Afinal, o que fazem as crianças num contexto de educação de infância?
As crianças de tenra idade aprendem porque querem, aprendem sobre o que lhes interessa, e este será, muito provavelmente, o ponto fundamental a ser considerado pelos adultos.
A educação de infância oferece, de acordo com o Relatório da OCDE Starting Strong VI (2021), um forte começo de vida a todas as crianças, garantindo oportunidades e experiências equitativas que apoiam o desenvolvimento, promovem o bem-estar e ligam as famílias umas às outras e aos recursos da comunidade. Nos dias que correm, os impactos positivos de um bom começo de vida são conhecidos e são do mesmo modo valorizados — sabe-se que a participação das crianças em contextos de educação de infância de alta qualidade promove o desenvolvimento e tem implicações nas aprendizagens futuras.
Conhecer o modo como as crianças aprendem e o modo de atuar para mobilizar processos de aprendizagem é uma das exigências colocadas aos educadores de infância que diariamente trabalham nas creches e jardins de infância. Por essa razão, o enfoque sobre o que fazem incide essencialmente na fase atual em que as crianças se encontram e não nas seguintes. Procura-se, neste contexto, seguir uma lógica de adequação e não tanto de preparação ou de antecipação para a escolaridade obrigatória, reconhecendo, naturalmente, benefícios futuros, mas focalizados no potencial de desenvolvimento das aprendizagens atuais (OCDE, 2021), resultantes de interações entre ambientes (casa-escola), bem como entre crianças, com diferentes adultos (além da família) e com espaços e materiais intencionalmente preparados.
A experiência de aprendizagem das crianças nos contextos de educação de infância encontra-se, assim, muito relacionada com as oportunidades de exploração dos seus próprios interesses, ou seja: a partir do que desperta curiosidade, do que inquieta, das interrogações sobre o que se encontra ao seu redor. As crianças aprendem pela ação concreta e direta e pela forma como se relacionam com isso mesmo, desenvolvendo de modo interligado capacidades cognitivas, sociais, emocionais e de autorregulação.
Neste sentido, se, em jeito de síntese se fizesse, a pergunta “o que fazem, afinal, as crianças num contexto de educação de infância?”, escolheria três respostas, entre tantas outras, como fundamentais:
Recebem cuidados e, deste modo, aprendem a cuidar de si e dos outros. Os cuidados são entendidos há décadas como um ponto essencial do que se faz nas creches e nos jardins de infância, hoje claramente compreendidos como parte do processo educativo, ou, por outras palavras, os cuidados e a educação estão intimamente interligados, como duas faces da mesma moeda — isto é, ao cuidar assegura-se bem-estar físico e emocional, estabelecem-se relações de confiança e de afeto entre crianças e adultos e, deste modo, educa-se.
Aprendem a relacionar-se consigo próprias, com os outros e com o que as rodeia. Exploram persistentemente o corpo, testam limites, experienciam a partilha e a frustração, aprendem que os outros têm perspetivas diferentes, descobrem que o mundo tem sons, cheiros, cores e paladares, que tudo isso se relaciona e que, à medida que o tempo passa, pode ser representado de diferentes formas (pelas artes, pela escrita, pelos números).
Aprendem a perguntar sobre o que desperta interesse e a procurar respostas. Os bebés percebem quando são correspondidos nas tentativas de comunicação que, muito frequentemente, fazem, e os educadores de infância sabem observar e corresponder a estas tentativas, potenciando e mobilizando desafios. É por isso que, por exemplo, quando um bebé repara e observa na chuva que cai, o educador sabe que tem de criar oportunidades. Em primeiro lugar, abre a janela, mais adiante, e à medida que o tempo passa, prepara equipamento para uma exploração direta e, posteriormente, espera (ou incita a) perguntas e inicia, com a criança, a busca — a procura por respostas a questões intrigantes.
As crianças de tenra idade aprendem porque querem, aprendem sobre o que lhes interessa, e este será, muito provavelmente, o ponto fundamental a ser considerado pelos adultos. Por esta razão, atividades segmentadas em áreas disciplinares, muitas vezes “em extra”, ligadas à ideia de uma melhor preparação para a etapa seguinte; ou mesmo incessantes interrupções às dinâmicas contextualizadas que os educadores de infância criam para cumprirem aquela que será a sua responsabilidade maior (diria até mais entusiasmante da profissão), por atividades lecionadas por professores especializados, que permanecem trinta minutos nas salas, não valorizam os interesses das crianças e a responsabilidade de os educadores de infância construírem e gerirem o currículo (Lei de Bases do Sistema Educativo/Lei-Quadro para a Educação Pré-Escolar).
Por esta razão, é tão importante pensar-se no que se faz com o tempo (irrepetível) de se ser criança, evitando que as crianças vivam prisioneiras do tempo dos adultos (Neto, 2020).