Em modo popstar, Mortágua agarra os jovens: “Não é um privilégio ter uma residência”

A líder do BE reuniu-se com estudantes do Porto que denunciaram a falta de condições das residências, os preços elevados dos quartos ou a “ansiedade” provocada pela demora nas respostas.

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Mariana Mortágua, coordenadora do Bloco de Esquerda LUSA/ESTELA SILVA
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Vinda de Esposende, Soraia, de 21 anos, "não tinha casa, nem condições económicas" quando entrou na Faculdade de Letras do Porto. Mesmo assim, foi-lhe negada uma bolsa porque vivia muito longe da universidade. Ir e vir todos os dias não era uma possibilidade por viver numa "vila sem mobilidade" e, por isso, foi insistindo. O tempo que passou até ter uma resposta foi de uma "ansiedade grande". "Passei um momento frágil psicologicamente porque achei que tinha de desistir", confessa. Quando finalmente conseguiu uma residência, não tinha cozinha, o que a obrigava a fazer todas as refeições a 2,95 euros na cantina. Ao fim de um mês eram "quase 180 euros".

Como ela, outros estudantes universitários da "clássica" do Porto partilharam as suas experiências com a líder do Bloco de Esquerda, que foi à faculdade para "ter uma noção da realidade dos jovens na cidade do Porto". Numa roda de dezenas de jovens, no hall da residência Novais Barbosa, Adriana, hoje com 28 anos, recorda que, quando foi admitida na universidade em 2017, também não sabia se ia prosseguir os estudos porque não foi elegida para a bolsa. Teve de recorrer à comissão de residentes para conseguir uma bolsa dos serviços de acção social, que lhe foi atribuída porque "tinha bons resultados" académicos. Mas a assistente social ainda lhe perguntou porque é que estava a estudar se tinha "tantas dificuldades económicas".

"Foi humilhante", conta. Na residência onde vivia, ao contrário de Soraia, havia cozinha, mas era partilhada por noventa pessoas. E eram frequentes as "infestações de baratas". "Fico grata por ter um espaço para dormir, mas não eram de todo as condições de que uma estudante necessita", diz.

A estes problemas acumulam-se outros tantos, como o facto de existirem "três chuveiros para 15 pessoas", "microondas e frigoríficos obsoletos" ou "cortes de água recorrentes". "Obviamente que é um privilégio estar aqui porque há muitos estudantes que não têm", mas "é complicado viver nestas condições", lamenta Nuno, de 22 anos.

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Líder do BE na Faculdade de Letras do Porto Lusa

Luís não enfrentou os mesmos problemas para encontrar uma residência, mas sentiu na pele o aumento dos preços das rendas. Durante o mestrado, morava em cada dos pais e fazia 1h30 de caminho até à faculdade. Já no doutoramento, enquanto bolseiro, alugou um apartamento com dois amigos por 600 euros com as contas incluídas. Mas, com a pandemia, o senhorio pediu um aumento "incomportável" e, agora, não consegue "pagar uma casa no Porto, nem em Ermesinde nem em Matosinhos, nada remotamente perto".

"Posso só dizer-vos uma coisa?", pergunta, a dado momento, Mariana Mortágua. "Vocês não têm de estar gratos por ter residência. Não é um privilégio ter uma residência", diz-lhes, apontando que este é "o reflexo do quão errada está a política neste país".

De frente para os jovens pede que "não tratem" os seus "direitos como privilégios. E, àqueles que perguntam "porque é que as novas gerações têm tantos problemas mentais", desafia: "Experimentem viver assim, sem saber até ao início do semestre onde vão viver, a acabar um curso sem saber se o salário que vão ter paga a casa, ou ter 25, 30 anos e andar a partilhar casa". "Não é suposto a vida ser assim", assegurou, provocando um acenar de cabeças colectivo.

Para a líder bloquista, a solução está em baixar os custos do ensino superior, a começar pela propina do mestrado, mas também os da habitação. E, para isso, propõe construir mais residências no património do Estado, "parar de construir hotéis" ou "pôr tectos nas rendas". "O direito" à habitação "é para quem vive e estuda nas cidades. Esse é o nosso compromisso e vamos bater-nos por ele", garantiu aos jovens.

A mensagem foi recebida com palmas, mas não foi preciso Mortágua falar de habitação para agarrar os jovens. Ainda no bar da faculdade, à entrada, os alunos até faziam fila para a cumprimentar. Sobretudo, as raparigas que, entre risos nervosos, pediam selfie atrás de selfie. "É uma popstar", ouve-se.

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