Governo aprova o decreto-lei que dividiu o cinema. E abre concursos no fim de Março

Um ano e meio depois, foi aprovado em Conselho de Ministros o decreto-lei que regulamenta a Lei do Cinema. ICA decide júris dos concursos, que terão novos membros.

Foto
Joao Henriques

Um ano e meio de debate depois, o decreto-lei 124/2013 tem morte anunciada – dará finalmente lugar ao novo decreto-lei que regulamenta a Lei do Cinema, aprovado esta quinta-feira em reunião do Conselho de Ministros. As divergências quanto a quem escolhe os júris dos concursos para apoios públicos marcaram a revisão do diploma, mantendo a mais recente versão tornada pública pela tutela: a SECA a ter apenas, como disse agora o ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, “um papel consultivo", dando ao Instituto do Cinema a palavra inicial e final. Os concursos abrirão “no final de Março”.

O número de membros dos júris da Secção Especializada do Cinema e do Audiovisual (SECA) aumentou, disse o ministro em conferência de imprensa, mas este órgão perde o seu actual poder decisivo sobre quem são os avaliadores que gerem os apoios do Estado à produção, criação, distribuição ou exibição de cinema e audiovisual. Há também novos concursos, para apoio à criação para argumentistas e também à “distribuição de cinematografias menos conhecidas no nosso território”, para um bolo total de 19 milhões de euros, que o ministro frisou serem mais 500 mil euros do que em 2017 – ano em que, tal como agora, os concursos abriram com seis meses de atraso em relação ao prazo legal.

Quanto à constituição dos júris, procurou-se que eles tenham “mais representatividade”, disse Castro Mendes, que leu do diploma ainda por promulgar: “as listas de jurados são compostas por personalidades de reconhecido currículo, capacidade e idoneidade, com manifesto mérito cultural e competência. Compete ao ICA [Instituto do Cinema e do Audiovisual] constituir uma lista de jurados efectivos para cada concurso e uma lista comum de jurados suplentes, após audição inicial da SECA na qual podem ser apresentadas pela SECA propostas de jurados ou considerações sobre os critérios que o ICA deve considerar no processo da sua selecção. Uma vez constituídas as listas referidas são apreciadas em reunião da SECA. Após consulta não vinculativa, o ICA aprova as listas definitivas de jurados e a lista comum de suplentes”.

Frisou ainda o ministro que agora o papel da SECA é “representativo, mas [só] consultivo”.

E “há um alargamento dos representantes com assento na SECA”, detalhou o ministro em resposta à Agência Lusa. “A SECA vai ser alargada a mais três representantes de produtores de cinema – sendo um da área da ficção, um da área da animação e um da área do documentário –, três representantes de realizadores de cinema – sendo um da área da ficção, um da área da animação e um da área do documentário –, um representante da Federação Portuguesa de Cineclubes, um representante dos festivais apoiados pelo ICA, um representante das associações do sector representadas pelo ICA, um representante da federação das escolas de cinema e audiovisual”. Luís Filipe Castro Mendes sublinhou que “os operadores continuam a participar na SECA”.

Até aqui, o artigo 14.º do decreto de 2013 indicava que “a Secção Especializada do Cinema e do Audiovisual do Conselho Nacional de Cultura, aprova, anualmente, para cada concurso um júri composto por um mínimo de três e um máximo de cinco elementos efectivos, e três suplentes, escolhidos de entre personalidades com reconhecido currículo, capacidade, idoneidade e com manifesto mérito cultural e competência para o desempenho da actividade de jurado”. Têm nela assento representantes de produtoras, operadores de televisão em sinal aberto e por subscrição, distribuidores, exibidores ou entidades como a Cinemateca Portuguesa, entre outros elementos. 

O decreto que regulamenta a Lei n.º 55/2012, conhecida como Lei do Cinema, diz sobretudo respeito ao apoio do Estado ao cinema e audiovisual, mas também estabelece as regras de acção do ICA a nível estratégico, de registo de obras e empresas, e foca-se nas obrigações de investimento dos operadores de televisão e de serviços audiovisuais a pedido (on demand), dos distribuidores e exibidores.

O ministro indicou esta quinta-feira que agora “há uma clarificação das normas e harmonização dos prazos para todos os operadores sujeitos às obrigações de investimento, o que facilita quer o seu cumprimento quer o controlo do seu cumprimento”, sem ter detalhado em que consistem essas medidas. Recorde-se que, segundo os últimos dados disponíveis, um dos operadores de televisão por subscrição, a Nowo (antiga Cabovisão) não cumpre a obrigação da chamada taxa anual e será devedora ao Estado de quase dois milhões de euros.

O ministro resumiu as alterações à regulamentação da Lei do Cinema como sendo do foro da “simplificação administrativa”, contemplando a “desburocratização dos procedimentos dos concursos” e a “redução dos custos e dos prazos das candidaturas”. Ainda sobre os júris, um dos objectivos do novo diploma é “tornar ainda mais transparente o processo de selecção das candidaturas”.

Ao longo do último ano e meio, depois de uma primeira auscultação do sector, o Governo foi mudando o seu rumo quanto à fracturante questão dos júris, que dividiu associações de profissionais e operadores sobre se deveria ser o ICA a decidir a sua composição ou a SECA a ter tal autonomia. Queixas sobre conflito de interesses ou "privilégios" foram sendo dirimidas nos jornais e até originaram um protesto no Festival de Berlim que teve apoio de grandes nomes do cinema mundial.

Novas reuniões, uma nova direcção do ICA e promessas várias da iminente aprovação do diploma depois, o documento verá finalmente a luz do dia após promulgação, em breve, pelo Presidente da República.

Sugerir correcção
Comentar