Providências cautelares poderão travar fecho de escolas em pelo menos dez municípios

Na lista dos 129 concelhos onde vão fechar escolas, pelo menos dez ameaçaram levar a contestação até aos tribunais. Basta que providência seja admitida em tribunal para que produza o efeito suspensivo.

Foto
Baião é um dos concelhos inconformados Nelson Garrido

A título de exemplo, o especialista em Direito Administrativo aponta o caso da Maternidade Alfredo da Costa, cujo fecho continua suspenso depois de um grupo de cidadãos ter interposto uma providência cautelar nesse sentido. No caso das escolas, poderá acontecer que diferentes tribunais decidam de modo diferente, consoante a argumentação aduzida. “Dependerá dos fundamentos invocados, mas estas providências são intentadas em tribunais diversos e pode haver decisões diversas, até para casos que são iguais”, ressalva aquele especialista da Universidade de Coimbra.

Embora mais cauteloso, Licínio Lopes, outro administrativista, também admite desfechos positivos para as pretensões dos autarcas. “São providências cautelares de suspensão da eficácia da medida e, nos termos do artigo 128.º do Código do Processo dos Tribunais Administrativos, a mera notificação da providência ao Ministério da Educação tem um efeito suspensivo”. Na prática, basta que uma providência seja admitida pelo tribunal para que vigore o seu efeito suspensivo. “A parte notificada, neste caso o ministério, tem depois 15 dias para apresentar a chamada resolução fundamentada de interesse público, a qual, se no entender do juíz contiver razões válidas, sustém o tal efeito suspensivo imediato”, explica ainda aquele especialista de Coimbra, acrescentando que a tais automatismos se sucederá a “decisão de fundo” sobre o fundamento da providência.

Sem querer antecipar desfechos judiciais, Licínio Lopes diz que não tem memória de providências cautelares como as intentadas para travar o fecho de salas de partos e mesmo a união de freguesias terem sido deferidas pelos tribunais. “O que estava em causa não era uma medida meramente administrativa mas de programa político e, nestes casos, os tribunais contêm-se, para não interferirem com a política, numa lógica de separação de poderes”.

Ainda assim, o administrativista admite que, à semelhança do ocorrido com a Maternidade Alfredo da Costa, o desfecho possa ser diferente. “Admito que num município ou numa freguesia que só tenha uma escola, onde não estejam garantidos transportes ou onde as crianças tenham que se levantar às cinco ou às seis da manhã, os juízes possam ter um entendimento diferente e favorável à manutenção das escolas”.

A argumentação que alicerça os protestos que os autarcas tornaram públicos, logo que, no passado dia 21, receberam o fax dando conta do encerramento das 311 escolas, não anda muito longe da admitida pelo administrativista. Desde a falta de auscultação prévia à falta de verbas para garantir a despesa de transporte dos alunos para as novas escolas, passando pela quantidade de quilómetros que estas terão de percorrer diariamente, ouviu-de de tudo um pouco.  Os protestos soaram bem alto em cerca de meia centena de municípios, dos 129 afectados, nomeadamente nalguns onde na lista de escolas a encerrar se inscreviam algumas com mais de 21 alunos, o número mínimo exigido por lei para manter uma escola em funcionamento.

O município de Guimarães, por exemplo, anunciou que já recorreu aos tribunais para tentar travar o fecho de seis escolas, uma das quais a EB1 de Gonça, que tem mais de 26 alunos. Em Amarante, a Junta de Freguesia de Gondar, dispôs-se a usar de “todos os meios legais” para travar o fecho da escola de Vila Seca, com 37 alunos. No caso de Belmonte, a anunciada providência cautelar visa travar o fecho de duas das três escolas que o MEC quer encerrar no concelho: Carvalhal Formoso e Colmeal da Torre. Já Idanha-a-Nova predispôs-se a batalhar nos tribunais contra o encerramento do complexo escolar de Monsanto, que concentra jardim-de-infância e 1.º ciclo, e que foi recentemente requalificado para melhorar as condições das 26 crianças que o frequentavam (16 no pré-escolar e dez no 1.º ciclo).

No caso do município de Cuba a providência cautelar visa travar o encerramento da escola de Vila Ruiva. Os municípios de S. Pedro do Sul e da Covilhã também disseram que iam avançar para os tribunais. Em Chaves foi o presidente da Junta de Freguesia de Curalha quem anunciou estar a ponderar avançar para a via judicial. Em Anadia, por seu lado, a ameaça de recurso a uma providência cautelar partiu da comissão de pais da EB1 de Samel.

Sem nunca ter aventado a hipótese de avançar para os tribunais, o presidente da Câmara do Fundão mostrou-se contra o fecho da EB1 dos Enxames, alegando que os alunos teriam de ser deslocados para estabelecimentos a mais de 50 quilómetros. Os protestos soaram igualmente na Guarda e em Borba. Baião, Penamacor, Estarreja e Arouca foram outros dos municípios onde a decisão ministerial mereceu epítetos como “escandalosa” e “lamentável”. Amarante e Póvoa de Lanhoso também vociferaram e, em Mora, o município queixou-se da falta de dinheiro para transportar os alunos. Tondela, Góis, Coimbra, Cartaxo, Santarém, Chamusca, Almeirim, Abrantes, Aljustrel, Alvito e Manteigas compõem ainda a lista dos municípios onde a decisão do MEC foi mal acolhida.

O ministro Nuno Crato predispôs-se, entretanto, a financiar o transporte dos alunos deslocados, o que poderá ter ajudado a esvaziar alguns dos protestos. De resto, conforme escreveu o MEC em comunicado, o propósito do fecho destas escolas é garantir a integração dos alunos em escolas “com recursos que oferecem melhores condições para o sucesso escolar”.

No universo das escolas a encerrar encontram-se, ao todo, 133 escolas com mais de 21 alunos, mas estes casos, segundo adiantou então o secretário de Estado da Administração Escolar, João Casanova de Almeida, decorrem da proposta das próprias autarquias, bem como de compromissos assumidos na candidatura a fundos comunitários para a construção de centros escolares.

Nas contas deste governante, 68 das 311 escolas a encerrar foram propostas pelas autarquias, tendo havido acordo em 67,5%. Em 8,5% destes casos houve discórdia declarada e nos restantes 24% “as autarquias não se pronunciaram sobre as propostas apresentadas”.

Sugerir correcção
Comentar