Gabriel Pacheco: “A ilustração alimenta-se de memórias, sonhos e desejos”
O ilustrador mexicano esteve no Braga em Risco — Encontro de Ilustração e os seus trabalhos para o livro Il Sogno di Theo ainda podem ser vistos na Galeria do Paço até 30 de Novembro.
O coordenador dos cursos de Desenho e Ilustração na Escola Internacional de Ilustração de Sarmède e director de arte da exposição Imagens de Fantasia da Fundação Štěpán Zavřel (Itália), Gabriel Pacheco, deu a conhecer ao PÚBLICO a forma como encara a ilustração e a vida.
“Sou uma pessoa que gosta de pessoas, de histórias, de imagens e que às vezes se dedica a imaginar livros. Sou sobretudo um bom leitor, o que é fundamental para ser um bom ilustrador”, diz o artista plástico, que nasceu na Cidade do México, se licenciou em Cenografia e obteve um diploma em História das Artes.
Revela ainda: “Penso mais como pessoa e menos como ilustrador. Gosto de ler, de cinema, de teatro. Tudo isso, essas referências, sensações e emoções surgem no momento de ilustrar.”
O autor de Il Sogno di Theo — cujos materiais estão na Galeria do Paço até 30 de Novembro, assim como um vídeo que mostra o livro com o texto em português — ilustra há 20 anos e as suas imagens para livros infantis, volumes de poesia e literatura fantástica, tanto podem ser oníricas quanto surrealistas. Todas muito envolventes e até hipnotizantes.
“Interessa-me mais a atmosfera da ilustração do que as formas que se representam”, explica. “Quando a literatura é potente, a atmosfera surge. Nós somos uma mistura de memórias, sonhos e desejos. Quando se lê um livro, é isso que se vai buscar, não sei bem como. Mas a ilustração alimenta-se disso.”
Diz gostar muito de poesia e de conhecer poetas, em particular poetas-músicos. Quando se lhe pergunta se é difícil ilustrar poesia, começa por dizer que sim. Depois, reconsidera: “O que faço é sentir a poesia, que me dá muitas imagens. Depois, uso a minha habilidade para as desenhar. Como tudo o que faço é sempre ligado à vida, ao ser humano, no final, não é tão difícil assim ilustrar poesia.”
Já tentou criar alguns poemas, jogando com as palavras, mas nunca os editou. “Não tenho coragem de escrever poesia.” Cita de cor a frase de um poeta: “Os leitores de poesia são poetas não declarados como escritores.” E acredita que todos temos sensibilidade poética, “do jogador de futebol ao empregado da farmácia”.
Gabriel Pacheco pensa que “a criação de imagens não é exclusiva dos ilustradores, só que estes fazem-no como profissão”. Lê devagar e fecha os livros muitas vezes, para se deter a pensar.
Premiado em várias categorias, o ilustrador, que obteve uma menção especial na Feira do Livro Infantil de Bolonha em 2009 (Homem de Água), esteve neste domingo a conversar publicamente com Pedro Seromenho, curador do encontro, no Salão Medieval da Reitoria da Universidade do Minho. Na segunda-feira de manhã, realizará um workshop para estudantes de Artes, no Auditório da Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva, às 10h00.
Não poderia ser outra coisa
A sua actividade como ilustrador começou em família, como assistente da irmã, também ilustradora: “Ela usava aguarela líquida e pedia-me: ‘Põe vermelho aqui, verde ali. E eu punha.’ Depois, comecei a usar o digital, por causa dos prazos dos livros, era mais rápido.”
Há cerca de dez anos, no entanto, abandonou o digital e começou a usar acrílico, uma técnica mais lenta. “Uso a técnica de veladura, que é parecida com a da aguarela: são camadas de acrílicos transparentes que se vão sobrepondo, como no trabalho a óleo, até se criar uma cor mais ou menos forte, um tom, chegar uma atmosfera que nos satisfaça. É sempre a atmosfera que me interessa mais.”
Diz que é feliz “nalguns instantes breves” e não se imagina com outra profissão: “Não poderia ser outra coisa ou não seria eu. Em jovem, pensava de outra maneira. Agora, estou tranquilo, mais do que feliz, tranquilo.”
O convite para estar no Braga em Risco alegrou-o: “Estou muito orgulhoso com a exposição, muito orgulhoso por ter sido convidado a estar entre artistas portugueses que admiro. Sinto-me importante. Os ilustradores portugueses têm uma expressão gráfica muito boa, muito forte.”
Por tudo isto sente-se “afortunado”. E reflecte: “Às vezes, temos a sorte de nos cruzarmos com certas pessoas só que porque elas também passaram por ali, onde nós estávamos. Ajuda-me na criação conhecer coisas e pessoas que antes desconhecia.”
Gabriel Pacheco defende que em qualquer trabalho deve “haver uma filosofia e uma técnica adequadas” e que se impõe “devolver ao público esse pensamento e essa estética, sobretudo às crianças”. Gosta do contacto directo nas actividades com os mais novos: “São espontâneos, genuínos, não têm pose de artista. São simplesmente humanos.” E conclui: “Trabalhar assim é uma festa.”