António Vitorino alerta para “duplo pagamento” na cópia privada
Mandatado pela Comissão Europeia, o ex-comissário encabeçou um processo de mediação entre os agentes do sector e concluiu que em casos como o de lojas online de música os detentores de direitos já são remunerados.
Em Portugal, suportes como CD, DVD e cassetes já são taxados, mas o assunto voltou recentemente à discussão, devido a uma proposta de revisão da lei, elaborada pela secretaria de Estado da Cultura, que pretende que o sistema seja alargado a dispositivos como leitores de música, discos rígidos e cartões de memória.
Vitorino nota que o sistema de taxas foi instituído numa altura em que o consumo era feito no “ambiente offline”, no qual os detentores de direitos não tinham outra via para serem remunerados pela cópia privada (uma excepção ao direito de autor que permite a cópia legal de obras em circunstâncias específicas). Actualmente, com os mecanismos digitais de protecção e com modelos de licenciamento, já nem sempre o caso é esse, argumentou. O ex-comissário concretizou com o exemplo de uma pessoa que compre uma canção num serviço online (o qual, por sua vez, já pagou a respectiva licença para a poder vender) e que espera poder copiar essa canção para outros dispositivos para além do primeiro, nos termos definidos pelo serviço onde a tiver comprado – é o que acontece, por exemplo, ao comprar música no iTunes.
“O conteúdo pode agora ser disponibilizado aos consumidores exactamente da forma em que estes esperam recebê-lo”, lê-se no documento, apenas disponível em inglês. “Os acordos de licenciamento reflectem estas novas formas de distribuír conteúdos a consumidores e permitem que os detentores de direitos sejam adequadamente remunerados pela exploração das suas obras”.
António Vitorino recomenda, por isso, “clarificar que as cópias feitas por utilizadores finais para fins privados no contexto de um serviço que já tenha sido licenciado pelos detentores de direitos não causa qualquer prejuízo que requeira uma remuneração adicional sob a forma de taxas de cópia privada”.
Contudo, sublinha não ser desejável que o actual sistema desapareça (medida que descreve como um “big bang”) e observa que continuarão a exisitir casos em que se justifica a remuneração da cópia privada por via das taxas, embora estes casos tendam a diminuir devido ao surgimento de novos modelos de negócio e de distribuição de conteúdos.
Entre as recomendações estão ainda a de que a responsabilidade pelo pagamento seja transferida dos fabricantes e importadores para os retalhistas e a de que a taxa seja visível para o consumidor final.
Vitorino defende também que seja definido o prejuízo causado pela cópia privada (e que é o elemento justificativo da necessidade de remuneração) de forma uniforme na União Europeia e em função do valor atribuído pelo consumidor às cópias feitas ao abrigo da excepção.
“Estou longe de dizer que estas cópias adicionais causariam ‘prejuízo’ mínimo e que não precisariam de ser compensadas”, ressalvou, para de seguida tocar num ponto frequente no debate sobre o assunto: o facto de muitos agentes da indústria querem contabilizar para o prejuízo todas as cópias feitas, sem considerarem a disponibilidade dos consumidores para pagarem essas cópias, caso não as pudessem fazer ao abrigo do regime da cópia privada. “Mas creio igualmente", prosseguiu Vitorino, "que contar todas as cópias de facto
feitas em virtude da excepção, sem ter em conta a disponibilidade do consumidor para pagar por estas cópias se não houvesse excepção, poderia levar a uma compensação em maior grau do que a lei da UE na verdade requer”.Artigo corrigido: António Vitorino não é eurodeputado, como estava escrito.