Bill Clinton e príncipe André referidos em processo relacionado com Jeffrey Epstein
Documentos do processo de Virginia Giuffre, uma das vítimas de Epstein, contra Ghislaine Maxwell foram divulgados na noite de quarta-feira. Figuras visadas não são necessariamente suspeitas de crimes.
O antigo Presidente norte-americano Bill Clinton e o príncipe André são algumas das figuras públicas referidas num conjunto de documentos judiciais relativos ao processo movido por Virginia Giuffre contra Ghislaine Maxwell, cúmplice de Jeffrey Epstein, abusador sexual que morreu em 2019 numa cela de prisão em Nova Iorque. Centenas de páginas dos documentos foram tornadas públicas na noite de quarta-feira, dias depois de a juíza Loretta Preska ter decretado o fim do segredo de justiça relativo à maioria do seu conteúdo, em que são referidos mais de uma centena de nomes. Outros documentos poderão ser relevados nas próximas semanas, pendentes de decisão sobre recursos apresentados por duas das pessoas visadas.
A menção dos nomes não significa necessariamente a imputação de crimes. Mais de uma centena de indivíduos foram referidos em interrogatórios, requerimentos, correspondência e outras diligências no âmbito de um processo civil apresentado por Giuffre, uma das vítimas de abuso sexual de Epstein, contra Maxwell, acusada de ter facilitado os crimes. Esse processo terminou com um acordo entre as partes em 2017, o que não impediu a condenação posterior de Ghislaine Maxwell, em sede de processo criminal, a 20 anos de cadeia por ter coagido e angariado vítimas para o antigo companheiro.
Nos documentos agora divulgados, Bill Clinton é mencionado mais de 50 vezes, grande parte das quais em referência a diversas viagens que o antigo Presidente dos Estados Unidos fez a bordo do avião privado de Epstein. O ex-chefe de Estado terá recorrido várias vezes ao antigo gestor para deslocar-se ao estrangeiro no âmbito das suas funções filantrópicas após ter abandonado a Casa Branca, algo que já era do conhecimento público.
Clinton nunca foi acusado de qualquer ilícito no caso Epstein e sempre negou ter tido conhecimento de qualquer crime cometido pelo antigo banqueiro, algo que não é contrariado pelos documentos agora revelados. Surge, contudo, uma declaração de Johanna Sjöberg, outra vítima de Epstein, sobre Clinton: “Ele [Epstein] disse-me uma vez que Clinton gostava delas novas.” Tal como se confirma que os dois homens mantiveram a dado momento uma relação próxima, posteriormente terminada.“Passaram-se quase 20 anos desde o último contacto que o Presidente Clinton teve com Epstein”, reiterou esta noite, à CNN, um representante do antigo chefe de Estado.
Outro nome mencionado repetidas vezes nos documentos, também sem surpresa, é o do príncipe André, membro da família real britânica. Uma das alegações referidas já tinha sido anteriormente noticiada: a de que André tocou Sjöberg de forma imprópria numa festa em casa de Epstein. Em 2022, o príncipe também chegou a um acordo com Giuffre para encerrar outro processo em que esta dizia ter sofrido abusos sexuais às suas mãos quando tinha 17 anos. O filho de Isabel II sempre negou ter cometido qualquer crime.
O ex-embaixador e antigo governador do Novo México Bill Richardson (falecido em 2023), o agente de modelos francês Jean-Luc Brunel (que se suicidou em 2022, enquanto aguardava julgamento por violação de menores) e o gestor Glenn Dubin são outras figuras com quem Virginia Giuffre alega que Ghislaine Maxwell lhe ordenou que tivesse sexo. Não é claro, com base nestes documentos, que tenha havido contactos sexuais com os visados ou que estes tivessem cometido qualquer crime.
Sem estarem implicados em qualquer acto impróprio, aparecem também no processo os nomes de Michael Jackson, músico falecido em 2009, e do ilusionista David Copperfield, ambos vistos por testemunhas em propriedades de Epstein.
Donald Trump também é referido como alguém conhecido de Epstein, o que era do domínio público, mas aqui com Sjöberg a afirmar expressamente que nunca foi tocada pelo ex-Presidente norte-americano, sobre o qual não recaem suspeitas de crime neste caso.
Nas mais de 900 páginas de documentos não aparece o nome de Jimmy Kimmel, apresentador de televisão que tinha sido acusado pela estrela de futebol americano Aaron Rodgers, dos New York Jets, de constar da lista de pessoas próximas de Epstein. Kimmel, que negou alguma vez ter conhecido o gestor, ameaçou processar Rodgers.
Epstein, outrora um gestor de fortunas próximo de presidentes, milionários, artistas e outras figuras do jet set internacional, caiu em desgraça em 2005, ano em que foi detido na Florida sob suspeita de ter pago para ter sexo com uma menina de 14 anos. Cumpriu apenas 13 meses de cadeia em regime aberto nesse primeiro caso, mas uma multiplicação de suspeitas semelhantes e uma investigação jornalística do Miami Herald acabariam por revelar, anos mais tarde, um escândalo mais vasto de tráfico e prostituição de menores, envolvendo Epstein, a sua companheira Ghislaine Maxwell como angariadora, e potenciais clientes de elevado poder económico e mediático.
Epstein suicidou-se numa cela de prisão, em 2019, enquanto aguardava julgamento. Maxwell acabou por ser condenada a 20 anos de cadeia. Os contornos do escândalo, envolvendo mansões e aviões privados, e protagonizado por uma figura com ligações a elites internacionais, continuam a alimentar as páginas dos jornais e também muitas teorias da conspiração.