As Memórias de Alison e os seus Livros
Foi há uns meses, em Abril, que ao ler a The New Yorker fiquei a conhecer o trabalho de Alison Bechdel. Na edição de dia 23, a revista trazia um perfil desta autora norte-americana, escrito por Judith Thurman (Drawn From Life - The World of Bechdel).
Durante 25 anos, Alison Bechdel escreveu e ilustrou a tira de BD Dykes to Watch out for e, em 2008, publicou uma antologia com o essencial desse trabalho. Da leitura do perfil à visita da página oficial que a ilustradora mantém (dykestowatchoutfor.com) com blogue, os seus livros, agenda de exposições e eventos, foi um passo. Por isso podem imaginar a minha alegria quando vi que o trabalho de Alison Bechdel tinha começado a ser publicado em Portugal. A novela gráfica Fun Home - Uma Tragicomédia Familiar acaba de ser editada na Contraponto. Alison resume este seu livro de memórias assim: "Como o meu pai que vivia no armário se matou uns meses depois de eu ter dito aos meus pais que era lésbica." É tudo isto mas é ainda mais. Pelas suas memórias, de uma rapariga que se confronta com a sua homossexualidade e com a do pai, passa também o seu percurso enquanto leitora. Ele dá-lhe a ler Colette, ela lê e estuda Ulisses de Joyce, obra favorita do pai. E o romance do irlandês ganhou para mim uma nova dimensão depois da leitura de Fun Home. Por outro lado, apesar das particularidades desta relação entre pai e filha, todas as filhas se lembrarão da relação que tiveram com os pais. O livro começa assim: "Tal como muitos pais, o meu deixava-me às vezes brincar ao "avião". Quando me erguia, todo o meu peso caía num ponto entre os seus pés e o meu estômago." Bruce Bechdel, o pai de Alison que morreu aos quarenta e tal anos, era professor de Inglês, ao mesmo tempo que mantinha uma agência funerária - um negócio de família desde o bisavô. Por isso o título do livro, trocadilho com fun que em inglês pode significar diversão ou ser a abreviatura de funerária. A versão original, publicada em 2006, foi finalista do National Book Critics Circle Award, e essa nomeação nunca tinha acontecido para uma obra deste género. Na Salon.com resumiram-na como uma obra "pontuada de compaixão, frustração, arrependimento e amor": "Sempre com uma ironia literária que nos faz pensar acerca da tarefa quase impossível de sermos fiéis a nós mesmos e àqueles que fizeram de nós quem somos." Em Maio, nos EUA, Alison publicou outra memória gráfica. Em Are You My Mother? conta-nos agora a história da sua relação com a mãe. Isabel Coutinho