Costa: subida do salário mínimo em 2021 e nova prestação social
Revisão dos escalões do IRS não é para já – mas a descida do IVA da luz sim. A resposta à crise “não pode passar pelo corte de rendimentos, mas, sim, pela sua protecção”, diz o primeiro-ministro ao Expresso. Sobre o surto no lar de Reguengos, critica a Ordem dos Médicos: “não tem competência legal para fazer” a auditoria que fez.
O primeiro-ministro admite continuar a aumentar o salário mínimo no próximo ano e criar um rendimento excepcional por causa da pandemia, mas adia a revisão dos escalões do IRS, prevista para 2021, para os orçamentos dos anos seguintes.
“Desejamos, por exemplo, que o salário mínimo nacional possa continuar a subir. Naturalmente de acordo com aquilo que é a dinâmica económica de hoje, que é muito distinta da que existia há um ano. Seguramente não vamos poder ter um aumento com a dimensão que tivemos no ano passado, mais desejamos um aumento”, sublinhou António Costa, em entrevista ao semanário Expresso.
Para o chefe do Governo, a resposta à crise económica provocada pela pandemia “não pode passar pelo corte de rendimentos, mas, sim, pela sua protecção”, e também não pode “passar por um aumento de impostos, mas por manter uma estabilidade fiscal que crie condições para as empresas resistirem” sem destruírem postos de trabalho, tendo em conta de que, no contexto actual, Portugal vai depender “muito da procura global”.
Questionado sobre se haverá congelamento das progressões e promoções na função pública, António Costa garantiu que “não haverá novo congelamento”. Contudo, uma vez que “neste momento a inflação é negativa”, o primeiro-ministro assegura que não vai ser possível manter o “compromisso de em 2021 haver um aumento de 1,1%”.
“Se houver aumento do salário mínimo, isso implicará que o vencimento mínimo na função pública terá um impulso. Mas estamos numa fase prematura, o diálogo ainda não começou”, acrescentou.
Nova prestação social
António Costa também foi interrogado sobre se o executivo socialista está a planear estender para 2021 as medidas de apoio social aprovadas no contexto desta crise, como, por exemplo, a extensão do subsídio de desemprego até ao final do ano.
Na resposta, o chefe do executivo disse que deverá ser “criada uma nova prestação social que seja desenhada especificamente para esta realidade” covid-19 até porque muitos portugueses afectados pela pandemia não são elegíveis para o Rendimento Social de Inserção. “Aí está um dos temas que temos para falar na próxima semana com o BE, PCP, PAN e PEV”, disse.
“No desenho das medidas, temos de ter a preocupação de distinguir as que tendem a perdurar para lá da pandemia de outras que sejam excepcionais e vigorem apenas para este período. Nunca podemos esquecer que há sempre um amanhã”, completou o também secretário-geral do PS. É necessário desenhar “uma medida para aquelas situações excepcionais” que a covid-19 introduziu, nomeadamente para as pessoas que “tinham rendimentos relativamente elevados, para serem elegíveis para essas prestações sociais”.
Este apoio vai ser, por isso, destinado aos trabalhadores do sector “da cultura, dos eventos, em sectores da actividade turística”, que tiveram de enfrentar “uma situação de absoluta quebra de rendimentos”.
Revisão do IRS só depois de 2021
António Costa considerou, no entanto, que “é muito improvável que seja no Orçamento [do Estado] de 2021” que se faça a revisão dos escalões do IRS (Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares).
“Seguramente, os orçamentos de 2022 e 2023 são outras oportunidades. É também por isso que insistimos com os nossos parceiros parlamentares que o diálogo não se deve esgotar no Orçamento de 2021. É muito importante que ele se associe ao programa de recuperação económica e social, a novas realidades da legislação do trabalho a exigirem intervenção urgente e que tenham em conta os orçamentos para 2022 e 2023”, referiu o líder do executivo.
À pergunta sobre se é imprescindível fazer a revisão dos escalões do IRS durante esta legislatura – que finda em 2023 -, Costa rejeitou utilizar “palavras que sejam irrevogáveis ou imprescindíveis”, mas reconheceu ser “necessário para o país” que acontecesse.
“Se não fizermos a revisão dos escalões não foi porque deixámos de acreditar que é importante, é porque temos de nos ajustar à realidade. Ninguém tem dúvidas de que o cenário em que estamos a preparar este OE2021 é distinto do anterior e exige que olhemos para este Orçamento também a pensar nos seguintes”, explicitou.
Costa garantiu também que o Governo vai “usar ainda este ano a autorização legislativa” que foi concedida “para a redução do IVA” da electricidade. Esta medida “entrará em vigor ainda este ano”, uma vez que é “transversal a todas as famílias”.
Reguengos: “Ordem dos Médicos não tem competência legal para fazer estudo”
António Costa assumiu igualmente que houve falhas na situação que envolveu o lar em Reguengos de Monsaraz – onde morreram 16 utentes infectados com o novo coronavírus (SARS-CoV-2), mas reforçou que a instituição “é de uma fundação privada” e que, “quando foi alertado, o Estado reagiu imediatamente”.
O surto de Reguengos de Monsaraz provocou 162 casos de infecção, a maior parte no lar da FMIVPS (80 utentes e 26 profissionais), mas também 56 pessoas da comunidade, tendo morrido 18 pessoas (16 utentes, uma funcionária do lar e um homem da comunidade).
Costa reiterou que mantém confiança na ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho: “A ministra disse claramente que não desvalorizava o que aconteceu, e mais: a actuação que tivemos demonstrou que não desvalorizámos. Convém não esquecer que em Abril tivemos 363 surtos em lares e ontem tínhamos 80. Não acordámos agora por causa do relatório de uma entidade [Ordem dos Médicos] que não tem competência legal para fazer esse estudo. As ordens profissionais existem para regular o exercício da actividade dos seus profissionais, ponto. Não existem para fiscalizar o Estado.”