Dão, dia 3: última paragem, Sátão e a Taboadella

Outrora incluída na sub-região Periférica, a zona de Sátão e Penalva do Castelo, entre 489 e 588 metros de altitude, ainda hoje tem características diferentes. Reportagem no Dão, parte III.

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O projecto da Taboadella foi oficialmente inaugurado este ano, mas a quinta em Sátão foi adquirida pela Amorim em 2018. Anna Costa

Ao segundo dia do nosso roteiro pelo Dão na companhia de Vanda Pedroso (a técnica do Centro de Estudos Vitivinícolas foi nossa “guia” durante dois dias na região, nós andámos por lá mais um), seguimos para Penalva do Castelo e Sátão, zona de maior altitude, mais fria, onde o ciclo da videira é muito mais curto, no extremo noroeste da região do Dão.

Esta é a terceira das três partes em que dividimos a nossa reportagem, cujo objectivo era falar de diferentes Dãos. Andámos por Gouveia e encosta da serra da Estrela, Nelas, e Sátão e Penalva do Castelo (nesta terceira parte).

Recebe-nos na Taboadella o enólogo residente. Rodrigo Costa saiu da Adega Cooperativa de Penalva do Castelo para abraçar o projecto ambicioso, a todos os níveis, da família Amorim. Adquirida em 2018, a Taboadella colocou no mercado os primeiros vinhos sob a nova chancela logo em 2019. A adega nova, revestida a cortiça e projectada pelo arquitecto Carlos Castanheira – assim como o Barrel Top Walk, experiência na sala de barricas a fazer lembrar outra, nas copas das árvores de Serralves –, começou a funcionar em 2020. Fica num ponto central da propriedade (onde já ficava a antiga), espelha bem o foco enorme na sustentabilidade que é pedido a todos no grupo e é simultaneamente despojada e state-of-the-art. Para além de cubas de inox, tem 11 tulipas de cimento, de 9500 litros cada – “dos materiais porosos, é o menos poroso”, explica Rodrigo Costa.

Já este ano, quando o projecto da Amorim foi oficialmente inaugurado, abriu a Casa Villae 1255, com oito quartos, sete duplos e uma camarata, a 3000 euros cada duas noites (a estada mínima). “É o início dos inícios de um turismo muito mais premium no Dão”, junta-se à conversa Susana Pinho, directora de enoturismo do grupo. A nova unidade de enoturismo deve o nome villa à aldeia romana que existiram no território hoje ocupado pela Taboadella. “Era um aldeamento romano, onde havia trocas comerciais. Temos aqui vestígios a partir do século I, como o lagar esculpido num penedo. Mas 1255 é o registo mais antigo do nome Taboadella que o historiador encontrou”, conta Susana Pinho.

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Infografia: Francisco Lopes

Vista daqui, a orografia da quinta, uma única e enorme “parcela” de 41 hectares, parece a da própria região, demarcada desde 1908 e onde a paisagem é vinha, olival e pinhal. Mais concretamente 20.897 hectares de vinha aprovada para Denominação de Origem (DO) e Indicação Geográfica (IG). É possível avistar toda a propriedade.

A altitude na Taboadella vai dos 420 metros na cota mais baixa aos 530 metros na mais alta, onde para além da unidade de alojamento de luxo fica também a parcela com Jaen. “Está ao contrário da região. Mas temos uma bacia hidrográfica riquíssima na quinta. Isto não é regado, mas as plantas que encontrámos aqui estavam completamente adaptadas”, explica Rodrigo Costa. E completa: ali, o Jaen “é diferenciador por causa da altitude, que promove mais secura, um tanino fruto da altitude e um nariz com mais especiarias”.

