A receita… da minha tia: as papas de milho que eram o pequeno-almoço de 12 filhos

Zé Paulo Rocha, da taberna O Velho Eurico, gosta de ouvir as histórias da infância dos pais e dos tios no Minho. No ano passado, descobriu a importância das papas de milho numa família numerosa.

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Chef Zé Paulo Rocha, no restaurante O Velho Eurico Rui Gaudêncio
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O que é que os pais comiam antes de ir para a escola? É a curiosidade de Zé Paulo Rocha, da taberna O Velho Eurico, em Lisboa, que dá início a esta história. Embora desde há muito se interesse pelas tradições culinárias familiares — e, de forma mais alargada, da sua aldeia de Covas, junto a Vila Nova de Cerveira, no Minho —, só no ano passado se lembrou de perguntar sobre o pequeno-almoço. Ficou então a saber que praticamente todas as crianças ali ganhavam energia para começar o dia com umas papas de milho branco, terminadas com açúcar amarelo, ou mel, e canela — a receita que escolheu quando o desafiámos para este texto.

Não é uma memória da sua infância, porque Zé Paulo é um “falso minhoto”, como costuma dizer. Já nasceu em Lisboa, embora mantenha uma forte ligação à terra dos pais e dos avós. Quando procura receitas e histórias, socorre-se sobretudo da sabedoria guardada por uma tia, hoje na casa dos 70 anos, a tia Carolina, que no ano passado lhe ensinou a receita das papas de milho, tal como já lhe tinha ensinado a da broa de milho e centeio e os bolinhos de frigideira, feitos com os restos da massa da broa e enchidos (e que já serviu n’O Velho Eurico).

“Os meus pais são os dois de Covas”, conta. “As casas deles ficavam a uns 100 ou 200 metros uma da outra. E são ambos de famílias numerosas. A minha mãe tem 12 irmãos, o meu pai tem 15.” Eram, portanto, casas em que “com pouco tinha de se fazer muito”. E as papas de milho eram uma das soluções para alimentar tanta gente. “Tinha de ser algo que enchesse o estômago, quer fosse para ir para a escola ou para um dia de trabalho.” Outra versão, mais usada em casa do pai, era preparar uma sopa para comer ao pequeno-almoço.

Os pais “começaram a namorar por volta dos 16 anos” e, mais tarde, vieram para Lisboa, “casaram-se e ficaram por cá”. Zé Paulo e o irmão gostam de “puxar pelas histórias” que lhes permitam perceber como era a vida em Covas — as deles são, sobretudo, das férias de Verão. “Uma das memórias mais fortes que tenho é de estar em casa da minha avó a roer favos de mel”, recorda, porque a família produz mel de urze, que, aliás, usa n’O Velho Eurico.

“Não há muita documentação gráfica ou escrita”, por isso as memórias passadas oralmente são, neste caso, a melhor fonte de informação. “Sendo cozinheiro, quero tentar chegar o mais perto possível do que se comia na altura”, sejam as receitas, sejam os ingredientes, como a farinha de milho, que a tia ainda compra numa loja local, a Casa dos Passarinhos.

Mas não bastava ouvir a história. Era importante ver (e filmar) a tia a fazer as papas. E foram essas imagens que Zé Paulo partilhou depois na sua conta de Instagram, há exactamente um ano, porque faz falta mostrar a consistência certa que as papas devem ter (quem quiser seguir a receita pode confirmar aí o aspecto com que ficam).

Esta ligação com Covas vai ganhar neste Verão uma nova força. Pela primeira vez, O Velho Eurico vai até ao Minho para participar no festival As Tasquinhas (de 9 a 11 de Agosto). “Vamos levar sopa de entulho, uma receita da família do meu pai, que é quase um rancho mas em sopa, e petiscos que costumamos ter n’O Velho Eurico, moelas de tomatada, pastéis de massa tenra de leitão, leite-creme, arroz-doce, baba de camelo, esse tipo de coisas de festival.”

Quanto a podermos provar em Lisboa algo inspirado nas papas de milho, Zé Paulo diz que está “a trabalhar nisso” e que, provavelmente, aparecerá um prato n’O Velho Eurico quando o tempo ficar mais frio e pedir comidas mais reconfortantes. Para quem, entretanto, quiser experimentar, aqui fica a receita da tia Carolina.

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