O mais feliz possível

“Não sofrer por antecipação, trabalhar para ser o mais feliz possível, não ter medo de rir nem de chorar.” É logo aqui que nos prendemos à conversa da Bárbara Reis com três mulheres que conhecemos bem: a manequim Nayma Mingas, a cantora Maria João e a antiga primeira-dama Maria Cavaco Silva. Três mulheres, três gerações separadas por 18 anos, as três a envelhecer à nossa frente. Tão bem.

Leio que uma delas acredita que “seria impossível ter esta conversa com três homens”, mas prefiro seguir a prudência da Bárbara numa convicção: a conversa não seria exactamente igual. Não se falaria da cor do cabelo, talvez da perda dele; não se falaria tanto da viuvez, porque a estatística nos diz que partimos mais cedo. De resto, acredite, a conversa não tem género: sobre viver bem e activamente (“fazer trail e ler Séneca"); sobre o que é isso da imortalidade e até onde nos conforta a fé; sobre os medos e as alegrias que aparecem com os anos – ou como mudam com eles.

O tema transversal à revista Culto é, pois, o nosso envelhecimento. Que é um tema que – sem ironia – ganha vida nova com o tempo. Basta que abra um jornal dos últimos dias e verá como tenho razão: aqui mesmo, no PÚBLICO, passamos sempre por temas difíceis como a eutanásia ou os cuidados paliativos; por temas sensíveis como a memória ou a perda dela; por temas fundamentais como o comer melhor e o exercício; e pela fé em conseguirmos o equilíbrio certo entre a vida profissional e pessoal. No fundo, andamos à volta da pergunta de sempre: como é isso de envelhecer bem?

A pergunta é velha, mas a boa notícia é que há respostas novas. Com o passar das gerações, quebrámos o tabu da idade, valorizámos as imperfeições da vida, recuperámos o valor da sabedoria. Diz a Maria João, por exemplo, e digo-o eu também – admitindo que seja optimismo de quem também envelheceu alguma coisa. 

Podemos, assim, voltar aos três conselhos das mulheres com que começou esta conversa: “Não sofrer por antecipação, trabalhar para ser o mais feliz possível, não ter medo de rir nem de chorar.” Mas também podemos passar pelo contributo de David Marçal para esta edição, que nos explica cientificamente como a velha conversa de família sobre o modo como envelhecemos vai dar a uma palavra com quatro sílabas: telómeros.

Porque a ciência se cruza com a tecnologia, o João Pedro Pereira dedicou-se nesta edição a um luxo: o dos milionários que gastam fortunas a tentar que o tempo não passe por eles. “Who wants to live forever?”, perguntavam os Queen (que, lá está, encontraram no génio a maneira de viver para sempre em nós).

Já que falamos disto, tivemos também de passar por outro tabu: quanto nos custa a morte – a nossa ou a de quem mais amamos. E de como sobreviver a isso também. Trazemos-lhe, por isso, um testemunho na primeira pessoa – porque tudo nesse momento é único e parte de nós. E sobre a morte e a vida, vale muito a pena reter a lição que Maria Cavaco Silva nos traz da sua avó: “Todos os dias chorava e ria. O que tinha perdido nunca a impediu de dar uma gargalhada à vida. São as faces fundamentais da vida.” Ou a resposta simples, e por isso sábia, que nos dá a mais nova das três, Nayma: “Envelhecer bem? É a felicidade. Começa de dentro para fora.” 

Se chegou aqui sem ler, é fazer ao contrário: passe desta página, aqui fora, lá para dentro. Leitura feliz. 

P.S. Pela primeira vez, esta edição também vem de dentro para fora. Pela mão da Bárbara Wong, que editou, e de tantos e bons jornalistas e colaboradores do PÚBLICO. Chama-se a isto rejuvenescer. 

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