Em 2018, a empresa reestruturou 16 hectares de vinha, onde colocou castas brancas em que a quinta era deficitária, o Encruzado e o Cerceal Branco, e também plantou Baga. De resto, manteve o que existia: Tinta Pinheira, Alfrocheiro – que dá um belo e exótico monovarietal, que provámos – e o que já havia de Encruzado. Com uma área total de seis hectares, o Encruzado “é das maiores parcelas”, mas várias outras “andam perto”.

A orografia da Taboadella, uma única e enorme “parcela” de 41 hectares, parece a do próprio Dão, vai dos 420 metros de altitude na cota mais baixa aos 530 metros na mais alta. Anna Costa
A vista da adega desenhada por Carlos Castanheira para o topo da propriedade, onde fica a Casa Villae 1255. Anna Costa
A varanda da sala de provas que foi distinguida em 2022 como a Melhor Sala de Provas do país pela APENO — Associação Portuguesa de Enoturismo. Anna Costa
A adega foi projectada pelo arquitecto Carlos Castanheira. Anna Costa
Dentro, para além de cubas de inox, há 11 tulipas de cimento, de 9500 litros cada – “dos materiais porosos, é o menos poroso”, explica Rodrigo Costa, o enólogo residente. Anna Costa
A Barrel Top Walk, na sala de barricas, faz lembrar outra experiência, entre as copas das árvores de Serralves, desenhada pelo mesmo arquitecto. Anna Costa
A Casa Villae 1255 abriu em 2022, tem oito quartos, sete duplos e uma camarata. Anna Costa
A unidade de alojamento premium custa 3000 euros por duas noites (a estada mínima). Anna Costa
O terraço da Casa tem uma vista privilegiada para as vinhas. Daqui alcança-se toda a propriedade na verdade. Anna Costa
O Encruzado é um dos monovarietais que a Taboadella gosta de dar a provar aos visitantes. Anna Costa
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A orografia da Taboadella, uma única e enorme “parcela” de 41 hectares, parece a do próprio Dão, vai dos 420 metros de altitude na cota mais baixa aos 530 metros na mais alta. Anna Costa

Actualmente, a Taboadella já tem 20 por cento dos encepamentos com castas brancas, essa área mais do que duplicou. Nos tais 16 hectares reestruturados, foram arrancadas “castas estrangeiras que não interessavam ao projecto do grupo Amorim para o Dão”. Há depois sete parcelas de estudo, com 200 pés de videira cada, com sete castas “esquisitas”: uma tinta, Alvarelhão, e seis brancas, Luzidio, Uva Cão, Rabo-de-Ovelha, Barcelo, Alvar e Terrantez.

“O caminho do Dão passa por experimentar estas castas em micro-vinificações, para ver se se adequam. Sem utilização de água e em terrenos capazes de plantar vinha”, entende Rodrigo Costa. E na Taboadella há solos capazes: a junção de dois afloramentos rochosos granito de Cavernães e granito de Farminhão-São João de Lourosa explica a existência de sete classes de solos nas 27 parcelas da propriedade e origina “18 micro-terroirs naturais”.

“É preciso mudar a forma de condução da sebe. E tem de ser feito já. É preciso ter meios [para fazer esse estudo]. Já vamos atrasados a trabalhar, mas mais vale tarde do que nunca”, acrescenta Vanda Pedroso.

Os investimentos da Taboadella ou da Passarella – por onde passámos no primeiro dia e na primeira parte desta reportagem; e que também terá um hotel em 2023 – não são comuns no Dão, região de minifúndio. Mas o futuro e os grandes vinhos do Dão (no futuro) far-se-ão com todos. No mesmo “prato” – é essa a imagem que escolhemos para descrever a orografia da região, que vista dos seus extremos parece um prato fundo em que os rebordos são as serras da Estrela, do Caramulo e do Açor e o centro um imenso vale com vários pequenos montes e vales dentro.

Próxima e última publicação: o perfil de Vanda Pedroso, “fiel depositária” das vinhas velhas do Dão e a nossa guia durante dois dos três dias que recentemente passámos na região.

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