Todos os governantes parecem medíocres quando um país inteiro caminha para o abismo.
Mas em Portugal há casos excepcionais. Vítor Gaspar parece excepcional porque possui a aura de competência que Pedro Passos Coelho não tem e que Miguel Relvas nunca alcançará (sobretudo agora). Se à partida o ministro das finanças foi elogiado pelo currículo e criticado pela forma como comunica, actualmente acontece o oposto. Esta complexidade na avaliação esbarra com o perfil simplista de Vítor Gaspar.
Mas é esta simplicidade atípica e aparente que pode trazer a pergunta, Vítor Gaspar faz parte da classe política? Afinal, é um dos principais responsáveis para que todos os dias fiquemos mais pobres.
Será a coragem de transportar a pasta que arde que faz a crença? Será exactamente pela forma como comunica?
Depois de Cavaco Silva ter dito que não era um político profissional e que não dependia da política para viver, e mais recentemente também ter dito que o seu salário de político (que não merece, porque não sendo profissional será certamente um amador) não era suficiente para os gastos; e depois de Fernando Nobre se ter colocado no papel de candidato não-político (porque nenhum partido político lhe servia) e mais tarde ter negociado com os partidos, surgiram naturalmente dúvidas sobre se Vítor Gaspar será também um ministro das finanças não-político?
Nos tempos que correm parece que a resposta afirmativa só lhe atribuiria valor. Mas não. Vítor Gaspar é um político dos melhores. Como sabemos? Precisamente através da sua comunicação. Se esquecermos as palavras não ditas e a retórica, é possível encontrar afirmações que esclarecem.
Vejamos, em 17/10/2011, em entrevista à RTP, o Ministro das Finanças alertou-nos que despedir no actual contexto “100 mil funcionários públicos não seria descabido”. Nessa mesma entrevista ficámos também a saber que os despedimentos só não se concretizaram porque com “a rescisão amigável seria preciso pagar compensações e o efeito imediato não existiria.”
Esta foi a entrevista mais reveladora que o Ministro deu até à data e que permitiu confirmar, que muitos dos políticos de hoje se caracterizam pela ausência de sistema límbico. É precisamente esta lacuna, no que toca à demonstração de sentimentos e afectos, que os coloca ao nível dos répteis.
Mas Vítor Gaspar é um político distinto e, por isso mesmo, as comparações devem ser exaustivas.
Analisando a forma como comunica, vemos que utiliza um discurso sempre pausado e sem espinhas, como dói mais. A inexpressividade está lá e o tom monocórdico também. Tudo leva a crer que estamos perante algo maior.
Vítor Gaspar pode bem ser a versão humanóide da HAL 9000, essa célebre máquina de inteligência artificial do filme 2001 - Odisseia no Espaço.
Sobretudo se tivermos em conta a forma como a máquina diz aos astronautas que eles não são capazes de levar a operação a cabo, que não podem colocar a operação em risco, que o erro é humano que a ela não erra e não distorce a informação. Um dia podemos ouvir do ministro algo como “this mission is too important for me to allow you to jeopardize it”.
No filme, o único sobrevivente da tripulação acabou por desactivar a HAL enquanto a máquina o enchia de falsos perdões como “I can assure you now, very confidently, that it's going to be all right again”.
E é precisamente este final que nos conforta. O país intui (capacidade exclusiva dos humanos) que este Governo vai ser desligado, mas resta saber se tarda.