Beira: “Se outros saíram das guerras mundiais, também nos vamos erguer”

Autarca da Beira acusa Governo moçambicano de não canalizar a ajuda internacional para a cidade afectada pelo ciclone Idai.

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O presidente da câmara da Beira, Daviz Simango Daniel Rocha

O presidente da Câmara da Beira garante que os casos de cólera “são insignificantes” para o “nível de desastre na Beira”. Daviz Simango, eleito pelo Movimento Democrático de Moçambique, diz que o Governo apela à ajuda internacional em nome da Beira e depois não canaliza nada para a cidade, mas prefere evitar o embate político com a Frelimo e sublinhar que a cidade só precisa “que os beirenses se preparem para construir o seu futuro”.

Nos primeiros dias depois do ciclone, havia na imprensa moçambicana quem perguntasse onde andava Daviz Simango…
[Risos]

Onde é que andava?
Naturalmente, estava na Beira, andava a recolher árvores, a abrir as estradas, debaixo da chuva. Dediquei-me ao meu povo. As pessoas que passaram pelas estradas viram-me a trabalhar, eu não sou homem das câmaras, sou homem de trabalho.

Que trabalho tem feito o município para recuperar a cidade e quais são as limitações?
Tenho a convicção de que a mão estendida não resolve os problemas. Tomámos algumas iniciativas, destroncámos as árvores que estavam caídas, abrimos as estradas e agora com muito orgulho digo que a Beira já é transitável. Agora temos a segunda fase importante pós-ciclone. No dia 24 [de Abril] vamos ter aqui uma conferência de doadores, vamos expor a Beira, vamos expor os problemas. Temos hospitais sem cobertura, escolas caídas, pequenas e médias empresas destruídas. Mas, tenho fé que se outros saíram das guerras mundiais, também nos vamos erguer.

Já tem uma estimativa de quanto é preciso investir?
A nossa equipa técnica está a trabalhar nisso, penso que até à próxima semana vamos ter dados preliminares. É preciso notar que, com este ciclone, o munícipe da Beira perdeu a capacidade de pagar as obrigações fiscais e o município vai ter poucas receitas e perde a capacidade de executar.

Falou-se em 85% a 90% da cidade destruída, confirma-se?
Segundo o levantamento preliminar, 85% da cidade ficou destruída. E temos de recuperar, a Beira não pode continuar a ser uma cidade fantasma, o apagão da noite não pode continuar. E há condições e motivação para começar. Seguramente que vamos precisar de apoios internacionais, porque os recursos internos já não eram suficientes para o que fazíamos, muitas das infra-estruturas públicas foram feitas foi com apoio internacional e agora muito mais vamos precisar desse apoio.

A coordenação de toda a ajuda mereceu críticas dos beirenses porque estava a ser canalizada para fora da cidade da Beira…
Até hoje, a ajuda continua a ir para fora.

E qual a razão para essa ajuda não ser canalizada para a Beira?
Muita da ajuda é apelada em nome da Beira, a maior parte da população da província de Sofala vive aqui, a maioria da população das áreas afectadas está aqui, a Beira é a área mais afectada, devia haver mais apoio à cidade. Os pactos internacionais ditam que as doações devem ser feitas de Estado para Estado, mas eles que se lembrem que as coisas foram pedidas em nome da Beira. 

Acha que há um aproveitamento político da ajuda internacional?
Estamos em campanha eleitoral porque vamos entrar nas eleições [Outubro]. Aqui na Beira, o MDM é o governo e a Frelimo é a oposição, a tendência é procurar posicionar-se melhor, mas não quero entrar nos aspectos políticos.

Muita gente diz que a Beira está degradada há muito tempo, não é de agora, o ciclone apenas deixou mais marcas. Há falta de investimento público na Beira por questões políticas?
Há menos investimento público em relação à zona sul, por isso, há o problema das assimetrias no país, mas vamos continuar a trabalhar conscientes que a Beira estava a crescer. A Beira é extremamente importante para o hinterland e para Moçambique, por causa do seu porto.

A Beira tem capacidade de se voltar a reerguer?
Tem, tem e tem. A Beira, o que precisa é que os beirenses se preparem para construir o seu futuro.

Já tem notícias de cólera e difteria na cidade?
Há um pouco de difteria, há indícios de cólera, mas são contas extremamente reduzidas. Estamos a aconselhar as autoridades da saúde a desinfectar os acessos aos centros de acomodação para evitar a propagação. Mas afirmo que os índices são extremamente insignificantes para o nível de desastre natural que tivemos. Acredito na minha população, porque já tivemos inundações e não tivemos casos de cólera.

Há alguma clínica de prevenção para a cólera?
Por enquanto não abriu nenhuma clínica de cólera, provavelmente irão abrir. A clínica usada antes para a cólera está fechada porque os casos tinham acabado na cidade da Beira.

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