Alerta aos moderados: não haverá uma segunda oportunidade
Hoje, a democracia como que está em constante teste. Está-nos a ser dada mais uma oportunidade. Mas essa oportunidade tem um preço.
Apesar de todos os pessimismos, a semana que acaba de findar deu-nos três resultados eleitorais que semeiam um pouco de esperança num mundo onde a corrida avassaladora dos extremismos pode fazer perigar muito do que civilizacionalmente se construiu em vários séculos.
Na quinta-feira, os trabalhistas colocaram fim a uns longos 14 anos de governo conservador no Reino Unido. Este domingo, numa conjugação de esforços e boas vontades que demonstra um tremendo sentido de Estado, a França derrotou a extrema-direita de Le Pen. Pelo meio, mais longe de nós, mas com implicações internacionais potencialmente muito importantes, no Irão, ganhou as eleições presidenciais o candidato mais moderado.
Não, a guerra contra os populismos, especialmente contra a extrema-direita, em nada está ganha, as nuvens não estão afastadas e as portas do templo não estão guardadas. Mas estas batalhas correram muito melhor do que era esperado. Não sendo vitórias que afastem outros receios, como o de voltar a ter Trump na Casa Branca, elas dão algum ânimo e mostram que há valores que talvez estejam bem enraizados, carecendo apenas de serem bem alimentados.
O peso que hoje se encontra sobre as costas de quem conseguiu afastar a extrema-direita do poder é imenso, seja o caso da complexa organização política francesa que sai do parlamento agora eleito, seja, mais perto de nós, o Governo de Luís Montenegro que tem conseguido manter o Chega afastado dos lugares de protagonismo nas grandes opções governativas.
Mas este peso é grande e implica riscos de consequências inimagináveis. Atribuída ao escritor polaco Andrzej Sapkowski, a frase “nunca há uma segunda oportunidade para causar uma boa primeira impressão” é uma máxima do marketing a que devemos dar alguma atenção. É esse o risco que os atuais governos, resultantes da derrota da extrema-direita, correm: ou a governação é boa, ou não teremos uma segunda oportunidade. Isto é, hoje estamos num tempo de desconfiança institucional. Qualquer das oportunidades que nos seja dada pode ser a última.
Hoje, a democracia como que está em constante teste. Está-nos a ser dada mais uma oportunidade. Mas essa oportunidade tem um preço: o risco de erro implica exponenciar a força do contendente. O erro será o alimento que permitirá a narrativa dos populismos, somando demonstrações que alegadamente provarão a falência do sistema e dos partidos democráticos.
É este o peso que tem às costas quem ganha eleições: não pode falhar, sob o risco de ser o último erro. Tudo o que se fizer, parafraseando o célebre aviso tão repetido no cinema, pode ser usado contra nós.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico