José Manuel Rodrigues
Jogos Proibidos a preto e branco e Afloramentos de cor marcam dois momentos da criação artística do fotógrafo Prémio Pessoa 1999. Uma exposição para ver em Matosinhos, que aqui apresentamos numa visita comentada pelo artista que trocou a Holanda pelo Alentejo
a Quase dez anos separam o tempo de criação das fotografias de José Manuel Rodrigues (n. Lisboa, 1951) que o Silo exibe, desde ontem e até 6 de Janeiro, em Matosinhos, divididas por dois títulos e pelos dois pisos deste espaço cultural do NorteShopping. Jogos Proibidos reúne 12 obras a preto e branco pertencentes à Colecção Nacional de Fotografia e que em 1998 integraram a exposição de Fotografia Portuguesa Contemporânea apresentada na galeria Château d"Eau, em Toulouse, França. Afloramentos inclui sete fotografias realizadas já este ano, a cores (técnica que o artista só começou a explorar em 2006, e que foi pela primeira vez mostrada na exposição Solo a Solo, apresentada no Porto, na Sala Maior), a maior parte das quais é agora mostrada ao público pela primeira vez. O fotógrafo distinguido com o Prémio Pessoa em 1999 (com o poeta Manuel Alegre) diz que o seu trabalho de exploração da cor é feito quase sempre sobre apenas dois tons, como se se tratasse de novas variações do preto e branco. Sérgio C. Andrade
"Há um sítio onde a alma descobre memórias. Viajo com o tempo vermelho azul", escreve o artista sobre esta fotografia. Vermelho e azul, duas cores que são apenas dois tons, na sua nova forma de aproximação à natureza a que tem dado especial importância desde que decidiu viver no campo, depois da experiência urbana na Holanda.
Esta é uma fotografia que já tinha sido mostrada na exposição Solo a Solo. É um dos primeiros trabalhos de experimentação da cor. "As gotas de água, todas juntas, formam um mar. Em mim há um barco." Que lugar ocupa o corpo humano na natureza? - uma inquietação a que o fotógrafo continua a dar expressão.
A série de fotografias Jogos Proibidos remonta a um tempo em que o artista explorava muito uma certa "intimidade". Este retrato foi feito em Évora. "Vida e morte unem-se no mapa do mundo. Retrato sonoro." É o tempo em que vê a natureza como um trono para o homem, para a pessoas que a habitam, numa relação natural e profunda, que nos dias que correm está cada vez mais adulterada, corrompida.
Depois de vários anos a viver e a trabalhar na Holanda, José Manuel Rodrigues radicou-se, em 1998, numa aldeia do Alentejo. Aqui começa a olhar para a natureza de uma perspectiva diferente, como com esta fonte de terracota em Arraiolos. "Atalha-se o norte com o sul, a terra com o mar, a casa com a anta..." Uma forma de iludir o erotismo que ela contém? O autor lembra que o erotismo é um jogo, tanto mais interessante quanto mais subtil é a sua enunciação, ainda que nela surjam sugestões fálicas ou sexistas mais ou menos óbvias.
José Manuel Rodrigues não costuma dar título às suas obras. "É sempre muito complicado fazê-lo. Cada fotografia tem de contar a sua própria história", justifica. Para esta, sugeriu a legenda-comentário: "Os espelhos continuam pensamentos. Atenção, o avião vai partir." É uma fotografia encenada, realizada em Montemor-o-Novo. "Agora não deixo nada ao acaso", explica o artista, para quem a encenação, a coreografia, é parte importante da sua estratégia de criação.
"Todos os caminhos estão dentro do universo. Todas as trocas têm um valor. Mas nem todas as estradas levam à minha aldeia." José Manuel Rodrigues aceitou o desafio de "legendar" as suas fotografias para o P2, algo que não fazia desde 1986. As suas estradas actuais passam muito pela água - é dela que tudo nasce, como as plantas surgem das raízes, cujo nascimento e natureza ele gostaria de estudar no futuro.