O que diz a roupa dos candidatos? Da “cool” Mariana Mortágua ao “moderno” Rui Rocha

O exemplo “extremo” de como se vestem a esquerda e a direita é a Golegã ou a Festa do Avante, diz o especialista em protocolo político, Vasco Ribeiro, que reconhece que os tempos estão a mudar.

Foto
LUSA/FILIPE AMORIM
Ouça este artigo
00:00
05:16

Exclusivo Gostaria de Ouvir? Assine já

Quando Pedro Nuno Santos apareceu de camisola de gola alta no congresso do PS, em Janeiro, a internet encheu-se de considerações sobre esta opção. Mais à direita, a mudança de imagem de Rui Rocha da Iniciativa Liberal também tem feito correr tinta durante esta campanha eleitoral. Podem parecer meros detalhes para desviar atenção das medidas políticas prometidas, mas a imagem é meio caminho andando para chegar ao eleitorado, lembram os especialistas de moda e protocolo político ao PÚBLICO. “Tudo o que seja à parte do clássico fato permite mostrar a individualidade de cada um”, frisa Xana Guerra.

“As pessoas vêem mais do que ouvem e a impressão é 90% resultado do que vemos, seja primariamente da aparência e depois comportamental”, começa por analisar Vasco Ribeiro, especialista em protocolo político, lembrando que as arruadas são momentos em que “se pressupõe uma aproximação informal às pessoas”. Como tal, o vestuário também é mais informal do que seria esperado em momentos como os debates na televisão ou em instituições como o Parlamento. “A forma de se vestir tem que obedecer ao princípio da adequação”, insiste.

É que vestir é acima de tudo comunicar e fica “gravado na nossa memória emocional”, nota Vasco Ribeiro, autor de Etiqueta Moderna. A consultora de imagem empresarial Ana Vieira concorda e evoca elementos que são fundamentais na imagem de uma personalidade política, como “estilo próprio, carisma, credibilidade” — estes dois últimos elementos podem ser passados através do que se veste.

Sem entrar em detalhes sobre os protagonistas desta campanha eleitoral, Ana Vieira lembra alguns códigos de vestuário que estão tipicamente associados à direita e à esquerda. “Tecidos naturais, como por exemplo algodão, linho ou lã, são frequentes na esquerda, bem como acessórios mais discretos e funcionais”, analisa. Já à direita, destaca cores mais vibrantes nas gravatas e uma tentativa de adoptar um estilo mais “trendy”. E acrescenta. “Usam acessórios com maior destaque, nomeadamente mais chamativos, como os relógios.”

A especialista em vestuário masculino Xana Guerra recorda como os “comunistas tinham antigamente um ar mais antiquado”, que Paulo Raimundo tem vindo a contrariar, com um “aspecto mais actual”, modernizando consequentemente a imagem do PCP. Ao contrário de Ana Vieira, Xana não atribui o estilo “trendy” à direita, mas sim à esquerda, com Pedro Nuno Santos e Mariana Mortágua em destaque.

Nesta dicotomia entre esquerda e direita, Vasco Ribeiro evoca um exemplo limite, que mostra que “a roupa e o comportamento não devem cair nos exageros”. O professor universitário esclarece: “Se, por um lado, a direita leva demasiado a sério o figurino, a esquerda opõe-se com um relaxamento total. Há diferenças notórias entre um lado e o outro da política que poderia ser personificado no ambiente que se vive ora na Golegã — tipicamente de direita — e na Festa do Avante, de esquerda.”

Foto
Pedro Nuno Santos, no congresso do Partido Socialista Nuno Ferreira Santos

“A seriedade não vem da roupa”

O especialista em protocolo Vasco Ribeiro é adepto de “uma flexibilidade e adaptação para que não haja estranheza e se possam estabelecer laços de confiança entre uma figura política e o eleitor”.

É por esse equilíbrio que Xana Guerra destaca a imagem de Pedro Nuno Santos nesta campanha, “um rapaz moderno”. O líder do PS tem um visual “diferente dos restantes candidatos” e isso permite-lhe vestir-se de outra forma. “Passa uma imagem de modernidade, de futurismo, de homem de hoje que fica para amanhã”, elogia, evocando não só a gola alta, como os blazers de cores e materiais menos comuns ou o calçado mais confortável.

Ainda assim, Pedro Nuno Santos vai mantendo uma “imagem clássica”, imposta culturalmente. “Instituiu-se, em Portugal, o fato e gravata para a mensagem ser mais bem passada. Mas a seriedade não vem da roupa”, considera a consultora de imagem, lembrando que, momentos com protocolo político definido têm outras regras.

Mariana Mortágua também vai cumprindo as regras, mas com “um ar giro e cool”, sem ser “coquete”. “Passa uma mensagem de força, determinação, de quem não tem medo”, analisa Xana Guerra, que não tece os mesmos elogios a Inês Sousa Real, com um visual menos marcante.

Foto
Rui Tavares Miguel A.Lopes/Lusa

A stylist lembra que um erro de imagem pode custar caro e, por isso, muitos optam pela máxima de “camisa branca e calças azuis” para estar sempre bem. Há quem o faça resultar de forma descontraída, diz, como Rui Tavares do Livre, que não só se veste bem, como “a maneira de estar também faz com que a roupa pareça diferente”.

Luís Montenegro é para Xana Guerra a imagem menos bem conseguida da direita — sem mencionar André Ventura do Chega, de quem se recusa a falar. “As roupas continuam a ser sempre as mesmas, com um ar antigo”, lamenta, confessando que vê o líder social-democrata “sempre de camisa branca e calças azuis”, exceptuando o “casaquinho de malha” que vestiu nesta semana. “É uma imagem demasiado monótona e demasiado vista.”

Foto
Luís Montenegro Nelson Garrido

O melhor exemplo de modernidade à direita é Rui Rocha da IL que tem “um ar mais descontraído e moderno”, a querer “distanciar-se do aborrecido”. A mudança de imagem foi positiva, considera. “Há liberdade para mostrar a individualidade”, assevera.

Foto
Rui Rocha José Coelho/Lusa

Mais ou menos bem vestidos nesta campanha eleitoral, Xana Guerra gostava que ficasse a ideia de que a moda na política não tem de ser aborrecida, nem “cafona” — sem chegar, ainda, ao ponto de os homens poderem vestir saias para o Parlamento, como fez o assessor de Joacine Katar Moreira, em 2019. “Queremos uma imagem de futurismo e modernidade para Portugal”, termina.

Sugerir correcção
Ler 5 comentários