Simão está à procura de um dador de medula óssea. Faltam dadores jovens em Portugal

Há mais 390 mil dadores inscritos no Cedace, mas a mediana de idade é 39 anos. “Dadores jovens estão associados a melhores resultados do transplante”, apela o hematologista Manuel Abecasis.

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Simão tem 23 anom DR

Simão Correia tem 23 anos e foi diagnosticado com leucemia linfoblástica aguda em Setembro de 2022. Depois de seis ciclos de quimioterapia, o jovem está à espera de um dador compatível para realizar o transplante de medula óssea. Através das redes socais lançou um apelo em forma de música: “Não tenhas medo de salvar uma vida.”

A Associação Portuguesa Contra a Leucemia (APCL) partilhou o repto de Simão e pede aos portugueses que “tenham generosidade”, sem medos. “Porque há situações em que só o transplante permite a cura”, lembra ao PÚBLICO o presidente da APCL, Manuel Abecasis.

No vídeo que se tornou viral nas redes sociais, Simão conta que “não tem sido fácil”, mas com um sorriso no rosto. Fazer o transplante, explica, “poderá ser a remissão”, o “voltar à normalidade” — “a minha cura”. Ao som de uma canção original que escreveu à namorada enquanto estava internado, pede às pessoas “que não recuem e desistam de salvar uma vida”.

O pedido não é feito apenas em seu nome, mas “de muitas outras pessoas” na mesma posição, sublinha. “Pode ser a diferença entre — verdade nua, pura e crua — viver e morrer”, termina.

É um apelo de que faz eco a APCL, que apoia a acção de Simão, apesar de não se envolver directamente “neste tipo de acções”, explica o director do Departamento de Hematologia do Instituto Português de Oncologia (IPO) de Lisboa. A associação que preside, recorda, começou há duas décadas para expandir o registo português de dadores de medula óssea, o Centro Nacional de Dadores de Células de Medula Óssea, Estaminais ou de Sangue do Cordão (Cedace), pelo qual Manuel Abecasis é responsável.

Há 20 anos, Portugal contava com cerca de 1500 dadores. Hoje, celebra, são mais de 390 mil — são 4% dos portugueses. “Não se pode dizer que há falta de dadores, no rácio do número de dadores por 10.000 habitantes Portugal encontra-se em 5.ª posição”, dá conta. O problema? A mediana dos dadores portugueses é 39 anos e isso é preocupante, “porque há numerosos estudos que mostram que os dadores jovens estão associados a melhores resultados do transplante”.

É, nesse sentido, que o Cedace procura recrutar voluntários — entre os 18 e os 35 anos — para doações mais jovens, preferencialmente do sexo masculino. “Também há estudos que favorecem este tipo de dadores, embora não de forma tão evidente como no que respeita à idade”, aponta Manuel Abecasis. Mais de 90% dos dadores são caucasianos e é importante sensibilizar as minorias étnicas, já que o transplante será mais bem-sucedido se dador e doente forem da mesma raça.

Hoje, de acordo com o Instituto Português do Sangue e da Transplantação, é possível encontrar um dador compatível para cerca de 70% dos doentes, sendo que, em apenas 25% a 30% dos casos, há um irmão compatível.

Quem queria ser dador, de forma anónima e voluntária, aceita ajudar um doente em qualquer parte do mundo e 60% dos transplantes em Portugal são feitos com células de dadores estrangeiros — daí também a importância de alargar a base de dados.

“Em Portugal fazem-se cerca de 300 transplantes alogénicos (ou seja, com dador saudável) por ano, sendo que mais de 50% são com dadores de registos”, informa o presidente da APCL. Doar é gratuito e todas as despesas são asseguradas, argumenta. Por exemplo, se tem de faltar ao trabalho, esses rendimentos são compensados.

Mas doar medula óssea dói?

Primeiro, importa recordar o que é a medula óssea. “É um tecido de consistência mole que preenche o interior dos ossos longos e as cavidades esponjosas dos ossos”, define o IPST, no seu site. Na medula existem células progenitoras, ou seja, as que têm capacidade de se diferenciar e “dar origem a qualquer célula do sangue periférico”.

Quando se faz um transplante, as células saudáveis vão substituir as células doentes. Nas leucemias agudas é “mais frequente” ser preciso transplantação — Simão foi diagnosticado com leucemia linfoblástica aguda, uma forma rara, que representa apenas 0,3% de todas as neoplasias, pode ler-se no site da APCL. Muitos casos de leucemia são curados apenas com quimioterapia e recurso a fármacos inovadores, explica o especialista Manuel Abecasis.

Para o dador, o transplante, feito com recurso a anestesia, “envolve um risco muito pequeno para quem dá e, para o doente, a dádiva pode fazer a diferença entre a vida e a morte”, apela. Manuel Abecasis aconselha que, quem se quiser inscrever, esclareça as suas dúvidas com um profissional de saúde.

Se já é dador, não se esqueça de ir mantendo actualizados os contactos junto do Cedace, porque a chamada pode chegar a qualquer momento, mesmo depois de terem decorrido muitos anos desde a sua inscrição. E não se esqueça de que também são precisos dadores de sangue, termina o presidente da APCL: “O nosso país tem uma enorme necessidade de dadores, sem sangue e plaquetas não é possível tratar nem transplantar os que precisam.”

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