Cuidados paliativos: um apoio necessário na doença grave oncológica, mas não só

O objetivo primordial é a qualidade de vida dos doentes e das suas famílias. Assinala-se neste sábado o Dia Mundial dos Cuidados Paliativos.

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Os estudos internacionais apontam que o encaminhamento dos doentes para os cuidados paliativos ocorre tardiamente Adriano Miranda/Arquivo
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Os cuidados paliativos evoluíram muito nas últimas décadas, distanciando-se da concepção inicial, que continua infelizmente enraizada na mente das pessoas como cuidados de fim de vida e essencialmente dirigidos a “doentes oncológicos terminais”.

Pela cumulativa aquisição de experiência na gestão de sintomas, na atenção aos problemas psicossociais, na comunicação, na facilitação de tomada de decisões complexas, no planeamento e transição de cuidados, os cuidados paliativos transformaram-se numa especialidade interprofissional e multidisciplinar.

O objetivo primordial é a qualidade de vida dos doentes e das suas famílias, que enfrentam problemas decorrentes de uma doença incurável e/ou grave e que sim, na grande maioria das vezes, têm uma expectativa de vida limitada.

Estes doentes, com doença grave oncológica ou não, desenvolvem frequentemente sintomas físicos e psicossociais devastadores, associados a importante declínio funcional. Daí tende a resultar uma enorme angústia familiar, que requer uma avaliação individualizada por equipas experientes e capacitadas para uma combinação de aconselhamento, discussão e educação. Por um lado, sobre a doença, por outro, sobre os objetivos do cuidado e a definição dum plano individualizado e integrado de cuidados.

Se formos capazes de permitir este suporte tão necessário a todos os envolvidos, melhoramos não só a adesão dos doentes aos tratamentos, como permitimos que se tomem decisões informadas com menor sofrimento. Assim, somos agentes facilitadores, quando necessário, na transição de cuidados, preparando os doentes e suas famílias para os desafios futuros.

O espectro de ação da Medicina Paliativa foi-se assim amplificando. Vários estudos indicam que a sua integração no início da trajetória da doença resulta na melhoria significativa da qualidade de vida, do controlo de sintomas, da satisfação do doente e do cuidador/ família. Permite, também, a melhoria da compreensão da doença e da qualidade dos cuidados de fim de vida, com potenciais ganhos em termos de sobrevivência (em quantidade e com qualidade).

Infelizmente, os estudos internacionais apontam que o encaminhamento dos doentes para os cuidados paliativos ocorre tardiamente, em média 30 a 60 dias antes do falecimento, impedindo que todo este trabalho possa ser desenvolvido.

Os oncologistas e médicos de outras especialidades, têm assim um papel fundamental na facilitação do encaminhamento oportuno de doentes para equipas diferenciadas de cuidados paliativos. É ainda importante reconhecer e enfatizar que os doentes não precisam escolher entre tratamentos dirigidos à sua doença e cuidados paliativos ou de suporte. Em vez disso, podem e devem beneficiar do acompanhamento simultâneo, principalmente nesta nova era da medicina de precisão, individualizada e direcionada, que nos disponibiliza toda uma nova panóplia de opções terapêuticas, tornando viável que os doentes recebam tratamentos dirigidos às suas doenças até mais perto do fim da vida.

Se conceptualmente, as estratégias de Medicina Paliativa têm melhores resultados quanto mais precocemente introduzidas na trajetória da doença, infelizmente o momento ideal de integração continua a ser discutido, existindo múltiplos modelos propostos. Esta integração está obviamente dependente e tem de ser adaptada aos recursos disponíveis e, dada a enorme heterogeneidade nos cuidados de saúde, nas características dos doentes, nos recursos disponíveis, acesso a formação diferenciada e atitudes e crenças em relação aos cuidados paliativos em todo o mundo, é importante salientar que nenhum modelo conseguirá oferecerá a solução ideal para todos.

Assim, neste dia Mundial dos Cuidados Paliativos, a questão não é mais se os cuidados paliativos são necessários nos doentes com doença grave (oncológica ou não), mas quando iremos aceitar que a sua integração deve ser precoce para que possamos permitir o acesso do doente ao suporte individualizado que necessita. Não esqueçamos que o objetivo é proporcionar uma melhoria abrangente nas suas diferentes vertentes físico-psico-sociais, na sua qualidade de vida e dos seus cuidadores, ao longo da sua jornada pela doença, complementando a atuação das outras especialidades nas suas intervenções terapêuticas.


A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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