A importância do médico de família no diagnóstico das doenças cardiovasculares
A Medicina Geral e Familiar tem um papel essencial no diagnóstico precoce e no imediato encaminhamento dos doentes com patologia cardiovascular, para outras especialidades como é o caso da cardiologia. Esta quinta-feira assinala-se o Dia Mundial do Coração.
Nas últimas décadas, a doença cardiovascular aumentou significativamente em Portugal, registando-se não só um maior número de casos, fruto de mais e melhores meios de diagnóstico, assim como do melhor acesso aos mesmos, mas também como resultado do envelhecimento da população e da tendência evidente para a inversão da pirâmide etária da população nacional.
Este aumento relativo do número de doentes cardiovasculares, sobretudo em faixas etárias mais avançadas, com patologia cardiovascular diagnosticada grave, bem como de portadores de outras comorbilidades importantes, como a obesidade, a diabetes mellitus, o sedentarismo ou a adição ao álcool e ao tabaco, transformam a cada dia o desafio de os abordar da forma mais adequada, estabelecendo diagnósticos atempadamente e promovendo uma rápida abordagem terapêutica das patologias, assim como o melhor seguimento das mesmas.
Neste aspecto, Portugal pode orgulhar-se de dispor de centros de diagnóstico e tratamento de excelência, para doentes cardiovasculares, existindo vias verdes e protocolos avançados para tratamento de doença vascular na grande maioria das instituições hospitalares do sistema de saúde. Temos também acesso aos mais variados e avançados meios complementares de diagnóstico e tratamento em ambulatório, com o acompanhamento adequado em consultas, quer com os especialistas de Medicina Geral e Familiar, quer com os outros vários médicos especialistas, naturalmente encabeçados pelos cardiologistas.
A Medicina Geral e Familiar tem um papel fundamental nesta peça: deve fazer parte não só do diagnóstico precoce de patologias como a hipertensão arterial ou a doença isquémica, em simples consultas de rotina, com recurso a um exame objectivo adequado ao doente e a solicitação de alguns exames complementares de diagnóstico fundamentais — electrocardiograma, ecocardiograma, prova de esforço, holter —, como também de uma primeira abordagem terapêutica, sempre que possível, encaminhando também todas as situações que necessitem de actuação mais imediata para os cuidados de saúde mais especializados a nível hospitalar, muitas vezes em contexto de urgência/emergência.
Na área cardiovascular, a Medicina Geral e Familiar pode ainda actuar na área fundamental da prevenção da doença, não só pela capacitação dos doentes para a prática de estilos de vida mais saudáveis, pelo estímulo à prática de exercício físico e de dietas adequadas, mas também pela intervenção em ambiente de consulta, sempre que possível no combate a hábitos tabágicos, álcool e outras adições, avaliação farmacoterapêutica individual e correcção de outros factores de risco de doença cardíaca bem como de outras patologias associadas.
A insuficiência cardíaca, a dislipidemia (aumento das gorduras no sangue), e a hipertensão, apesar da multiplicidade de factores que podem estar na sua génese, têm quase sempre alguma possibilidade de intervenção, que possibilite a melhoria dos seus sintomas e das possíveis complicações. Tal como em todas as doenças cardiovasculares, é fundamental que se estabeleça um correcto e atempado tratamento bem como a sua reavaliação regular, quer pelo médico de família, quer por cardiologista ou outras especialidades.
A história natural da grande parte das doenças cardiovasculares é infelizmente revestida de enorme carga de mortalidade e morbilidade, pelo que é fundamental que estes doentes não sejam descurados em nenhuma ocasião, sob pena de ocorrerem situações de incapacidade graves ou limitações crónicas para a vida.
Os maiores desafios na área da patologia cardiovascular em Portugal prendem-se com o diagnóstico e tratamento. Em primeiro lugar, facilitar a todos os doentes o acesso ao estado da arte em termos de diagnóstico e tratamento destas doenças, eliminando tempos de espera excessivos ou passos desnecessários até se chegar ao correcto diagnóstico. Isto para, em segundo lugar, lhes garantir o mais rápido e eficaz tratamento da doença, minorando assim um terceiro desafio, que são as possíveis sequelas de uma situação clínica mais grave ou a descompensação da mesma. Talvez possamos incluir como quarto desafio, a necessidade de continuar a oferecer cuidados de saúde adequados e com uma boa acessibilidade, a uma população cada vez mais envelhecida e com maior carga de doença e medicação.
Pela sua disponibilidade e acessibilidade, mas também pelo acompanhamento dos problemas de saúde de forma contínua e abrangente, cabe ao clínico de Medicina Geral e Familiar actuar atempadamente nas situações de doença e na concretização de programas de vigilância e prevenção efectiva da doença cardiovascular, contribuindo ao mesmo tempo para o melhor controlo da sua prevalência e para melhoria dos cuidados de saúde a estes doentes.