Dez anos depois, a Quinta do Sampayo renasce com dois vinhos

A quinta no Cartaxo visitada por Almeida Garrett foi ressuscitada pela filha do antigo proprietário com a recuperação das vinhas, enoturismo e uma parceria com a chef Justa Nobre.

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Os registos mais antigos de produção de vinho na Quinta do Sampayo são de 1718 Tomás Nazaré / Direitos Reservados
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Encontrei ali os meus companheiros, era tarde, fomos ficar fora da vila à hospedeira Casa do Sr. Luís Sampayo. Rimos e folgámos até alta noite. O resto dormimos a sono solto.” Em 1846, Almeida Garrett, que costumava frequentar a Quinta do Sampayo nas suas viagens de Lisboa a Santarém, mencionava a quinta de Luís Teixeira de Sampayo, Visconde do Cartaxo, no seu famoso Viagens na Minha Terra. A passagem do livro está agora emoldurada numa das paredes da herdade no Cartaxo com mais de três séculos de história – mas que esteve fechada na última década.

Ana Macedo, filho do último dono da quinta, José Júlio Macedo, da empresa Agroseber, que a comprou nos anos 1990, não visitava a propriedade desde 2012, quando a produção de vinhos na adega terminou. “O meu pai tomou a difícil decisão de parar a produção”, recorda Ana, formada em Direito. “Tínhamos 55 hectares de vinha a produzir e tínhamos a adega cheia, mas não conseguíamos escoar o vinho. Estamos a falar de vinhos de excelência e o valor não era propriamente apreciado pelo mercado.”

Entre 1995 e 2013, a quinta foi conhecida, sobretudo, pelos vinhos monovarietais De Filipa, pelo Vale d’Ana e pelo Encosta do Cedro, “uma alusão ao cedro que existia na Quinta do Sampayo original”, continua Ana.

Quando a produção de vinho acabou, o proprietário, J.J. Macedo, como era conhecido, deixou também de visitar a quinta. “Era uma grande mágoa para ele ter de abandonar o seu sonho. Para ele e para todos nós”, confessa a filha. A partir daí, “pouco ou nada se fez na vinha”, conta. “Mantínhamos só, para não ir abaixo completamente, e vendíamos a uva para fora. Estivemos nisto durante dez anos.”

Mais recentemente, quando J.J. Macedo morreu, foi preciso tomar uma decisão sobre o rumo da quinta. Foi nessa altura, em 2022, que Ana Macedo visitou a propriedade com os filhos. “Os miúdos apaixonaram-se. Fomos comprar um cedro bebé, plantámos e foi assim.”

Ana Macedo recuperou as vinhas na Quinta de Sampayo, arrancou com o enoturismo e tem uma parceria com Justa Nobre Eugénia Tomás / Direitos Reservados
A Quinta de Sampayo foi adquirida pelo pai da actual gestora, José Júlio Macedo, nos anos 1990, mas desde 2012 que a produção de vinho ali estava parada Tomás Nazaré / Direitos Reservados
A Quinta de Sampayo lançou dois vinhos de 2023 agora em Maio: um branco com as castas Arinto e Fernão Pires e um tinto, um blend de Castelão, Syrah e Touriga Nacional Tomás Nazaré / Direitos Reservados
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Ana Macedo recuperou as vinhas na Quinta de Sampayo, arrancou com o enoturismo e tem uma parceria com Justa Nobre Eugénia Tomás / Direitos Reservados

Apesar de não se terem mudado para o Cartaxo, Ana Macedo e o marido decidiram voltar a apostar na produção vitivinícola da herdade com a recuperação da adega já existente, ao abandono há dez anos, mas com as máquinas “impecáveis”, que precisaram de uma revisão. Com a ajuda do enólogo Marco Crespo e do consultor agronómico Alberto Miranda, lançaram em Maio dois vinhos Quinta do Sampayo da colheita de 2023: um branco com as castas Arinto e Fernão Pires e um tinto, um blend de Castelão, Syrah e Touriga Nacional.

Os registos mais antigos de produção de vinho na Quinta do Sampayo são de 1718, quando havia “765 pés de vinha, mais uma menos uma”. Ana Macedo e o marido recuperaram os registos históricos até chegarem ao rótulo mais antigo da quinta, da segunda metade do século XIX, nessa época já nas mãos do Visconde do Cartaxo. “O rótulo está no Museu Rural do Vinho, aqui no Cartaxo”, conta. “Foi todo um trabalho de pesquisa para chegarmos a essa história.”

Ao todo, a quinta tem 90 hectares, com 55 hectares de vinha (Touriga Nacional, Aragonez, Trincadeira, Castelão, Syrah, Alicante Bouschet, Arinto e Fernão Pires) e 11 de olival, que, num intervalo de três a cinco anos, será renovado para a produção de azeite. Segundo o enólogo Mário Crespo, a ideia é que também haja “um crescimento sustentável nas vinhas”, com capacidade para produzir até 1 milhão de litros de vinho”.

Ainda longe desses números, com uma produção de 20 mil garrafas (a 9,5 euros cada), Ana Macedo quer inaugurar um novo capítulo da história da quinta e trazer algumas novidades. Uma delas é o enoturismo, ainda sem alojamento, mas com “visitas e provas, piqueniques no meio da vinha, almoços, casamentos, baptizados e eventos mais do cariz profissional”, enumera. Está também prevista uma festa de vindimas, que, além da população local, envolva visitantes.

Outra é a parceria com a chef Justa Nobre, que, já agora, acabou também de lançar um vinho noutra região (o Justa Nobre Vinhas Velhas Branco 2022 e Tinto 2020, com assinatura da Costa Boal Family Estate), responsável pela parte gastronómica dos eventos.

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Justa Nobre é a responsável pela gastronomia nos eventos da Quinta de Sampayo e trabalha com a equipa do produtor Tomás Nazaré / Direitos Reservados
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