Estamos a perder o fio à meada?

Cerca da metade dos adultos acreditam que os seus períodos de atenção se têm reduzido, e muitos professores dizem que os estudantes têm essa mesma percepção.

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"Manter o alerta durante uma tarefa entediante pode ser um desafio" Natalie Bond/pexels
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Há esta ideia generalizada de que o poder de concentração das novas gerações é menor, e que os estímulos visuais e sonoros da tecnologia moderna nos tornam mais impacientes e menos eficazes quando a atenção e concentração são solicitadas.

As taxas de diagnóstico de perturbação de hiperatividade e défice de atenção (PDHA) têm aumentado tanto na Europa como nos EUA. Parece haver uma sensação — provavelmente ampliada pelas redes sociais e inúmeras estatísticas sobre a diminuição dos períodos de atenção — de que o ato de se concentrar se está a tornar cada vez mais difícil. Cerca da metade dos adultos acreditam que os seus períodos de atenção se têm reduzido, e muitos professores dizem que os estudantes têm essa mesma percepção.

Mas será que há dados científicos que sustentam esta hipótese ou será apenas um “mito urbano” sem fundamento?

A atenção pode ser descrita como o processo mental através do qual se selecionam e prioritizam algumas informações. Diante de muitos estímulos e ideias simultâneas, só conseguimos processar uma pequena parte deles de cada vez. A atenção seletiva é descrita como a capacidade da mente se focar em algumas informações em detrimento de outras. É difícil determinar objetivamente quanto tempo alguém realmente se consegue focar em algo e se isso se tem alterado ao longo do tempo. No entanto, vários estudos sugerem que a capacidade de concentração pode diminuir após cerca de 20 a 40 minutos de trabalho contínuo numa única atividade. Esse período é conhecido como "janela de atenção".

A distração não é algo novo. A capacidade de estarmos concentrados, naturalmente aumenta e diminui dependendo de uma série de fatores, desde uma boa noite de sono, do estado emocional, de ter ou não fome, até o quão interessado ou motivado se está na tarefa em mãos. Pode aumentar gradualmente com estímulos, como o consumo de café, ou repentinamente com um sinal de alerta discrepante do ambiente atual.

O que significa que manter o alerta durante uma tarefa entediante pode ser um desafio, a não ser que haja uma motivação significativa. Por outro lado, a maioria das pessoas sem problemas crónicos de atenção, provavelmente concentrar-se-ia bastante bem se lhes fosse dada uma tarefa numa sala sossegada e vazia, mas provavelmente teriam maior dificuldade num local com barulho de fundo de pessoas a conversar e muito ruído.

Nas condições atuais de vida é como se vivêssemos numa sala cheia de distrações e barulho o tempo todo, graças à alternância constante entre o trabalho e a vida doméstica, desafios sociais como a pandemia e a constante tentação dos telemóveis, redes sociais e correio electrónico.

O cérebro humano anseia por novidade, excitação e ligação social, e os dispositivos alimentam esses desejos. Verificar as notificações do telemóvel pode causar um pequeno pico de libertação do neurotransmissor dopamina, criando uma sensação de recompensa e prazer que faz ansiar por mais. Quando cedemos à tentação de interromper uma tarefa para verificar o telefone, o cérebro também precisa de adaptar o ritmo, ao interromper o que estava a fazer para passar para uma nova tarefa. Esse processo afeta negativamente a velocidade e a qualidade geral do nosso trabalho a curto e a longo prazo.

Há dados científicos que sugerem que cedemos cada vez mais à tentação digital. No início dos anos 2000, uma série de experiências mostrava que a atenção humana desviava-se para algo novo aproximadamente a cada 2,5 minutos, em média. Em 2023, a mesma experiência revela que este intervalo diminuiu para cerca de 47 segundos.

Apesar deste apelo da tecnologia, ainda não há consenso de que estejamos a perder a capacidade de nos concentrar, fazemo-lo é pior. Não parece que haja alterações significativas na estrutura cerebral, há sim uma adaptação do funcionamento do cérebro a esta nova relação com os aparelhos elétrónicos.

Há pessoas que defendem que pausas curtas e regulares durante uma tarefa, como a técnica Pomodoro, pode aumentar a concentração e a produtividade ao alternar períodos de trabalho concentrado com pausas breves, embora a técnica não tenha sido validada em estudos científicos. Um ambiente calmo ou com sons musicais harmónicos (de 40 Hz), bem como desligar as notificações eletrónicas, podem também ser estratégias para melhorar a atenção.

Uma vez que a capacidade de concentração varia entre indivíduos e depende de diversos fatores, é importante que cada um de nós teste diferentes estratégias de gestão de tempo e hábitos para melhorar a atenção. De notar, que não estou a incluir aqui a exposição e abuso pelos jovens dos jogos de computador, que pode causar problemas sérios de dependência.

Deixo como sugestão a música que me ajudou a concentrar nesta tarefa, o ‘Choro Feliz’ de Mário Laginha, aqui numa interpretação brilhante com André Mehmari, para acompanhar a leitura de A Educação de Eleanor, de Gail Honeyman, que retrata de forma cómica a sua dificuldade em lidar com situações imprevistas devido à atenção seletiva e rigidez comportamental.


A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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