseados na história clínica e resultados dos exames complementares realizados (ecografia, cintigrafia e análises). Uma vez realizada, a biópsia poderá também não ser 100% conclusiva, devido a limitações técnicas da abordagem do nódulo ou mesmo da análise do material obtido. Esses dados ilustram a importância do seguimento a longo prazo de qualquer doente que tenha nódulos de tiroide mesmo que numa avaliação inicial se revelem inocentes, mas que ao longo do tempo possam manifestar-se como sendo mais graves. Por vezes, o diagnóstico definitivo de cancro surge apenas após a remoção cirúrgica da tiroide indicada apenas por suspeita de cancro ou até mesmo por outras causas benignas.

O tratamento definitivo do cancro de tiroide é cirúrgico, através da remoção de parte ou de toda a tiroide, associado ou não à remoção dos gânglios cervicais afetados pela doença. Os casos mais avançados poderão necessitar de tratamento complementar com radioiodoterapia após a cirurgia.

A cirurgia à tiroide, apesar de ser realizada há mais de um século e ser muito bem conhecida a anatomia local, apresenta também os seus riscos, como qualquer outro procedimento médico. Apesar de baixa, a principal ameaça está relacionada com a lesão do nervo laríngeo inferior que passa encostado à parte posterior da tiroide e que é responsável pela movimentação das cordas vocais de cada lado. A lesão deste nervo, seja pelo cancro da tiroide, seja pela cirurgia em si, poderá provocar diferentes graus de rouquidão, cansaço ao falar e engasgamento. Estes sintomas podem ser muito limitativos para o doente, mas poderão ser adequadamente avaliados e reabilitados por um otorrinolaringologista especializado em voz, que idealmente deverá ser consultado o mais rapidamente possível, logo após a cirurgia. De facto, muitos cirurgiões de tiroide solicitam diferentes tipos de avaliação da voz no pré-operatório e monitorização do nervo no intraoperatório com o objetivo de minimizar esse risco.

Uma vez concluído o tratamento, os doentes deverão ser seguidos durante toda a vida para controlo dos níveis hormonais e monitorização de eventuais recidivas da doença, que poderão inclusive ocorrer muito tardiamente devido ao comportamento indolente da maioria destes cancros. Comparativamente com outros tumores malignos, o prognóstico do cancro da tiroide é um dos que apresenta melhor taxa de sucesso, obtendo-se a cura na grande maioria dos casos de tumores iniciais. No entanto, existe um grupo de pacientes com prognóstico mais reservado devido a subtipos mais raros e agressivos de cancro.

Em resumo, o cancro da tiroide é uma doença de incidência crescente cuja melhor forma de diagnóstico precoce é através da investigação e seguimento ativo dos nódulos de tiroide, com intervenção antecipada quando necessário. Uma ressalva importante deve ser feita: a elevada sensibilidade das ecografias atuais e a grande prevalência de nódulos de tiroide na população em geral, faz com que uma grande quantidade de nódulos benignos, pequenos e sem significado clínico seja diagnosticada, o que poderá causar ansiedade desnecessária nos doentes e familiares, no caso de não serem adequadamente aconselhados por profissionais especializados.


Os autores escrevem segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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