O chefe da Mossad foi a Kinshasa e acabou expulso

Yossi Cohen, que dirigiu a espionagem israelita até ao ano passado, fez em 2019 três visitas à capital da República Democrática do Congo, mas ninguém sabe exactamente a razão. Na última, acabou levado para o aeroporto, basicamente expulso: algo inédito, diz o Haaretz.

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Felix Tshisekedi toma posse como Presidente da República Democrática do Congo junto ao seu predecessor Joseph Kabila Olivia Acland/Reuters

O antigo chefe da Mossad Yossi Cohen, que esteve à frente da agência de espionagem de Israel entre 2016 e 2021, fez três visitas não anunciadas a Kinshasa, República Democrática do Congo, surpreendendo o Presidente do país com a visita não anunciada e não coordenada, e acabando por ser efectivamente expulso. O comportamento de Cohen não tem precedentes pelo menos conhecidos, a expulsão também não, sublinha o diário hebraico Haaretz.

No ano de 2019, Cohen esteve três vezes na capital congolesa. Na primeira, foi acompanhado pelo multimilionário Dan Gertler, que as autoridades britânicas suspeitam que pagou um suborno de 360 milhões de dólares em troca de direitos para exploração mineira no país.

Cohen encontrou-se com o Presidente da República, Félix Tshisekedi, que na primeira vez que o chefe da Mossad apareceu de surpresa no seu gabinete não soube o que pensar, mas da segunda vez começou a suspeitar que Cohen pudesse estar a interferir na política do país, apoiando o seu aliado, mas também rival Joseph Kabila, que tinha sido Presidente entre 2001 e Janeiro desse ano – Tshisekedi acabara de lhe suceder no cargo. Antes, o programa televisivo de investigação Uvda, de Israel, noticiara que em 2015 Kabila tinha contratado uma empresa privada israelita para espiar os seus opositores.

Na terceira visita de Cohen, Tshisekedi voltou a recebê-lo, novamente sem uma reunião marcada, mas depois de algumas palavras do israelita sobre cooperação entre os dois países, o Presidente da República Democrática do Congo resolveu pedir a todos, excepto Cohen, que saíssem da sala, informando então o chefe da Mossad que não era bem-vindo no país e se deveria dirigir directamente para o aeroporto, sair e não voltar. “O chefe da Mossad foi efectivamente deportado – um passo sem precedentes e humilhante”, sublinha o Haaretz.

O jornal nota que ainda que tenha sido permitida pela censura militar a divulgação destas informações pelo site TheMarker, incluindo que Cohen teve aprovação superior (supõe-se que do então primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu), continua sem se saber qual foi o motivo das visitas nem a razão pela qual o chefe da Mossad decidiu aparecer de surpresa e não marcar as reuniões com antecedência – um comportamento que deixou muitos antigos responsáveis da agência a usar a palavra “loucura” para descrever o caso.

O facto de Cohen ter pressionado as autoridades norte-americanas para que removessem as sanções que tinham imposto a Gertler no final de 2017 (a administração do então Presidente Donald Trump fê-lo dias antes do final do seu mandato) deixa suspeitas sobre quem terá ajudado quem, diz o Haaretz.

Muitos na agência de espionagem ainda tentam perceber o que se pode ter passado para esta conduta totalmente fora do normal – ninguém se conseguia lembrar de uma acção remotamente semelhante. No melhor cenário, especulam as fontes do jornal, foi resultado da arrogância de Cohen. No pior, mais tarde ou mais cedo pode ser exposto um motivo menos nobre e “muitas pessoas vão ver este comportamento como o de um Estado mafioso”, conclui o diário hebraico.

Este não é o primeiro escândalo envolvendo Cohen: foi acusado de revelar segredos a uma mulher com quem teve um caso, e ainda ao seu marido (o que nega); foi muito criticado por ter dito numa entrevista que foi de Israel a autoria de um ataque a uma central nuclear iraniana e na morte de um cientista iraniano, e é ainda suspeito de várias violações de ética, incluindo de ter recebido um presente de 20 mil dólares de um empresário australiano.

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