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Uma taça de vinho por dia faz bem para saúde?
Frente às evidências que se acumulam, fica cada vez mais difícil de endossar o consumo de álcool com o objetivo de fazer bem para saúde.
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Por décadas, popularizou-se a ideia de que um consumo moderado de álcool pudesse fazer bem para saúde geral, sobretudo, para saúde cardiovascular. Estudos epidemiológicos mostravam essa associação entre um consumo moderado de álcool, em especial o vinho, e melhores desfechos em saúde. A explicação biológica ancorava-se na presença de substâncias antioxidantes da bebida originária da uva. Havia, também, a observação das zonas azuis no Mediterrâneo, locais com alta proporção de centenários que cultivavam o hábito de beber vinho moderadamente de forma regular.
Mas, então, o que aconteceu de lá para cá para aterrissarmos nessa avinagrada verdade de que não existe um limite seguro para o consumo de álcool? A história passa pela disponibilidade de melhores evidências científicas que permitem refinar a nossa capacidade de atribuir causa e efeito. E a verdade dos fatos é que os estudos epidemiológicos sugerindo que o consumo moderado de álcool cause desfechos positivos estão muito provavelmente contaminados pelo que chamamos do "viés do usuário saudável".
Isso quer dizer que pessoas que consumiam álcool de forma moderada eram mais saudáveis do que as pessoas que haviam interrompido completamente a ingestão. Dentre os abstêmios, havia aqueles que interromperam o consumo de álcool por necessidade: motivo de saúde. O viés do usuário saudável faz parecer que o consumo de álcool causa melhores desfechos, quando, na verdade, o que acontece é que o consumo moderado apenas seleciona um grupo populacional mais saudável em média do que abstêmios.
Além disso, vimos resultados de estudos usando randomização mendeliana mostrando que o consumo de álcool em qualquer nível tem impacto negativo na saúde, contudo, essa relação não é linear mas exponencial: um baixo consumo carrega baixo risco (mas ainda risco), enquanto o risco cresce exponencialmente (desproporcionalmente) com o aumento do consumo.
Diante dos fatos, como fazer? Bom, não há como defender ou estimular o consumo de álcool com o objetivo de se melhorar a saúde, porém, para aqueles que o apreciam, o consumo pode ser enquadrado dentro da perspectiva de uma atividade prazerosa e pró-social. O prazer precisa caber na vida, e a sabedoria do consumo em baixas doses pode permitir uma relação com o álcool que não compromete a saúde.
Nota: O álcool é uma substância psicoativa, que causa dependência, categorizada como substância carcinogênica do grupo A, do mesmo grupo do tabaco e dos asbestos, pela International Agency for Research on Cancer.