A Thingle é uma nova plataforma de compra e venda de artigos em segunda mão e é portuguesa. A empresa, fundada por João Pedro Neto, pretende tornar esta tendência ecológica mais fiável e garante que o produto chega "sem riscos". Como? Através de um processo de verificação da qualidade do produto e da possibilidade de arranjo.
Entre tendências que aparecem e desaparecem rapidamente, há uma que parece ter vindo para ficar: a compra em segunda mão. Um estudo conjunto da Boston Consulting Group e da Vestiare Collection mostra que a compra de artigos usados triplicou desde 2020 e que, até ao final deste ano, a roupa reaproveitada pode constituir 27% dos nossos armários.
No entanto, quem diz que a compra em segunda mão é um processo tranquilo, seguro e confiável, muito provavelmente, nunca o fez. Afinal, encomendar uma consola de jogos e chegar uma caixa com pedras pode ser uma verdadeira dor de cabeça (e uma valente perda de dinheiro). Para João Pedro Neto, o infortúnio das burlas em segunda mão foi sinónimo de uma ideia: criar a plataforma Thingle.
João Pedro Neto estudou Gestão Aeronáutica e trabalha na TAP. Nas horas vagas, diz ser um confesso amante de compras de produtos em segunda mão, já que tem uma série de hobbies que o fazem estar “sempre à procura de alternativas usadas mais baratas", conta ao PÚBLICO.
E como surgiu a ideia de criar esta plataforma? Graças a duas experiências menos felizes. Há quatro anos queria comprar uma mesa de mistura e acabou “com dinheiro no bolso, em direcção à casa de uma pessoa que não conhecia, de noite, numa zona relativamente perigosa de Lisboa”. Algum tempo depois, comprou uma câmara digital em segunda mão e quando esta chegou, vinha dos EUA, João Pedro Neto constatou que o sensor instalado na câmara não era o que estava descrito pelo vendedor. A dificuldade de fazer a devolução e o facto de saber que jamais reaveria o dinheiro das taxas alfandegárias, fê-lo ficar com o aparelho, mas também com uma ideia, agora mais solidificada.
“Isto às vezes é uma roleta russa. Se falamos de roupa mais barata, o risco é menor. Mas equipamentos caros como estes apresentam um grande risco. Bom seria se houvesse alguém que verificasse o estado do produto antes de ele me chegar às mãos”, pensou. Foi nesse momento que o gestor aeronáutico, de 39 anos, arregaçou as mangas e decidiu que o panorama devia mudar.
Reconhecendo a impossibilidade de, sozinho, levar a sua ideia avante, juntou-se a João Martins, Pedro Filipe e Gonçalo Costa e começaram a dar “contornos mais sérios à Thingle”. Os sócios tinham duas certezas: “Que tudo fosse o mais fácil possível para o consumidor e que fosse sustentável.”
O que diferencia esta plataforma de outras? Em primeiro lugar, o processo de negociação: “As pessoas gostam de negociar, só não gostam de o fazer com todo o spam que isso acarreta. A plataforma oferece um sistema simples, sem mensagens, transparente e privado.” É possível fazer ofertas aos produtos, revelando o preço que se está disposto a pagar. "Toda a gente na plataforma consegue ver que uma oferta foi feita, mas não por quem. O vendedor não é obrigado a aceitar ou a recusar. Se não quiser, não tem de fazer nada, a oferta fica lá, visível. Aceitar é só carregar num botão”, desenvolve o empresário. Se o preço de uma oferta cumprir ou ultrapassar o valor registado na publicação de venda, a compra é feita automaticamente.
Mas o que distingue a Thingle é o seu processo de verificação de qualidade do produto e a possibilidade de arranjo. Entre o vendedor e o comprador, o produto passa por um parceiro que verifica o seu estado e se este se encontra como na descrição de venda. Se o produto for reprovado na avaliação, os parceiros da Thingle têm capacidade de reparação e entram em contacto com o comprador e com o vendedor para ver se é isso que desejam fazer. Entre os parceiros destacam-se a iServices, para aparelhos tecnológicos, e a Sr. Empório, para reparação de artigos de vestuário, empresa esta que faz arranjos para os produtos do El Corte Inglés.
A empresa cujo nome vem da junção das palavras inglesas single (única) e thing (coisa), por remeter para o carácter singular dos artigos em segunda mão é, também, o mais ecológica possível, declara. “Ao haver a viagem extra para o parceiro e não uma só entre o vendedor e o comprador não estamos a colocar a ecologia do processo em causa? Também nos questionámos sobre isso”, confessa. Essa dificuldade foi contornada de várias formas. Primeiramente, a escolha de empresas de entregas que tivessem frotas eléctricas. Além disso, a plataforma faz sugestões de produtos semelhantes que se encontram a uma menor distância e, das diversas ofertas, informa o vendedor de qual é que criará uma pegada ecológica menor, o que facilita no processo de aceitação da oferta.
O empresário garante ainda que foram "efectuados vários cálculos" e perceberam que "a pegada de uma compra de um produto em segunda mão é cerca de 800 vezes inferior à da compra de um produto novo. O transporte corresponde a cerca de 15% da pegada de todo o ciclo do produto. Por isso, o custo de emissão de CO2, mesmo com este transporte extra, compensa sempre largamente no âmbito ambiental face à aquisição de novos produtos”.
A Thingle já se encontra disponível em todo o território nacional através do site e como aplicação na App Store e na Google Play.
Texto editado por Bárbara Wong